Fica complexo distinguir fantasia de realidade, na cidade Rio de Janeiro, quando há desfiles de escolas de samba entre fevereiro e março, na Marquês de Sapucaí, tradicional avenida (complexo arquitetônico de autoria de Oscar Niemayer) de arquibancadas para plateias ávidas por espetáculos na região central da cidade. No restante do ano, nenhuma outra atividade festiva supera o carnaval. A não ser uma imprensa que busca notoriedade com notícias duvidosas do ponto de vista da ética.
Para alegria da imprensa sensacionalista, os bons tempos de ‘pirotecnia’ (alarmes positivos de novelas da vida real) atraíam muitos leitores.
O Foco News sabia que, mantendo Alice na cola dos policiais da delegacia da Lapa, bons resultados eram previsíveis sempre, não importando a ética, mas sim informações privilegiadas para vencer a concorrência de outros jornais.
A maquiagem, para fantasias de cadáveres, mesmo que fossem mortes de anônimos, havia de ter doses de enredos novelescos para atrair leitores na ausência de notícia melhor.
Alice, acostumada, desde os tempos de faculdade, enganar professores com notícias CTRL+C / CTRL+V (copia e cola, muito comum em ambiente de Internet), agora, no páreo, seguia os conselhos da chefia: aqui na empresa, Alice, o funcionário tem que aceitar as regras de convivência. Esqueça tudo que aprendeu na faculdade e colabore para aumentar o nosso índice de penetração nas residências. Sem leitores, somos um jornal perto da falência. Seu salário depende da sua competência no Foco News. Isso inclui a ética do Foco News. A ética aprendida na faculdade é para acadêmico que ama falar bonito... pra intelectual, moça. Estava no lugar certo para enriquecer, ficar famosa, aparecer em colunas sociais.
A morte da balzaquiana, presenciada pelo assassino de Angel, não merecera a tinta do sensacionalismo na imprensa especializada em assuntos mórbidos.
Alice havia recebido da fonte (o policial da delegacia da Lapa) a informação que uma mulher de trinta anos tinha sido encontrada morta e seminua, com sinais de estupro.
“Publica, Alice. Lhe garanto que vende jornal a história da mulher encontrada numa posição muito estranha para o crime”
“Meu editor vetaria. História sem sustância. Uma mulher de trinta anos anônima... com um passado corriqueiro de moradora de uma cidade grande. Se ela estivesse metida com algum mafioso do colarinho branco... eu podia vender a história pro Foco News”
“Da próxima vez lhe arrumo uma história melhor”
“Espero que sim. O Foco News remunera as fontes muito bem. Trabalhe direitinho que o Foco News recompensa à altura”
“A minha recompensa tá fora de questão de dinheiro. A minha recompensa é você, Alice”
“Positivo, meu amor. Sou a sua recompensa a qualquer hora. Siga os procedimentos corretamente que eu vou ser todinha sua, meu gostoso”
O policial, no outro lado do celular, suspirava de tesão, com a mão bolinando as funções abaixo da cintura, no conforto do automóvel de luxo, estacionado numa das vaga do edifício garagem, local muito apropriado para encontros secretos. O prazer era tanto que não se deu conta da interrupção do telefonema por iniciativa de Alice, cujas mãos estavam nervosas para escrever alguma matéria que elevasse mais o nome de profissional de comunicação.
Na noite anterior, Julieta e Ulisses não se encontraram, por obra do acaso, nos subterrâneos, na Cidade Baixa como era chamada pelos religiosos descendentes de uma religião gestada nos tempos do Brasil Imperial. Cada um procurara rastrear alguma pista de vampiros, mas em vão.