Volto à ativa novamente. Se bem não tenha dado ao luxo de ficar na inércia deste lado de cá. Aqui, igualmente, as notícias fazem ibope. Porém a temática é outra, que não aquela costumeira da velha Terra .Os outros defuntos que compartilham comigo desta ventura quase nirvânica de viver deste lado do véu fazem também a "sua" notícia.
Hoje, porém, tentarei falar de assuntos um pouco diferentes daqueles aos quais emprestara a minha pena quando metido nos labirintos da carne.Como vê, meu caro, se abandonei aí o paletó e a gravata de músculos e nervos, conservei, no entanto, o jeito próprio do escritor e repórter, agora, porém, radicado em "outro mundo", quando dizia quando estava aí. O bom agora é que não me sinto mais escrever àqueles velhacos de colarinho engomado, que nos julgam pela forma ou gramática, de acordo com os ditames das velhas academias da Terra.
Igualmente, não tenho a obrigação, deste lado do túmulo, de me ater aos rigores das convenções dos escritores terrenos. Estou mais solto, mais leve e mais fiel aos fatos observados. Embora conserve os domínios de mim mesmo, a minha distinta e preciosa individualidade de morto-vivo metido à repórter e escritor do além, resolvi, por bem daqueles que me guardam na memória, adotar um pseudônimo para falar aos amigos que ficaram do lado de lá do rio da vida.
Assim sendo, meu caríssimo, enquanto emprestava sua mão para grafar meus pensamentos, que, desafiando todas as expectativas de meus colegas de profissão, teimam em continuar constantes, sem ser interrompido pela morte ou lançado às chamas do inferno, empresto-lhe igualmente as minhas pobres experiências, compartilhando com você um pouco das histórias que almejo levar ao correio dos defuntos e dos que se julgam vivos.
Creio que será proveitoso para ambos, o momento em que estaremos juntos. No mínimo, sentirei mais de perto o calor das humanas vidas, enquanto você experimentará mais intensamente a presença de um fantasma metido à repórter e comentarista do além-túmulo.
Despeço-me, para breve retornar. Com o carinho de um amigo,
Ângelo Inácio