Epílogo

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TRÊS SEMANAS DEPOIS

O sol se mantinha fraco naquela tarde. Ashville se tornara o centro das atenções para a mídia, sendo comparada com Woodsboro e seu massacre infame de 1996. A cidade havia sido arrebatada pelo enredo de um filme de terror que custou a vida de muitos jovens. Mas que aproximou à todos em solidariedade como iguais, e nem mesmo uma formiga seria vítima de desprezo. Eram todos cúmplices de uma forma de bondade que os diferenciava do assassino mascarado, o monstro que espreitou a cidade nas sombras durante essas semanas de horror. As intenções de Juliett ficaram claras e o FBI retornou a cidade naqueles dias, para tirar as conclusões dos depoimentos finais dos sobreviventes do incidente. Hoje, foi a cidade das montanhas e amanhã, onde será que um novo assassino incorporando o modus operanti de "Ghostface" irá atacar? Por mais que sequências e remakes desse massacre surgissem, a força tarefa não pouparia esforços em rastrear os passos do próximo assassino que começaria sua onda de frenesi, que poderia se dar início em qualquer lugar do mundo, em qualquer cidade ou qualquer esquina. E começaria então, uma nova perseguição ao redor do globo para frear o reinado de terror do fantasma que tornaria a fazer as suas ligações infames, arrebentando laços de amor e amizades sob o disfarce de um adolescente. Mas o pesadelo havia acabado para Ashville com louvor. Intitulada de "Final Girl", Claire Ripley hoje tinha a honra de um discurso que incitaria a paz e a harmonia nos corações despedaçados pela faca de caça do fantasma.

Era no colégio de Ashville High que o evento se deu. No auditório, alunos, pais e professores no momento mantinham-se em silêncio lotando os acentos daquele teatro do colégio, que volta e meia era iluminado com flashes rápidos de fotos sendo batidas pela imprensa, que como vermes se mantinham curvados aos cantos do local, tendo uma fortaleza de câmeras enfileiradas transmitindo a coisa toda ao vivo para o país todo.

Na fileira da frente, estavam os pais das vítimas do agora chamado "Massacre de Ashville", usando camisetas com os rostos estampados de seus filhos e sobrinhos mortos. Ao canto como incógnitas, os pais de Juliett e Steve choravam cabisbaixos envergonhados e humilhados, como se implorassem pelo perdão alheio ao usarem também uma camiseta estampada com os rostos de todas as vítimas. Mas nenhum olhar se voltava para eles, não importa o quanto sentiam a humilhação sobre seus ombros.

Edward, Amelie, Marty e Keaton se sentaram um ao lado do outro na primeira fileira, de mãos dadas mostrando força e perseverança. Juntos, como nunca antes. Keaton com o ombro enfaixado por debaixo da blusa, mantinha um dos braços perto de seu torso, paralisado naquela cadeira tentando não fazer movimentos bruscos, tendo seus dedos entrelaçados com o de Marty. Assistiam Claire, que caminhava no palco se aproximando de uma mesa alta com um microfone disponível, enquanto o diretor do colégio se afastou dando lugar à garota. De vestido rosa claro, fino como uma folha de papel e uma flor presa a uma pulseira em seu pulso e um salto fino, a loira se apresentou numa caminhada magistral. Seus cabelos levemente cacheados nas pontas e todo seu visual, faziam com que ela lembrasse muito alguém, as pessoas só não conseguiam ligar os pontos quanto a quem. E isso fazia parte do número que a "Diaba" estava prestes a tirar da manga.

De olhos esperançosos, a plateia em silêncio mortal, esperou que a menina cabisbaixa soltasse suas primeiras palavras de conforto. Claire pigarreou diante do microfone, olhando a todos de cabeça meio abaixada por um instante, respirou fundo retornando a sua pose, e soltou:

- Foi tudo culpa minha.

Os murmúrios no auditório foram inevitáveis, cochichos e cabeças que se viraram perplexas com o que a garota acabara de falar, vinham como um estrondo enquanto ela esperava o silêncio retornar. Vendo que o mesmo não acontecia, falou em tom mais alto indicando um "Calem a boca":

- Foi tudo culpa minha!.... -O silêncio retornou, envergonhado. - É Difícil ver como as atitudes e escolhas que fazemos, podem resultar em catástrofes futuras. Eu sei que vocês bunda moles esperavam que eu viesse e soltasse pombas da paz e acariciasse uma criança como uma fundadora de campanhas de Papai Noel, mas isso não vai acontecer. Eu sou Claire Ripley. E isso nunca vai acontecer. Mas estamos aqui não para falar do futuro mas sim, para apaziguar esse passado horrível. Que mais é um presente que não quer ir embora. Então, pretendo ser bem franca. Nas últimas semanas a nossa cidade foi amedrontada por um assassino. Houve praticamente uma dúzia de vítimas. Amigos, Irmãos, Pais, e Filhos. Tudo começou numa noite quente e um telefone que tocou. A Morte estava do outro lado da linha. Não demorou muito para que os membros do corpo estudantil do colégio de Ashville High fossem arrebatados por uma onda de assassinatos. Enquanto a polícia estava sem pistas, mais um corpo aparecia a cada dia. Não sabemos como o destino funciona, mas sabemos que para cada ação, há uma reação. Eu fui essa ação. No momento em que eu decidi ser tomada pela inveja e raiva, eu condenei as vidas de seus filhos e irmãos. Mas, não adianta nos chamarem de crianças perante a lei, não nos dando o direito ao voto ou o direito de ter uma palavra confiável, pois nós fomos vítimas, nós fomos mortos do mesmo jeito que um adulto. Os direitos de um cidadão são diferentes conforme suas as idades, mas o direito a morte é sempre igual para todos? Podem me chamar de inúmeros nomes e ofensas ou dizer que eu sou só uma adolescente de dezessete anos falando merda num auditório com câmeras na minha cara. Mas a verdade é que, eu já sou velha o bastante pra saber quando a vida está vindo pra cima da gente com sede de sangue. Entendo seu luto, completamente. O que aconteceu aqui, foi um absurdo além das raízes lógicas. E nunca será esquecido. E realmente não pode! Não deve! Isso nos custou tudo. A nossa forma de ver o mundo, o nosso caráter. Fui madura o bastante para ajudar a acabar com uma onda de assassinatos mas não fui madura o bastante para aprender a dar valor a vida. Não fui madura o bastante para saber amar antes de perder. Não fui madura o bastante para aprender a agradecer antes de precisar pedir. E não fui madura o bastante para controlar minhas ações. Eu posso sentir o peso de todos vocês e de todos eles sobre mim. Viverei com um fardo do qual o inferno teme experienciar. Eu sou a pessoa que não conseguiu subir nesse palco e dizer algo bonito enquanto ouço todos aqueles gritos dentro da minha cabeça. Os choros, os pedidos de ajuda. Os gemidos de dor. E os passos desesperados na escuridão.

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