Capítulo 7

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Na quarta-feira, às sete e quinze da manhã, haviam alguns professores sentados à grande mesa no centro da sala e outros em pé, próximos à cafeteira, esperando pelo início das aulas. Eu, Antônio e Fernanda, únicos estagiários presentes, sentávamos nas cadeiras ao lado dos computadores, no final da sala, conversando. Enquanto ele ficava me tocando cada vez que falava, ela quase fingia que eu não existia, o que era algo bem esquisito.

Eu tentava prestar atenção ao que meu colega dizia, embora acabasse sempre me distraindo com alguma outra conversa, querendo saber tudo o que se passava.

Curiosa com tudo, mal percebi quando um homem, entrou pela porta e veio em direção à mesa central, sem parecer notar nossa presença.

Não deixei de notar que ainda não o tinha conhecido. Ele era bem alto, tinha um pouco de barba e seus cabelos de um tom de castanho escuro eram cortados mais curto nas laterais, com o resto preso em um coque estilo samurai bem no topo. Usava calça jeans e uma camiseta cinza claro com o desenho de um cérebro e, por baixo da manga direita, se entrevia o fim do que me pareceu ser uma tatuagem tribal. Seus bíceps, ainda que não fossem enormes, como desses caras que participam de competições de fisiculturismo, tinham músculos bem definidos, impossível de não serem percebidos.

Seu modo de andar era estranho, como se estivesse machucado, meio mancando, meio tentando evitar encostar os braços ao corpo. Entendi que algo havia acontecido quando, ao chegar mais perto de onde estávamos, na mesa da sala, vi um dos cotovelos e antebraço bastante esfolados.

Por um momento meu coração se sobressaltou, da mesma forma que sempre acontecia ao encontrar com qualquer moreno. Foi apenas por um instante. Logo me reestabeleci: era óbvio que não era o Desconhecido, não com aquele corte de cabelo. O cara que eu lembrava tinha cabelos nos ombros.

E professor? Aquele cara certamente trabalharia no ramo na música, não da educação.

Bem, eu já não lembrava exatamente de toda sua fisionomia. Boa parte de meus pensamentos sobre ele pareciam ter sido inventados. Uma coisa, porém, parecia clara: esse era muito mais interessante, muito mais homem do que aquele que eu conhecera cinco anos antes. Definitivamente muito mais gostoso!

Claro que não era como se eu tivesse certeza absoluta de como ele estaria depois de tanto tempo. Embora certamente teria envelhecido um pouco.

O tal professor afastou a cadeira com um pé e largou-se nela com certa habilidade de quem estava acostumado a se jogar sem se importar com as consequências. Um outro professor, ainda mais alto, com barba farta, mesmo que quase sem cabelos (tinha quase certeza de ser o professor de filosofia e sociologia), se aproximou e deu um tapinha de leve em seu ombro:

— E aí, Igor? Como tá? Se machucou muito?

Várias pessoas da sala voltaram sua atenção para o homem, fazendo silêncio, inclusive nós três, curiosos. Sobretudo eu, que nem fazia ideia de quem era o sujeito a minha frente, muito menos o que teria acontecido com ele para estarem todos tão preocupados. Já era meu terceiro dia na escola e ninguém tinha nem tocado no seu nome.

— Nossa, e como! – respondeu sorrindo, ainda com a mão sobre a barriga, como se seu incidente tivesse sido apenas uma eventualidade sem importância, mas que dava uma ótima história para contar aos amigos. – Não acredito que não tenha acontecido nada mais grave.

Ele virou o rosto para ver se todos os presentes estavam prestando atenção a sua narrativa, demonstrando toda sua egocentricidade. Seus olhos pararam em mim por alguns segundos, provavelmente sem saber quem era aquela desconhecida loira de cabelos curtos sentada com os outros estagiários. Não percebi nenhuma mudança drástica em seu semblante, me identificando, porém notei um quase imperceptível franzir de olhos, como se apenas percebesse que era mesmo uma pessoa nova no local. Um alguém sem importância alguma.

Quando é Pra Acontecer (degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora