Capítulo 4

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Mesmo a brisa do mar não foi capaz de me acalmar. Os ventos frios do Outono atingiram minhas roupas, que estavam encharcadas, e me fizeram tremer. Também não sabia se o silêncio havia sido minha melhor escolha. Ele só fazia os pensamentos em minha cabeça parecerem estar mais altos e confusos.

O verão acabou, e com ele se foram todas aquelas famílias aproveitando alegremente a praia, ele também levou toda minha esperança de ter um ano escolar bom, ou pelo menos, regular.

Alguns cascalhos se soltaram sob meus pés e despencaram pelas paredes de terra. Nunca me interessei em descer até a praia, ficar ali no alto de tudo sempre me fez sentir um pouco mais superior. Mas não era disso que eu precisava, tinha que aceitar que, não importava o que eu fizesse, nunca ia ser melhor que ninguém.

Desci os degraus até a praia lentamente. Não prestei tanta atenção na vista quanto deveria, mas não era meu principal objetivo no momento. Tirei meus sapatos e senti a areia passar por entre meus dedos. Havia apenas um homem fumando sozinho nas pedras, observando o mar, como eu. Andei em direção da imensidão azul, que parecia ser feita de prata naquele horário.

Me aproximei apenas o suficiente para a água chegar nos meus tornozelos. Eu fitava o oceano tentando encontrar algo, não sabia direito o que. Senti minhas pernas fraquejarem e minha visão embaçar. Eu joguei meus sapatos com tanta força ao mar, que não pude ver onde eles caíram. Mais que merda. Virei uma máquina de lágrimas de novo. Mas não eram de triste tristeza; não, eram de raiva. Tinha raiva de tudo, de todos, e só o que eu precisava, era achar algo para onde direcioná-la.

- POR QUE?! O QUE EU FIZ PRA VOCÊ? POR QUE EU TENHO QUE SOFRER MAIS QUE TODO MUNDO?!

Parecia que eu esperava uma resposta do mar, mas não veio nada.

- EU TE ODEIO! TE ODEIO COMO TODOS TAMBÉM ME ODEIAM!

Eu me sentia como uma criança de 8 anos novamente. Gritando como se fosse mudar alguma coisa, mas na verdade, apenas queria respostas. Podia ser algo da minha cabeça, mas o mar estava ficando agitado, talvez retribuindo a minha raiva. E novamente aquele som, mas talvez fossem apenas as ondas quebrando na minha frente.

- ACABA COMIGO DE UMA VEZ! VAI. EU TE DESAFIO!

Não, não era apenas as ondas, tinha algo a mais. Palavras.

- EU NÃO TENHO MEDO DE VOCÊ! EU NÃO TENHO MEDO DE NINGUÉM!

Eu engasgava, e algumas palavras soaram engraçadas, como se eu tivesse algum sotaque difícil de entender. A água já estava nos meus joelhos, mas quando em percebi, era tarde demais.

- Você não tem medo de morrer, garoto? - A voz soava imponente, como um rei gigante e poderoso, que não aceitava ser desafiado.

- EU JÁ DISSE QUE NÃO TENHO MEDO! - Novamente eu não estava falando normalmente, era outra língua, algo diferente. E eu simplesmente soube, eu estava falando com a água. Uma onda gigante me atingiu como um soco, rápido assim, já não conseguia mais respirar. Fui lançado de um lado para o outro num turbilhão de águas. Mas tudo ficou calmo de repente, e só conseguia ver uma imensidão escura ao meu redor. Eu estava no fundo do mar, e estava morrendo. Tudo em meu corpo ardia, e já havia engolido muita água. Eu havia, literalmente, desafiado o mar, e perdido. Era tudo tão calmo, e tranquilo ao meu redor. Então era assim que tudo acabava? Não poderia ter escolhido um momento pior. Eu afundava como se fosse apenas mais um lixo que tivessem lançado ao mar. Como se não houvesse o que fazer.

Não! Eu não vou morrer aqui, não agora! Eu não sei de onde tirei forças, mas comecei a me impulsionar em direção a superfície.

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