Capítulo II - O lamento de Ícaro

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Ilha de Creta, Grécia Antiga


Ícaro corria junto aos pássaros no céu pelos inúmeros percursos do Labirinto de Creta. Ele já conhecia quase todos os caminhos daquele lugar, mas naquele dia ele decidiu ir por um caminho diferente. Havia uma passagem onde a luz do sol não alcançava e uma pequena camada de nevoa cobria todo o lugar.

O garoto se aproximou e ouviu um estranho barulho, como o ronco de um enorme e feroz dragão. Ícaro estava tremulo, mas decidiu continuar e ver que tipo de coisa habitava ali.

Quando cruzou uma linha de dez passos, ele percebeu que ali não era uma nova passagem, e sim um lugar fechado. Mas o que lhe assustou mais foi o que estava deitado e ferido, dentro daquela espécie de quarto. O Minotauro grunhia de dor. O loio pequeno deu um passo em falso e acabou pisando em um graveto, o que lhe causou um eco enorme, que fez a besta abrir seus olhos e ficar desperto.

Ele, Ícaro, decidiu que seria uma ótima ideia fugir dali, mas acabou dando outro passo em falso e acabou tropeçando, caindo de costas no chão. O monstro se virou ferozmente e avançou depressa para cima do garoto, que fechou seus olhos depressa e esperou pelo pior.

...

— Eu já te disse para não sair das proximidades, Ícaro. – Disse Dédalo, checando seu filho e procurando por algum ferimento em seu corpo. – As coisas ficaram sombrias desde que eu criei esse lugar. Como você conseguiu fugir? E sem nenhum ferimento?

Ícaro não disse nada, ele estava choroso e aterrorizado. O silencio o consumiu, não se ouvia mais nenhuma palavras desde os gritos de socorro ecoando pelas passagens do labirinto.

— Não entendo. Como o Minotauro ainda pode estar vivo? Teseu o tinha matado. – Seu pai estava muito confuso com a situação, especialmente com suas dúvidas sobre as habilidades de Ícaro para fugir do monstro. – Aqui, este amuleto foi criado por mim mesmo e abençoado pelo deus Apolo. Irá te proteger. – Dédalo lhe colocou em torno de seu pescoço um pingente em forma de sol, como o Deus do Sol, Apolo.

...

Bronx, New York

No apartamento de Ícaro, minutos antes de ser completamente destruído, tudo passava em câmera lenta. Da boca de Ortros saia chamas infernais e caído ao chão o peito descoberto de Ícaro possuía agora uma marca de sol que brilhava tão forte quanto o próprio. Era a marca de Apolo.

Em outro segundo, não as chamas do cão, mas os raios de sol de Ícaro, destruiu tudo ao seu redor. A fera havia se transformado em pó. E o garoto, agora estava correndo pelas ruas do Bronx, não fazia ideia do que acontecera naquele quarto. Ele estava desorientado e esbarrava em alguns objetos em seu caminho até seus olhos se fecharem e ele apagar por completo.

...

Ícaro acordou alguns minutos depois, quando o som de várias sirenes adentrou seus ouvidos. Levantou do chão e decidiu se afastar o máximo que podia da encrenca. Ele acabou parando no meio da noite em uma viela escura e desconhecida, bem longe de onde havia aquele enorme desastre. A marca em seu peito ainda estava lá – o lembrando que tudo havia acontecido de verdade, e que agora ele não teria mais um lugar para ficar. –, agora ela ardia e mostrava pequenos relances de luz. Ele lamentou silenciosamente por estar passando por aquilo.

A verdade era que, Ícaro sequer sabia o que estava acontecendo com ele. Era tudo novo, e muitas vezes parecia uma espécie de pesadelo. Um cão enorme de duas cabeças havia o atacado, o seu peito surgiu uma marca e assim ele destruiu um apartamento por completo.

O loiro estava muito aflito e não sabia para onde ir. Ele viu que tinha uma caçamba de lixo ali perto e depois de muita luta com seu ego, decidiu vasculhar os resíduos a procura de algo para vestir – visto que ele estava apenas com uma bermuda queimada pelo fogo e sem camisa –.

— O que está fazendo no meu território, garoto imundo? – Ícaro não tinha percebido, mas havia um mendigo ao lado da caçamba de lixo, e agora ele gritava insultando quem ousara mexer em suas coisas. – Saia daqui antes que eu te mande para o inferno, sua aberração.

Ícaro havia pegado uma camiseta velha com pequenos rasgos e decidiu sair dali quando o homem velho e rabugento lhe mostrou uma garrafa quebrada ao meio, ameaçando-o com aquela arma. Já havia tido muitos problemas naquele dia e não queria mais um em sua lista.

O garoto saiu caminhando pelas ruas da cidade, sem destino. Ele não ia voltar para casa do homem propriamente dito como seu pai, aliás, nesse momento todos estariam pensando que ele já não habitava mais nesse mundo. Ícaro sorriu, olhando para o céu onde se podia observar um halo lunar ao redor do satélite da Terra.

...

Nuvens se formavam no céu depois de uma longa caminhada. Não demorou muito e os pingos de chuva começaram a cair, molhando os fios louros de Ícaro. Ele respirou fundo, com frio, e sentou na calçada de um mercado, se protegendo da chuva embaixo de um toldo.

Ícaro fechou os olhos. Seus lábios tremiam pelo frio. Em sua cabeça milhares de pensamentos sobre quem ele era de verdade. Então as palmas de suas mãos brilharam, era uma luz quente como a do sol. Ele não se deixou ficar assustado por aquilo e rapidamente abraçou seu próprio corpo, o fornecendo calor naquele clima pesado, adormecendo em seguida.

Em seu sonho, Ícaro estava em uma ilha desconhecida. Ele corria por um povoado e se sentia em casa. Estava em conforto, era algo maravilhoso. Havia uma figura masculina que o chamou de filho. O garoto sorria. Estava finalmente com sua família. Logo tudo se transformou em um borrado cinzento, tudo havia se transformado em um inferno e agora Ícaro se via queimando nas chamas, gritando por piedade.

Seus olhos abriram quando um forte fleche de luz estampou os céus de Nova Iorque. Era como um relâmpago, porém mais forte e mais luminoso, algo parecia ter rompido as barreiras do céu e caído na terra. Ícaro apenas se encolheu mais – como o garoto indefeso que ele viu em seu recém sonho– e adormeceu novamente.

...


"Eu tenho me sentindo como se eu merecesse alguém, e você brilha tanto que poderia cegar alguém. Você vai, seguindo o voo das estrelas e esses céus podem nos levar para casa." - Flight Of The Stars, ZAYN

A Queda de Ícaro [HIATOS]Onde histórias criam vida. Descubra agora