CAPÍTULO 4

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Reunião de urgência. Foi o que lhe falaram.

Michelangelo encontrava-se numa sala de reuniões enorme olhando para alguns colarinhos brancos. Com cinco dias desde a tragédia, aquela reunião demorou mais do que ele esperava. Já havia se reunido com alguns deles em outras ocasiões, mas aquele dia era a primeira vez que todos estavam juntos. Seria dado o veredito dos próximos passos. E ele gostou da ideia, porque não tinha a menor chance de conduzir sozinho a situação.

Ele olhou ao redor. Aquela mesa de mógno cara com cadeiras que exalavam luxo. O piso de porcelanato que refletia os sapatos mais caros que o valor de mercado de um carro popular. A grande vidraça de frente para ele revelava um céu azul e sem liberdade. Parecia que as nuvens estavam alheias a tudo que tinha acontecendo em Brumadinho.

– Bom meus amigos... – Começou um deles – Parece que as coisas se complicaram.

– Não só parece, como de fato isso aconteceu. – Acudiu outro.

Aquele breve diálogo entendiou por hora a Michelangelo. Julgou tão falsa a posição dos seus acionistas, sentados confortavelmente em suas cadeiras enquanto muitos estavam mortos. Então percebeu que ele estava na mesma posição. Tudo se resume a hipocresia, pelo visto.

– O que faremos para resolver o problema? – Uma mulher loira perguntou a Michelangelo como se o ameaçasse a dar uma resposta coerente.

Ele parou um pouco e sustentou a pergunta no ar. Só conseguia pensar no seu erro e como queria ter voltado no tempo. Já não era mais merecedor de sua vida nem de toda a sua fortuna, dá-la-ia aos que ele prejudicou. Mas aqueles acionistas não concordariam nunca, nem ele mesmo concordaria, afinal o dinheiro não era só dele. Mas a culpa, sim.

– Sinceramente... – Falou ele – Eu não sei.

– Com assim? – O da cabeceira da mesa gritou irado – Você quer nos levar a ruína?

A sala inteira calou-se e o grito pareceu ecoar no peito de Michelangelo. Ponderou as palavras do homem furioso e concluiu que ele já tinha feito isso. A empresa ruiu, por sua causa.

– Você tem alguma coisa para nos dizer, advogado? – Depois de um tempo inércio, Michelangelo falou.

– Sim. 

O homem de gravata rosa levantou-se para que sua voz alcançasse mais os ouvidos deles e para sustentar sua postura arrogante e autoconfiante que sempre carregava. Abotoou o botão do meio do terno caro e pigarreou. Todos o olhavam, ansiosos.

– É inegável a questão dos danos ambientais que causamos. Essas atividades podem gerar responsabilização civil, administrativa e criminal.

– O que isso quer dizer? – Interrompeu alguém.

– Quer dizer que responderemos por violação das normas ambientais e por danos individuais às vítimas e trabalhadores.

– As pessoas já sabem disso? – Uma mulher interrogou.

– Com certeza. – Respondeu o advogado como se isso fosse óbvio demais – Existem vários artigos na internet e nas redes sociais. Hoje em dia todos gostam de ficar "navegando" e divulgando qualquer coisa só para ganhar curtidas. E a imprensa se beneficia disso.

Alguém na sala cochichou "bando de abutres" e todos se calaram.

Michelangelo absorveu as palavras do jurista e suspirou, mais preocupado que o normal. As coisas já haviam tomado uma dimensão gigante e ele não tinha percebido. Ia muito além do seu sentimento de culpa, de sua covardia, atingia um campo ao qual ele não sabia dominar: as leis. Essas, tão temíveis, poderiam destruir tudo que era seu. Entretanto, havia uma saída, alguém acharia. De repente Berson se pegou desejando não pagar por seus erros.

Eu Nasci Nas EstrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora