eight

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Londres, 31 de janeiro de 1950.

Heaven Bryer

Ao fechar a porta atrás de mim, escorei-me nela, soltando o ar dos pulmões. Meu coração palpitava descontroladamente dentro de meu peito. Engoli em seco, sentindo-me ridícula pela cena de pouco menos de um minuto atrás. Ouvi, através das paredes, o ronco baixo do motor do carro de Styles; a medida que este foi se tornando inaudível, minha respiração tentava entrar nos trilhos novamente.

Heaven, como pôde ser tão idiota?

Esperei pacientemente que meu peito se controlasse antes de mover meu corpo. Pensamentos passavam pela minha mente como folhas secas em uma forte ventania. Com certa dificuldade, me forcei a não me ater a nenhum deles; eu teria muitas horas para refletir sobre o ocorrido até a próxima segunda feira, quando encontraria meu concorrente e tentaria lidar com o fato de que eu o tinha rejeitado descaradamente.

A luminária da sala de estar estava acesa, embora a lâmpada no teto não estivesse. Suspirei, deixando minha bolsa sobre o sofá estofado. Caminhei em seguida até a cozinha, saltitando com um pé só por tentar descalçar meus saltos ao mesmo tempo. Quando finalmente me livrei deles, ficando apenas sobre as finas meias calças, juntei o par ao lado da entrada larga do cômodo.

Acendi a luz e a mesa de jantar foi revelada. Nada mais que um prato, talheres, uma panela fechada e uma colher de servir. Imaginei ser a refeição que minha tia preparara para mim. Faminta, avancei para uma das cadeiras ao redor da mesa e sentei-me, disposta a ter a refeição solitária e silenciosa que mais necessitava naquele momento.

Enquanto me ajeitava sobre a cadeira, minha mente viajava para o carro que eu acabara de abandonar. Devaneios insistiam em transpassas a realidade, em busca de explicações para justificar as recentes atitudes estranhas de Harry Styles.

A reflexão de minhas palavras ditas e não ditas certamente avançaria. Porém, ao depositar uma porção de macarronada e camarões no meu prato, ouço uma tosse leve, quase discreta, vinda de trás de mim. Como um despertar, endireitei-me.

— Titia? — me surpreendi ao ver a figura de Ophelia na porta da cozinha. — Desculpe se te acordei! Não me apercebi de que a senhora estava dormindo. Entrei tão distraída que...

— Podemos conversar? — ela me interrompeu.

Gelei, de repente assustada. Pensei em minha irmã, em minha mãe, em meu pai. Naquele momento, eu achava que até mesmo poderia ter ocorrido algo com Sarah no hospital.

Tia Ophelia, debaixo dos rolos aderidos em seu cabelo, apertou os olhos. Ela vestia um robe que teria, talvez, o triplo do tamanho daquele que eu usava após o banho. Seus olhos azuis sem maquiagem prenderam a minha atenção. Me encaravam, parecendo estudar cada linha de meu rosto.

— Claro — sorri nervosamente, tampando a panela de alumínio.

Nos sentamos frente a frente, em extremidades opostas da mesa. Eu tinha medo de como reagiria a qualquer informação desagradável que ela me passasse; nunca fui boa em controlar minhas emoções.

— O que a senhora deseja? — perguntei, juntando minhas mãos em meu colo. Eu suava frio. — Aconteceu algo à Sara?

— Eu vi — ela foi enxuta, ignorando minha preocupação.

— O quê? — questionei, unindo as sobrancelhas.

— Não se tenha como boba! Eu vi! Eu vi com os olhos que essa terra há de comer — gesticulou exageradamente. — Eu vi que chegou com um homem!

Meu peito se apertou, e foi sobre ele que minha mão pousou imediatamente. Senti um calor atingir meu rosto. Uma mistura de alívio e vergonha.

A janela do quarto de Sarah ficava na direção da entrada da casa. Tia Ophelia teria me visto próxima a Harry de lá de cima, provavelmente. Como não pude perceber a luz acesa no andar superior?

1950 • h.sOnde histórias criam vida. Descubra agora