Dois meses se passara desde que ali chegara. Meus familiares acabaram por aceitar a ideia de mais um filho na família, mais uma boca para alimentar e um corpo infantil para cobrir com roupas.
Para me tornar querido por eles e pagar por este trabalho que lhes causavam sempre, ajudava mamãe em suas atividades domésticas.
Era de manhã, já próximo do horário de almoço, ajudava mamãe a preparar um macarrão com frango ensopado para nossa refeição, semelhante a que se fazia aos domingos em nossa casa de italianos, misturado com suecos que somos.
— Sabe que dia é hoje, maninho? — perguntei a Regis, que passava pela cozinha com a maior cara de sono, por acabar de acordar. Nesse tempo, seus cabelos se tornaram novamente semelhante aos meus, que foram cortados, embora por papai, com mais cuidado.
— Terça-feira! — afirmou ele convicto.
— Dia do mês, eu perguntei!
Ele pensou um pouco e, balançando os ombros arriscou:
— Vinte e cinco.
— De...
— Sei lá!
— Junho. Que data importante que é hoje?
Ele tornou a pensar por algum tempo, arriscando:
— Descobrimento do Brasil...
— O loco! — achei graça. — Isso já foi faz tempo!
— Dia da pátria...
— O dia de hoje é muito mais importante do que tudo isso!
— Sei lá! Eu acho que não estudei ainda!
— E nem vai estudar! — ironizei. — O dia de hoje é muito importante pra ser estudado na escola desse mundo.
— É dia de Deus... — arriscou o menino.
— Hoje a gente comemora o seu natal. E o meu também!
— Natal é em dezembro! — exclamou ele.
— Natal de Jesus é em dezembro. O nosso é hoje. Dez anos de idade. Aqui ninguém faz questão desse dia, mas eu digo que é muito importante.
Abracei o maninho, dei-lhe três tapinhas nas costas, dizendo feliz:
— Parabéns, maninho! Que Deus proteja sempre a nossa vida sagrada.
Ele aceitou o meu abraço, porém não entendeu muito minhas felicitações.
Mamãe, que estava por perto, sequer se manifestou sobre tal atitude, então tomei a iniciativa de abraçá-la, dizendo:
— Obrigado, mamãe, por ter nos dado vida. Obrigado por cuidar da gente durante estes dez anos e tenho certeza que cuidará até ficarmos velhinhos.
É®Ê
Durante as férias escolares de inverno, o irmão José Carlos arranjou um trabalho na olaria, quinhentos metros de nossa casa, onde, a princípio começou a trabalhar sozinho, depois, com a promessa de nos dar algum dinheiro, passou a nos levar juntos para a fabricação de tijolos.
Nos primeiros dias tudo parecia festa e a gente fazia de conta que estava brincando de trabalhar e ainda tinha mais dinheiro do que o pouco que mamãe sempre nos dava para nossos gastos e eu até consegui, inclusive obrigar o maninho a comprarmos duas bermudas cada um, um pouco mais longa do que nossas calças curtas de francesinhos, as quais usávamos principalmente para irmos à missa das crianças, aos domingos pela manhã, celebrada pelo bondoso Frei Marcelino.
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Através das Barreiras do tempo
AdventureA partir de um encontro inusitado com antigo amigo de sua infância, o senhor Regis começará a viver a maior aventura de sua vida. Um ancião ao qual ele jamais pensaria que reencontraria ainda neste mundo lhe concederá um passaporte para a mais espl...