À SETE CHAVES

Capítulo 7

Do outro lado do asfalto David observa em silêncio a janela do apartamento onde um dia viveu com a ex esposa, não conseguia explicar pra ele mesmo o que o levara até ali numa noite em que mais uma vez o céu castigava a cidade com pequenas gotas de água.

Talvez estivesse se sentindo ainda de algum modo ligado a aquele lugar, as vezes por mais que arranquemos certas coisas de nós elas continuam ali por tempo indeterminado.

A luz acesa do quarto do pequeno júnior parecia chamar por ele, pensou em subir pra abraçá-lo mas mudou de ideias quando apercebeu-se que sua ex esposa estava acompanhada de um grupo de amigas, dava pra ver dali elas erguendo pequenas taças e soltando irritantes gargalhadas.

" Que se dane" pensou, e com as mãos no bolso do longo sobretudo marcou passos em direção a uma pequena lanchonete a poucos quarteirões dali.

Pela primeira vez deu por si se questionando o que realmente havia se passado entre ele e sua esposa, como é que num dia ele estava se casando com o amor da sua vida e no outro já nem se quer suportava olhar pra ela, em que ponto as coisas se transformaram tanto até olhar pra o outro lado da cama e encarar uma autêntica desconhecida. A verdade é que com o tempo ele acabou mudando, ela mais ainda, e as pessoas nem sempre estão preparadas pra mudanças, no fundo a vida seria muito mais fácil se fosse a mesma coisa o tempo todo. Lembrou-se de uma frase com a qual havia topado enquanto desfolhava uma revista empoeirada esquecida em um caixote durante a sua mudança "existem relações marcantes, momentos inesquecíveis,mas ninguém é o amor da vida de ninguém"

Sentado numa pequena mesa de lanchonete apreciava o dançar dos ponteiros de seu relógio que marcavam meia noite e quarenta minutos, o lugar estava quase às moscas já, além dele apenas dois homens vestidos de esverdeados coletes refletores sobre suas roupas e capacetes azulados cobrindo a cabeça se sentavam numa outra mesa a dois metros dele com duas refeições servidas, estranhamente pareciam nem tocar nelas, como se os pratos não estivessem ali, talvez andassem trabalhando numa obra ali perto. David lançou discretamente o olhar sobre eles enquanto esquartejava o bife suculento sangrando em seu prato, deu um gole em seu copo de uísque e acendeu um cigarro logo em seguida, o frio parecia penetrar em seus ossos e aquela era a única maneira que conhecia de combate-lo.

Na enorme tv circulava mais uma vez o rosto de Jason Harrigan com a descrição "procura-se, indivíduo altamente perigoso". era agora um dos homens mais procurados pela polícia de Nova Iorque, mas David sabia que um homem como Harrigan não era propriamente fácil de achar ainda que a polícia revirasse a cidade de cabeça aos pés, Jason Harrigan era treinado pra circular por qualquer lado como se fosse invisível e talvez naquele momento de um certo tumulto estivesse numa toca qualquer esperando a poeira baixar. quanto a Henry Clint não havia nada contra ele por enquanto,so um monte de provas circunstanciais que não serviriam pra acusar um homem tão protegido pelo poder e pela fortuna, ele bem provavelmente estaria sentado numa mesa se deliciando de caviar, conhaques e champanhe no restaurante mais caro da cidade ou jogando minigolfe em seu escritório mais luxuoso que vários quartos de hotel.

Voltou a lançar o olhar sobre aqueles homens que volta e meia também o encaravam controlando cada movimento seu. Nenhum deles tinha um ar amigável, tampouco o rosto de quem trabalhava durante horas num emprego honesto e mal pago. Esmagou o cigarro no pequeno cinzeiro de vidro e discretamente colocou no bolso do sobretudo a pequena e afiada faca de alumínio que ele usara durante a refeição. Calmamente passou o guardanapo sobre os lábios, deixou sobre a mesa algumas notas esverdeadas e de forma tranquila levantou-se da cadeira marcando passos em direção a queles dois homens.

-o Harrigan tem andado tão bem escondido que teve de mandar dois amadores pra me matar? -dirigiu-se a eles surpreendendo-os -eu aguardo por vocês lá fora- em passos curtos saiu pela porta.