RACHEL PRECISA DE AJUDA. Jade sabe que isso é um fato, assim como também é um fato que ela não é normal. No fim das contas, Jade não sabe quem ela é e o quão perigosa pode ser, mas sabe que no fundo é apenas uma adolescente assustada e com medo que não sabe como se controlar. Ou controlar o outro lado que está dentro dela.
Agora, no exato momento, ela, Rachel e Dick se encontram dentro do convento, mais especificamente no lugar onde as freiras devem rezar a missa. Jade na verdade não sabe se freiras rezam missa, mas tem certeza de que provavelmente é onde devem fazer orações.
Por alguns minutos, os dois adultos respeitaram o momento de silêncio da jovem, até o momento que Dick se levanta de onde está e caminha até o banco onde as duas garotas estão sentadas, se acomodando de frente para elas. Antes mesmo que ele possa falar alguma coisa, Rachel o encara, abaixando a bíblia que fingia ler.
— Eu não sei o que fazer. — Ela admite, o vendo assentir com um maneio de cabeça.
— Qual foi o gatilho? Você estava com medo?
— Se eu estava com medo? Eu estou sempre com medo. — Ela responde sincera. Dick novamente apenas concorda, suspirando.
— Olha, eu preciso que você...
— O que? Confie em você? Outras pessoas podem ajudar, é isso? — Ela o interrompe, balançando a cabeça em negação. — Não, eles não podem. Só farão promessas, mas no final vão falhar e irão todos embora. Assim como você.
O argumento parece pegar Dick de surpresa, pois por breves instantes ele abaixa a cabeça, concentrando o olhar em algum ponto no chão, mas não demora para erguer os olhos novamente, a encarando com uma expressão compreensiva, mas também firme.
— É, você tá certa. Você está por sua conta. Ninguém pode ajudar você, não realmente. — A resposta faz Jade franzir o cenho, encarando Grayson com um olhar repreensivo, já que ela com certeza não concorda com tal argumento, porém a expressão com que ele a encara de volta a faz entender que dessa vez ela não deve se intrometer. Ele continua. — Eu já fui como você. Eu pensei que se me apoiasse em alguém, se eu confiasse, toda a dor iria embora. Eu estava errado. E qualquer um que te disser o contrário, está mentindo.
Assim como aconteceu na primeira vez em que Jade conheceu Dick, ela sente uma estranha sensação de dejavú, como se já o conhecesse de algum lugar antes de tudo isso, embora não consiga se lembrar de onde. Ele continua com sua tentativa de discurso auto-ajuda.
— A perda fica pra sempre. Não há como superar. Mas você pode controlar, pode canalizar isso. E ninguém mais pode fazer por você.
Dizendo isso, ele se levanta, olhando uma última vez para as duas antes de se afastar, deixando-as sozinhas ali. Todos sabem que não é do feitio de Jade dar sermões como Dick, e o que ela menos quer é o contradizer e confundir a cabeça de Rachel ainda mais, porém mesmo assim, sente que ainda precisa esclarecer algumas coisas para ela. Coisas que aliás, ela acredita serem mais eficientes do que tudo o que o rapaz falou.
Apesar disso, não o faz logo de início, preferindo começar o assunto de uma forma mais amena.
— A noite que nos conhecemos, quando você me tocou, você viu, não viu? O meu passado? — Questiona, se lembrando da forma como Rachel tocou sua mão na ocasião, sem explicar o por quê. Agora, levando em conta os poderes da jovem, Jade já consegue fazer uma ideia do motivo.
— Vi. — A confirmação não a surpreende de fato.
— Foi por isso que confiou em mim?
— Foi.
— E você conseguiu sentir? O que eu senti na época, e o que eu sinto até hoje sobre isso? — Rachel sentiu. Na verdade, foi como se ela tivesse voltado no tempo e assistido tudo de fora. Toda a violência, todas as ameaças e todo o medo que Jade passou.
— Consegui. É angustiante.
— É, muito.
— Mas é estranho também, por que te fortalece. — Jade solta um suspiro com isso, confirmando. Nunca é fácil para ela falar sobre o assunto, pois odeia reviver tudo, mas estranhamente, não lhe incomoda tanto conversar sobre isso com a jovem. Talvez por ela ter sido capaz de realmente sentir o mesmo que Jade. Rachel foi além do que a maioria das pessoas vai. Ela não imagina a dor, ela sabe como é.
— Você é a única pessoa com quem já falei sobre isso. E possivelmente a única também que consegue entender.— Admite para a mais nova, que mantém os olhos azuis atentos sobre ela. — Tudo o que Dick falou, bom, ele não tá totalmente errado, mas não que eu concorde. Ele é um arrogante mandão na maior parte do tempo.
Rachel ri com o comentário, concordando.
— É, ele é.
— Mas eu acredito que no fundo a intenção dele tenha sido te fazer pensar por si só. Rachel, você não é a única cuja vida é difícil. Eu por exemplo, você sabe tudo o que eu passei quando tinha a sua idade. E o Jason, ele não é muito mais velho que você, mas quando era criança vivia apanhando do pai bêbado, até que um dia decidiu fugir de casa e passou a morar na rua sozinho, por anos. Kory também, que não faz a mínima ideia de quem seja. Até mesmo Dick. Eu não faço ideia de qual seja a história dele, mas com certeza também tem algo por trás de toda aquela pose. — Ela solta um suspiro na sequência, preferindo omitir sobre os pais de Grayson, respirando fundo antes de prosseguir. — Passar por dificuldade não é um privilégio seu. É claro que a sua situação é diferente, mas nem por isso é melhor ou pior do que a dos outros. O que eu quero dizer é que você precisa começar a formar suas opiniões por si só sobre o que está passando, e que ao invés de ficar se vitimizando e tentando afastar de si as pessoas que querem te ajudar, faça como Dick disse. Canalize tudo isso e use como força. Funcionou pra mim.
Um breve momento de silêncio se instala entre elas na sequência, e Jade o aproveita para deixar que a jovem absorva tudo o que lhe foi dito. Ela até se saiu bem melhor do que esperava. Se Jason estivesse ali, com certeza já teria feito algum comentário irônico sobre isso.
— Eu me vejo em você Rachel, e é por isso que eu vou te ajudar e vou te proteger de quem quer que seja o filho da puta que queira te fazer mal. Isso significa que você pode sim confiar em mim, assim como pode confiar em Kory, Jason e em Dick também, afinal, ele ainda está aqui, apesar de ter cogitado fazer o contrário. — Dizendo isso, ela decide que seu momento auto-ajuda por ali também já está encerrado, se colocando de pé. — Pensa sobre isso.
. . .
Depois de deixar Rachel a sós com seus próprios pensamentos, Jade encontra Dick no corredor conversando com uma das freiras, que não demora a se afastar do rapaz.
— Você é péssimo lidando com adolescentes. Me lembre de nunca mais confiar em você com um. — Comenta ao se aproximar, o vendo parecer se ofender com a acusação.
— Quer saber, você também não parece a pessoa mais qualificada.
— Não pense que eu vou esquecer o fato de você quase ter deixado Rachel pra trás. — Dick solta um suspiro com o comentário, balançando a cabeça.
— Será que podemos esquecer isso? Eu já disse que seria temporário e que isso não vai acontecer de novo. — Ele parece sincero no que diz, e Jade decide lhe dar uma segunda chance de confiança, embora confie ainda desconfiando.
— É bom mesmo Dick, por que eu lembro de ter dito que confiava em você, e confiança pra mim é algo sério.
— Pra mim também é, ok? — Ela sabe o quão cabeça dura pode ser na maioria das vezes, porém o detetive claramente também é, e portanto é impossível que eles se entendam 100%, principalmente sobre esse assunto.
Percebendo a tensão que se fez presente entre eles, ela decide mudar o rumo da conversa. Todos eles estão juntos ali para ajudar Rachel afinal, e é isso que importa.
— Onde Kory e Jason estão? — Decide perguntar ao notar a ausência dos dois.
— Jason disse alguma coisa sobre estar com fome, e Kory... — Antes que ele possa concluir a frase, ouvem um barulho de carro sendo ligado em frente ao convento. Levando em conta que o lugar não é do tipo muito frequentado por turistas, alguém com certeza está saindo com o carro de Dick.
E Kory é a opção mais óbvia.
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DEPREDATE ── dick grayson
FanfictionDEPREDATE | Jade havia se fechado para o mundo. Após os traumas sofridos na infância, tudo o que ela queria era apenas noites de sono tranquilas, mas isso não foi nem de longe o que conseguiu. Fora de seu controle e de forma repentina, se viu parte...