Capítulo 41

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— Gabriel? – Eu lembro da voz da minha mãe pelo telefone, nas primeiras horas do meu aniversário – Tudo bem, menino?

— ... Tudo. – Respondi contra a vontade, ainda cheio de mágoa porque ela se trancou no próprio quarto quando apanhei feito um bicho, e nunca mais olhou na minha cara. – Você precisa de alguma coisa?

— Não, só liguei para te dar parabéns.

— Obrigado. – Seco. Eu não queria chorar por ela, tampouco o fiz. Só queria desligar e esquecer que ela me ligou.

— Como vão as coisas?

— Bem. – Apesar da senhora e do meu pai, as coisas vão bem.

— Fico feliz.

— Que bom.

— Você sabe que eu te amo, não sabe?

— Mãe... – respirei fundo – Se tem alguma coisa que a senhora queira me dizer, diga logo.

— Tá certo, meu filho. – A voz dela quebrou quando disse "filho" que na hora eu não percebi. – Se cuida, tá? Tenta... – Fungou e eu perdia todos os detalhes – Tenta não ter raiva de mim a vida toda, tá?

— Mãe, a senhora não quis nem chamar a ambulância. Nem a polícia. Quando o pai me bateu, a senhora se escondeu no seu quarto. Eu tô cheio de raiva de você porque é como se também tivesse me batido.

— Acredita em mim quando digo que não tive escolha.

— Como que não teve escolha? Tudo nessa vida é escolha. Você decidiu ficar do lado do meu pai, então, por favor, fique do lado dele, seja feliz, e me deixe ser feliz também.

O nome da minha mãe é Helena. Alguém já te contou isso? É Helena o nome dela. Não é esposa do meu pai, nem minha mãe. Helena. Quando Manuela me chamou, entrei no quarto dos meus pais esperando pelo pior. Era como se dormisse. Deitada para dormir, o cobertor por cima, de camisola.

A cartela esvaziada de calmante no criado-mudo me contava uma história que eu não queria crer. Manuela colocou a mão sobre minha mãe e não conteve o choro. A casa vazia. Minha mãe deitada. Meu pai sumido.

Rafael me envolveu num abraço, nem me deixou chegar perto dela.

— Me deixa ver, Rafael. – Pedi.

— Não, Gabi, fica aqui, você não precisa ver isso.

— Rafael, sai da minha frente, eu não quero brigar com você!

Quis atrasar meu passo, me segurou pelos ombros, brigou comigo para me colocar para fora do quarto. Eu sei, ele só queria me proteger. Rafael gritava com Manuela para se afastar, e eu lutava contra seus braços para poder me aproximar. Eu sei, ele sempre quer me proteger, mas os braços dele não são maiores que o mundo.

Cheguei perto de Dona Helena sentindo sua pele fria. Procurei pulsação e Rafael ligou para o SAMU. Pode ser que esteja viva. Pode ser que não seja verdade.

A ambulância demorou quinze minutos para chegar. Sabe o que é esperar quinze minutos por socorro? Você não sabe o que fazer. Você não sabe a quem chamar. Você fica esperando alguém, mas ninguém vem, e você não quer crer que ela está...

Rafael atendeu o paramédico e ele me olhou com um olhar de pena que não precisou dizer mais nada. Tocou no corpo gelado, sem batimentos cardíacos, e pediu a unidade avançada do SAMU, que vem com um médico, para atestar o óbito.

Para atestar o óbito, ouvi ele dizer.

Tive que responder perguntas que eu não sabia a resposta. Eu não morava mais lá. Contei para o policial, que chegou no quarto, que eu não morava com ela há muito tempo por uma briga com meu pai. Ele perguntou onde estava meu pai. Eu disse que não sabia. Ele perguntou como eu consegui entrar na casa se não morava mais lá.

Para Sempre TrêsOnde histórias criam vida. Descubra agora