Olhos Castanhos

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Existem pessoas que nos marcam profundamente, nos fazem amar seus maiores defeitos, e sem eles nossa vida perde o sentido. Assim foi com Carlos. Algo intenso que aconteceu no ensino médio.

O colégio ofereceu um curso de informática gratuito que me inscrevi de imediato. Felipe, 17 anos, cabelos negros, magro, de uma pele alva, uma barba bem desenhada. Apresentei-me diante da turma. Todos ali fizeram o mesmo, inclusive um garoto que não parava de me encarar. Seu nome era Carlos, cabelos castanhos, igualmente a seus olhos, magro de uma pele pouco avermelhada.

Inúmeras aulas se passaram, sempre nos fitávamos, mas nunca chegávamos a conversar. Em uma das aulas, professora Matilde pediu para que se organizássemos em duplas. Ele se levantou e caminhou em minha direção. Fiquei apreensivo, pensando no que falaria, como falaria, o que ele acharia de mim. Incrível como nunca senti aquilo por nenhuma garota, já cheguei a namorar mas aquele frio na barriga e todo esse nervosismo foi a primeira vez.

Posso? Acenei positivamente. A garganta estava travada. Trocamos algumas palavras, mais sobre o conteúdo da aula. Isso tá muito difícil, a gente poderia marcar de estudar mais tarde... Se ainda restava alguma pulsação, com certeza ela parou. Respondi que sim, com a voz claramente falhada. e seu ar de seriedade se desmanchou num sorriso.

Como marcado, ali estava ele, diante de mim. Entra. O levei para meu quarto, ninguém estava em casa, mas ali era um lugar mais calmo para estudar. Os livros cobriam parte da cama, afastei um deles e deitei, fixando meu olhar no teto. Não aguento mais estudar. Ele gargalhou de leve. Mas estamos aqui a dez minutos...

Dei de ombros e continuei fitando o nada. Então seus dedos deslizaram sobre meu rosto muito rápido. Levantei de imediato. Ele me olhou assustado e envergonhado. Desculpa... Eu não... olha... Falei que estava tudo bem, ainda nervoso. É melhor eu ir embora...

Carlos acelerou para a porta, puxei seu braço trazendo-o de volta. Mesmo sem saber o que dizê-lo. Fica. Ele sorriu, queria poder sorrir também, mas estava extasiado. Seus dedos agora desenhavam minha nuca, sem pressa. Continuei imóvel, vendo-o se aproximar até que pudéssemos sentir a respiração um do outro. Encarei seus olhos castanhos que se fecharam no toque de nossos lábios. suas mãos desceram da minha nuca, me palpando as nádegas.

Era tudo novo, e excitante. Jamais havia sentido algo assim. Fomos para a cama e ali permanecemos toda a tarde. Os dias se passaram, semanas, e sempre nos encontrávamos as escondidas. Queria poder apresentá-lo aos meus pais, caminhar de mãos dadas, mas era um desejo impossível.

Depois de meses, o ensino médio estava acabando e a parede do anfiteatro seria espaço pra outros casais apaixonados. Tudo parecia terminar, Carlos ria de tudo e isso me irritava um pouco. Ele também não gostava das vezes que saía com os outros amigos. Chegamos na parte que passávamos mais tempo discutindo do que rindo entre nossos beijos.

E por fim, Carlos parecia estar cansado. Como se os infinitos motivos que o faziam me amar estivessem se esgotado. E naquele mesmo laboratório de informática, onde trocamos os primeiros olhares, ele estava em minha frente, com as mãos nas minhas. O castanho de seus olhos agora lacrimejavam. Eu nunca vou esquecer do que a gente viveu. Ainda te amo, mas é melhor cada um seguir seu rumo. Consenti, palpando as duas mãos em seu maxilar. O beijei pela última vez, e ele se foi...

Hoje, tenho 25 anos, uma filha de dois anos, e uma linda esposa por quem sou totalmente apaixonado. O que tive com Carlos foi muito especial e importante para mim. Às vezes, estou com um comentário idiota pra fazer, ou vendo um filme, e olho para os lados, e percebo seu vazio. Queria poder reencontrá-lo e saber como está sua vida. Por onde tem andado, se ainda sente minha falta, pois ainda sinto a sua.

Rascunhos SolitáriosOnde histórias criam vida. Descubra agora