cap.6

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— Na verdade, sou eu quem deve agradecer, senhorita. Já tinha esgotado todas as minhas desculpas por ficar trabalhando até tarde, e agora você me forneceu mais uma.

Pérola não compreendeu. Por que ele precisaria de motivos para ficar em sua fábrica até mais tarde? Por que não queria voltar para casa mais cedo?

Caminharam juntos até a produção. Lá, o supervisor verificava as condições do equipamento de pérola.

— Demorou  repreendeu-a assim que a viu de volta.  Não parece haver nada de errado com isto aqui, portanto, a menos que me dê uma boa razão para não colocá-la no relatório de descuido em serviço, Mantovani…

Pérola baixou a cabeça, pensativa. Sabia que, de fato, fora descuidada. Tivera culpa.

— Se não tem nada a dizer, volte ao trabalho  ordenou o supervisor.

Por trás de pérola, a pouca distância, Márcio interferiu:

— Não vai haver nenhum relatório sobre o que houve. Essa máquina vai receber uma etiqueta de "fora de serviço" e será levada para maiores averiguações. Está fora da linha. E, já que está, a partir de agora, sem máquina para trabalhar, a srta. Pérola não voltará à lida esta noite, mas irá para casa. Agora.

O supervisor entreabriu os lábios, sem saber o que dizer. O funcionário ao lado, voltou a seu serviço torcendo a boca, em desagrado.

Pérola se manteve calada. Estava certa de que não precisava argumentar, e fraca e dolorida demais para isso. Pegou seu casaco e a bolsa e, sem olhar para ninguém, deixou a produção, seguindo Márcio porto até a rua. Já estava na calçada quando ouviu:

— Acredito que não tenha um carro.

— O ônibus não demora, sr. Porto  E segundos depois, não se conteve:

— Eu preferia que não tivesse feito aquilo, senhor.

— A que se refere?

— A tudo. Porque vai haver muitos comentários.

— Sobre o quê, senhorita?

— É óbvio que não conhece muito bem os funcionários daquela ala.

Pérola ainda sentia muita dor, em especial quando falava. E não sabia se devia ou não alertá-lo de que os homens de sua seção fariam brincadeiras maliciosas sobre os dois. Ademais, era tarde para poder salvar o emprego que parecia estar lhe escapando por entre os dedos.

— Não faz mal. Olhe, detesto parecer avarenta ou coisa parecida, mas… serei descontada por estar saindo mais cedo hoje?

— Se não é sua culpa, não, é óbvio. Venha, vou levá-la até sua residência. Não me parece muito inteligente ficar esperando por um ônibus num frio destes.

Márcio se voltou e começou a caminhar, sem ao menos voltar-se para ver se pérola o acompanhava. E ela o fez, como num reflexo muito forte e inexplicável. Quando viu o automóvel elegante e discreto, lembrou-se do comentário que ele fizera e, sem querer, murmurou:

— É por causa da avó.

— O quê? Márcio abriu a porta.

— Ah, desculpe, é que… imaginei que sua avó talvez achasse mais fácil entrar num veículo assim. Não poderia ser esportivo, desses rebaixados.

Márcio estudou-a durante alguns segundos, pensativo.

— Não conhece minha avó, conhece?

— Claro que não.

— Bem, onde mora?

Pérola explicou-lhe o caminho, imaginando se não seria melhor dizer-lhe para que a deixasse no campus. Depois, ponderando melhor, decidiu que não faria diferença para Márcio porto onde e de que maneira ela vivia.

COISAS DO UNIVERSO (ADAPTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora