Capítulo 1

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Ayla


— Não, eu quero a porcaria do contrato assinado hoje, Patrick. Vocês estão nos enrolando há dois meses. Dois. Meses! — bufo impaciente. Ouço o homem do outro lado da linha soltar um gemido de descrença.

— Ayla...

— Sem Ayla. Ou vocês querem a tecnologia, ou vocês não querem. Se até as oito da noite uma cópia do contrato assinado não chegar em meu e-mail, procurarei novos interessados. Tenha uma boa tarde, senhor Hale.

Encerro a chamada e massageio minhas têmporas. Comandar a empresa de soluções tecnológicas da família é uma conquista que carrego com orgulho, mas lidar com empresas que acham que podem nos enrolar só porque a pessoa no comando é uma mulher, me deixa tão puta da vida que a minha vontade é descer o nível e mandá-los se foder.

— Você está muito estressada. — Júlia cantarola, tirando-me da sessão de tortura mental que eu praticava com o maldito Patrick. Sorrio para a minha prima sentada do outro lado da mesa. Nem mesmo na hora do almoço eu tenho paz.

— Claro que estou, quando esses machistas ridículos vão começar a aceitar que uma mulher pode e faz o mesmo trabalho que eles? Muitas vezes ainda até melhor! — Ela sorri, me apoia em todas as decisões profissionais que eu tome, mas nunca trabalhou na vida. A não ser que considere as vezes em que me convence a investir em projetos malucos para ajudar seus amigos, já que seus pais não são tão liberais assim, lhe dão tudo o que quer, menos dinheiro em mãos.

— Você precisa de sexo — constata, apontando seu garfo em minha direção. — Daquele tipo bem quente e suado, que te tira de órbita e no outro dia, mal consegue se manter sobre as pernas.

— Obviamente essa é a minha prioridade no momento. Os duzentos e cinquenta softwares prontos no laboratório vão se vender sozinhos. — Ela revira os olhos enquanto pousa o talher no prato e sorve um gole do seu vinho, tudo isso mantendo os olhos presos em mim.

— Você tem trabalhado demais, Ayla. Não faz bem para a mente e nem para o corpo. — Seu tom agora é preocupado, o que me desarma. Nossos pais são irmãos e fomos criadas juntas desde bebês e quando mamãe morreu, eu tinha só cinco anos, tia Rosalyn quem foi o meu suporte materno. E apesar de sermos da mesma idade, Júlia sempre foi protetora em relação a mim.

— Eu sei, mas eu preciso. Papai não pode se estressar mais com essas coisas. — Sua mão acaricia a minha sobre a mesa, seus olhos transbordando amor.

— Eu também sei. Mas me preocupo com você e é por isso que vou te ajudar.

Estremeço, é automático quando algo deste tipo é proferido pela voz melosa de Júlia Stewart. Ela não é exatamente uma patricinha desmiolada, só aproveita, e bem, todo o luxo que seus pais podem lhe proporcionar. Claro que eu poderia seguir o mesmo caminho, mas existe algo dentro de mim que não me permite ficar quieta, há uma inquietação gostosa em meu interior que me impulsiona a buscar sempre mais.

— Não me olhe com essa cara, Lally. — O pior é que ela parece mesmo ofendida com o meu olhar, o que me faz rir. — Lembra alguns meses atrás quando investimos na startup de um amigo meu?

— Você investiu, eu só assinei o cheque.

— É, mas você também tem recebido uma parte dos lucros. O que importa é: você nem se preocupou em perguntar do que se tratava a empresa.

— Parei de me preocupar com isso quando me fez investir em uma demanda de bonecos sexuais realísticos. — A lembrança nos faz gargalhar. Claro que a ideia foi uma tremenda furada, a amiga que estava por trás do projeto não tinha suporte nenhum, além de seus desejos ocultos de possuir um robô sexual que tivesse a aparência de um homem de verdade.

— Aprecio a forma que confia em mim. — Voltamos a comer, eu com pressa por ver que preciso estar de volta ao escritório em meia hora, ela percebe e revira os olhos. — O investimento dessa vez foi em um aplicativo de encontros.

Arqueio as sobrancelhas em sua direção. Sério isso?

— Ultimamente tenho usado shampoo dois em um, pois não tenho tempo nem para duas lavagens de cabelo, quem dirá para encontros!

— Dá para parar de me interromper e me ouvir até o final? — Ergo as mãos, rendendo-me diante sua expressão nervosa. — Não é um desses aplicativos de encontros comuns, são para encontros sexuais. — Minhas sobrancelhas sobem um pouco mais. — E não são só meros encontros... são encontros profissionais...

— Pelo amor de Cristo, Júlia estamos investindo em um uma empresa de prostituição? — Controlo meu tom de voz, a incredulidade dominando cada célula do meu corpo. — Onde diabos você estava com a cabeça?

— Menos, Ayla, bem menos. — Apoiando os cotovelos sobre a mesa, ela inclina o corpo para frente, ficando mais próxima de mim. — Não é bem assim, o Charles só gerencia o aplicativo, ninguém obriga ninguém a fazer programa. E não é uma empresa de prostituição ele organiza encontros, é a ponte entre cliente e acompanhantes — frisa bem a palavra acompanhante, encarando-me profundamente. — Ele criou o aplicativo pensando em pessoas como você, que quase não tem tempo para coisas prazerosas como o sexo. O que na minha opinião é um absurdo. Charles é um anjo em forma de gênio.

Ainda estou em choque por saber que nos últimos seis meses andei, mesmo que indiretamente, promovendo encontros sexuais. Sinto-me uma cafetina.

— Não seja tão careta, Lally. Qual é o problema em pagar por um encontro? Se você está sem tempo e precisa de sexo, por que não pagar alguém que é garantido que vai te satisfazer? Não é crime viver um pouco, sabia? — Continuo encarando-a perplexa.

— Eu não estou precisando de sexo. E não, não é crime, mas...

Careta. — Aponta o dedo em minha direção. — Eu te amo e vou sim marcar um encontro para você. Me agradeça depois. — A vadia fica de pé, dando por encerrada a nossa conversa. Isso porque quem estava com pressa era eu. — E só para você saber, será por minha conta, meu presente de aniversário adiantado para você.

Então me deixa sozinha. A conversa repassando em minha cabeça como o letreiro de filme, mas em câmera lenta. Meu cérebro tentando ver se não deixou passar nada daquelas palavras absurdas, não sou uma pessoa careta, vivo até que de forma bem livre a minha vida, o problema mesmo é que realmente não ando tendo tempo para coisas triviais como encontros. Ou sexo. Desde que meu pai teve um princípio de infarto, há mais ou menos dois anos, eu tomei à frente da empresa da família. No começo foi só provisório, mas quando foi constatado que ele precisava mesmo de descanso e se afastaria do cargo, acabei ficando em definitivo, ainda que alguns investidores, machistas escrotos, achassem que eu não daria conta. Portanto agora sou a CEO da Stewart Technologic Solutions e toda a minha vida se resume à empresa.

E por mais incrível que pareça, sinto-me mais incomodada por Júlia ter me chamado de careta, do que pela ideia em si de que aquela maluca vai realmente me enfiar em um encontro com um acompanhante. Meu corpo traidor se arrepia inteiro com a mera ideia.

Acho que no final das contas eu preciso sim de sexo...


***

E aí, o que acharam deste primeiro capítulo? Tá meio curtinho, né? Mas já deu para pegar um pouco da essência da história, eu espero 🙃

Logo tem mais! ♥


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