Nunca compreendi muito bem as despedidas. Nunca soube lidar com o até logo. Até hoje me dói o peito dizer adeus. Consumo-me no fim dos trechos e sempre deixo uma parte minha quando vou embora. Desde pequena sofria com a dor das partidas. Lembro-me nitidamente do embrulho no estômago e o aperto na garganta que me dava quando meu pai me deixava na porta de casa no fim das férias. Acho que desde sempre essa lição da impermanência batia à minha porta singelamente; como um aviso em previsão: nada é para sempre. E isso, sempre me fez doer o peito. E hoje beirando os meus vinte e pouco ainda não entendo nada. Morte, términos, pessoas que se somem, sentimentos que acabam. Ainda me amarga esse inesperado adeus, é como um soco na boca do estômago, falta ar e leva tempo pra recuperar. E a vida na sua constante dança não te deixa escolha. É contínuo essa ânsia pelo continuar. Por isso sempre acabo por deixar inúmeros fragmentos do meu eu pelo mundo. Seja em escritos, histórias, suspiros, olhares. Tempo-espaço-e-eu. Deixo um pouco do que sou em cada canto. Faz parte da minha existência. E talvez, esse seja o meu legado. Um legado não-físico, um legado regado de presença e um bocado de sementes. Saber que há sempre um ponto final não me assombra; Na verdade, isso apenas me faz ter mais fôlego ainda pra espaçar esses meios que me cercam. O que me despedaça é essa urgência. O não aviso. Essa mania de iminência súbita que a vida tem. Sem aviso e ordem de chegada. Vem, arremata tudo e vai embora. Nesse ponto abrupto, um chacoalho em todas as minhas dimensões. Eu que sempre fui urgente com tudo que sinto, não compreendo essa pressa da vida. E são esses fins repentinos que me dilaceram. Me preenchem em ausência ocupando minhas entrelinhas. E agora o que me abarrota é o silêncio, ocupando o lugar de antigas risadas. Se crescer é aprender a dizer adeus, prefiro eu, ser sempre pequenininha. Similar à um grão de areia, tão pequena que seja invisível aos olhos; quem sabe numa dessa o tempo me esqueça e eu me veja livre desse fardo angustiante de ter que dizer adeus.
-Em algum lugar aonde ainda vive o primeiro olá-
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Devaneios de um sentir
PoesiaDevaneios de um sentir é um compilado de textos que descrevem sentimentos, emoções e vivências corriqueiras; através da escrita cria-se uma esfera nostálgica e palpável que possibilita a vivência imaginária dessas lembranças.