Four

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Ela me disse, ao aparecer chorando na minha porta na calada da noite, pedindo que eu nada perguntasse, só a segurasse ali, perto de mim.

Eu a segurei, silenciei e foquei em escutar seu choro baixo, e os altos gritos de sua alma.

Ela permaneceu assim por minutos que duraram horas, horas que duraram dias, e dias que duraram meses.

Mas não me mexi.

Quando o silêncio grita, alguém tem que escutar.

-O que dói? - perguntei, não por curiosidade, mas porque a resposta realmente me importava.

-Tudo. - ela respondeu, não porque pensava ser uma resposta razoável, mas porque sabia que era o melhor que poderia fazer para descrever.

Calei.

E de dor em dor ela me contou que a perna doía por todas as vezes em que se meteu em uma briga de rua.

Os braços doíam por carregar toda a culpa que o todos jogavam em cima dela.

As costas doíam pois a mesma carregou o peso do mundo até que não suportou.

Os olhos doíam por tudo o que ela viu de errado e nada pode fazer.

Os pés doíam pela longa caminhada da qual ninguém se importou em saber.

E a cabeça doía por repetir incansavelmente "você precisa ser forte".

Não foi momentâneo, e nenhum sofrimento foi esquecido.

Nós encontrávamos deitadas em minha cama, Billie havia terminado o banho a alguns minutos e estava com uma camisa de dormir minha já que a sua estava coberta por vodka. Ela me contava histórias e por onde tinha andado durantes os anos que esteve fora, seus dedos faziam pequenos desenhos em minhas costas por cima do fino pano, encarava o rosto da mesma com interesse e meus olhos brilhavam a cada palavra que saia de sua boca.

Billie passou por diversas coisas e agora que está me contando, vejo que ela aprendeu muito com a vida de uma forma bem dolorosa.

Me vi perdida nas palavras da garota de olhos azuis enquanto a mesma com a voz ainda um pouco embargada continuava a falar. Agora estava recitando algumas coisas que ela escreveu.

Ela começou e seus lábios se moviam com tanta lentidão que me peguei presa neles, meu olhar era fixo e arrepios se faziam presentes a cada palavra que saia.

- Ontem eu recebi uma carta.
O caminho que sempre te seguia, desapareceu.
Os que estavam sempre no caminho também desapareceram.
As pedras que brincávamos aqui e ali,
se mantiveram enterradas com os rostos escondidos.
Eu te amo, eu amo você...
No céu noturno frio e limpo eu vejo a fissuração constante de ouro.
Uma fina neve cai.
Incapaz de se instalar em qualquer lugar no chão.
Um par de flocos fecham os olhos e tremem Enquanto se deslocam juntos sem parar.

As palavras saiam de forma carinhosa, seus olhos me encaravam e novamente levantei o olhar agora ficando sem reação alguma. Uma batalha interna começou dentro de mim e por apenas um motivo, Billie era uma mistura de caos e calmaria.

Antes que seja tarde Onde histórias criam vida. Descubra agora