Um falcão peregrino voava pelos céus da Serra de Sintra. Sara passeava pelo terraço naquela manhã enquanto pensava na carta que tinha recebido. Tinha dúvidas se realmente o chantagista tinha feito aquilo em resultado da sua investigação ou por algum motivo pessoal. Se realmente era assim, as únicas pessoas que a conheciam eram Isabel e Dória. Podiam elas ter-lhe chamado para despistar os restantes familiares e esconderem o facto de uma delas, ou até as duas, serem o chantagista?
Naquele momento, Isabel descia as escadas da entrada. Sara pensou:
- Não pode ser! Nem quero acreditar que uma amiga de tantos anos tenha feito uma coisa destas!
Naquele momento, lembrou-se do dia em que conheceu a amiga, 15 anos mais velha do que ela. Dez anos antes, passeava pelas ruas de Lisboa, em direcção à igreja mais próxima de sua casa. Os seus pais tinham acabado de abrir um restaurante e, como pessoa religiosa, embora não praticante, que era, sentiu necessidade de agradecer a Deus a prosperidade que a sua família atravessava. À entrada dessa mesma igreja, viu uma mulher muito bonita sentada num paralelo com a mão estendida. Juntamente com essa mulher, estava uma menina que devia ter os seus 10 anos. Lembra-se que naquele dia deu-lhe a nota que ia utilizar no peditório da missa, não informando os pais do que fizera. Quando chegou ao restaurante, lembrou-se do anúncio que estes tinham colocado, a pedir uma empregada que os ajudasse. Não tardou a falar da mulher que tinha encontrado, pelo que no dia seguinte voltou a dirigir-se ao local onde a viu e nada. Procurou por algumas ruas próximas e quando menos esperava lá estava ela, a sair do restaurante onde ia buscar restos de comida. Nesse momento, dirigiu-se à senhora:
- Desculpe... Posso falar consigo? - Perguntou.
- Se não demorar muito. É que tenho de ir dar de comer à minha filha! - Respondeu a mulher.
- Sendo assim, siga à vontade até à sua casa que eu a acompanho! - Ofereceu-se a futura inspetora.
- Se a menina é da empresa da luz, não se preocupe que, não tarda, eu pagarei o que devo! - Retorquiu a pobre senhora.
Sara riu-se, pelo que não era pena que sentia por aquela pessoa. Como futura inspetora, o lado humano dela era triunfal, enorme. Mas, determinados sentimentos, não faziam parte do seu vocabulário.
- Não, não sou da luz. Neste momento estou a licenciar-me em direito para posteriormente ingressar na escola de polícia. Mas não é sobre mim que viemos falar, mas antes sobre si! Eu explico-lhe tudo pelo caminho! - Informou Sara.
Quando chegaram à casa, a filha da senhora estava à espera na mesa. O seu olhar de fome comovia a jovem estudante Sara.
- Já agora menina Sara, o meu nome é Isabel! Esta é a minha filha Dória. Desde que o meu marido nos abandonou que ficamos sem nenhuma fonte de rendimento! - Explicou Isabel, dirigindo-se posteriormente à filha. - Esta menina, querida, ofereceu um trabalho à mãe! A partir de agora, as nossas dificuldades vão-se atenuar. Infelizmente, as dívidas e os fiados prosseguem! - Lamentou-se.
Nessa tarde, Sara apresentou Isabel aos pais, que gostaram imediatamente da nova empregada, sem experiência em restauração, mas com uma simpatia que com certeza ia atrair diversos clientes. A partir daquele dia, uma amizade começou a nascer entre a protagonista e a futura mulher do Doutor Afonso Vasconcelos. Começava a trabalhar no dia seguinte. No entanto, recebeu um ordenado extra para pagar o que devia e poder assim encher o frigorífico de sua casa.
Mais de 10 anos se passaram e Sara não queria acreditar que aquela pessoa, aquela amiga que ajudara no passado pudesse agora assombrar a vida de outras pessoas, inclusive a sua. Naquele momento, Isabel veio informar a inspetora que o pequeno-almoço estava a ser servido, mas notou Sara diferente:
- O que é que se passa? - Perguntou.- Parece que estás diferente?
Sara, com lágrimas nos olhos, retribuiu a preocupação:
- Estava a lembrar-me do dia em que nos conhecemos. Estava a pensar no tempo que trabalhaste no restaurante dos meus pais, das noites que lá passávamos, das brincadeiras que tínhamos com a tua filha e até do dia que viste aquele homem elegante à mesa e me disseste que era com ele que haverias de casar mais tarde. O certo é que te casaste... E aquele restaurante nunca mais foi o mesmo!
Isabel emocionou-se, pelo menos parecia, perante as palavras da amiga:
- Sim, foram bons tempos. Se não fosses tu e os teus pais, não sei onde estava neste momento. Nem eu, nem a Dória! Se hoje sou feliz com o homem que amo, apesar dos desvarios desta família, devo-vos, em parte, a vocês! - Afirmou. - Já agora, como estão os teus pais? Já há tanto tempo que não os vejo!
Sara respondeu:
- Continuam no restaurante. Não podiam estar melhor, graças a Deus! Ah... Vieste chamar-me para tomar o pequeno-almoço. Acertei?
- Acertaste! Nesta casa, o pequeno-almoço é sempre servido às 06:30h da manhã, com toda a família reunida! - Disse a amiga.
Sara, mais uma vez, ficou pasmada com as políticas utilizadas pela família Vasconcelos:
- Eu não acredito! Vocês ainda reúnem a família para tomar o pequeno almoço? Bem, vamos lá então...
- Não tens medo que o chantagista envenene a tua comida? - Brincou Isabel.
- Não, mas se envenenarem já sei quem é! - Continuou Sara, irónica.
- Mas sabes que podes morrer não é?
Sara estava a estranhar a conversa, pelo que mudou de assunto...
- Hoje sempre é para ir às compras? - Perguntou.
- Sim. Mas as lojas só abrem por volta das 10:00h, por isso, entretanto, posso contar-te algumas coisas que sei desta família! - Ofereceu-se Isabel.
Mas, Sara nesse momento acabou com os planos da amiga:
- Desculpa, mas quero começar a interrogar as pessoas desta casa e vou aproveitar esse tempo para começar a fazê-lo!
Isabel compreendeu:
- Muito bem! Sendo assim, aviso o Werner para preparar o carro para as 10:30h. Pode ser?
Sara concordou...
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Chantagista
Mystery / ThrillerSara é uma inspetora recém formada de 31 anos que enfrenta agora a sua maior investigação, que não se revelará nada fácil. Na mansão da família Vasconcelos tem de descobrir a identidade de um chantagista lá infiltrado. No entanto, terá de enfrentar...