"Uma imagem vale mais que mil palavras."Este era o adágio que o seguia desde criança e era fundamental em sua profissão. Ele estava pensando nisto enquanto segurava as fotos. Eram cinco delas, cada uma de um dos adolescentes e uma deles juntos em uma festa do colégio.
A princípio, a polícia havia tratado tudo como apenas uma fuga juvenil, seguida de seus imitadores.
Cláudia, quinze anos, jogadora de Vôlei e instrumentista da banda da escola.
Depois André, o mais estudioso de outra classe, dezessete anos e em tratamento de pneumonia nos últimos meses.
Apenas levaram a sério quando sumiu a última moça e aí o haviam chamado.
Estava agora aguardando que o atendessem no apartamento dos gêmeos, Victor e Thiago.
Alguma coisa não cheirava bem naquilo tudo e ele sentia que poderia ser algo muito mais sério do que haviam lhe informado.
__Boa tarde. Eu sou...
__O Reverendo Marcus, correto?
Quem atendeu a porta era a mãe dos garotos de quatorze anos. Parecia muito mais velha que seus trinta anos, após as várias noites sem seus filhos dormirem em casa. Levou-o em silêncio para o quarto dos garotos e deixou-o, arrastando os pés na ida e na volta para a mesa na sala, forrada de lenços de papel. Respeitando o "luto" da mãe, seguiu para o quarto, onde procurava as roupas das fotos dos irmãos. A foto era de poucos dias, postada em uma rede social e que aos poucos, ia se alterando, mostrando outro fundo.
Aquele quarto também estava mudando por causa do evento. Começava o cheiro de coisa velha, acelerando e fazendo com que tudo que fosse deles, se deteriorasse, transformando em pó ao fim do curso dos eventos.
Achou metade da camiseta debaixo da cama e quando pegou este pedaço, ele também se desfez entre seus dedos. Em uma semana, estaria tudo acabado. Voltou até a sala, parou por um minuto, com o farrapo nas mãos e tossiu.
__Me desculpe a sujeira, é que eu não consigo me animar a limpar.
Falou a mulher olhando os dedos sujos do ex Pastor.
Ele deu de ombros, agradeceu o acesso e foi embora.
Na saída do prédio, fez uma ligação.
__Escritório de Belo Horizonte, identificação por favor?
__Marcus Monteiro, E.E. 5732.
__Um momento.
O som de teclas, naquele momento, parecia com os relógios de contas que havia visto em sua infância... cada bolinha de gude, alguns segundos. Segundos a mais no prato, segundos a menos para os jovens.
__Supervisor de Campo Saraiva.
__Boa noite, chefe.
__Marcus?
__Sim. Estou em Santo Antônio do Monte. Verifiquei as casas, o padrão segue inalterado.
__Recolheu fotos?
__Fotos, vídeos, links e objetos pessoais, mas tudo se desfazendo da mesma forma. Há alguma coisa que possamos fazer?
__ Por enquanto, apenas torcer que tudo isto pare.
__Mas já foram mais de duzentas pessoas! A maioria, jovens!
__Você está enganado. A maioria foi de idosos, moradores de rua e soldados. O exército acaba de nos informar que o arsenal deles no Estado do Pará foi encontrado abandonado, completamente desguarnecido. Nenhum homem, nenhum papel, nenhuma ordem.
Marcus segurou o vômito, se apoiou em uma árvore, em frente à Igreja matriz. Dali, conseguia ver a cidadezinha subir e descer os morros, casas bem cuidadas, apesar de antigas, provavelmente uma cidade fundada no início do século.
Desligou o telefone sem se despedir. Seus amigos no exterior informavam que o mesmo vinha acontecendo por todo o globo. Pessoas desaparecendo sem deixar rastros, famílias dando parte às autoridades, mas logo em seguida, tudo voltava às mesmas. As pessoas eram simplesmente esquecidas, deletadas, quaisquer registros sobre elas, simplesmente sumiam... fossem físicos ou digitais. Em alguns lugares, cidades fantasmas eram encontradas, com mercados cheios de mercadorias, carros estacionados e absolutamente nenhum morador humano, apenas animais famintos trancados em apartamentos. Aquelas cidades não constavam em GPS's, nem em mapas físicos.
Apalpou o cigarro no bolso da jaqueta e pegou mais um. Fumava cada dia mais desde que começou este trabalho. Oito meses disso, mas não consegui se lembrar porquê. Devia haver alguma coisa no passado, algum motivo para ter largado sua igreja, abandonado sua cidade, há mais de quinhentos quilômetros de Belo Horizonte e agora, ficava neste trabalho de contar desaparecidos. Olhando em retrospecto, ele sabia que tinha sido feliz. Sabia que tinha realizado seus sonhos e que, voltando a Goiás, veria seus filhos e netos. Mas entre ele e seus mais de dez descendentes, havia um buraco. Era ridículo pensar que havia um buraco ali, mas havia.
Voltou ao hotel e refez o que fazia todas as noites: olhava as fotos no celular, além daquelas impressas que trazia e o único indício que tinha era o fato de estar fora de centro em todas, mas isto era muito pouco para se basear. Ele sempre gostara de viajar sozinho, até onde se lembrava. Saíra da casa de seus pais, aos vinte anos, havia terminado a faculdade, trabalhado duro para criar os filhos, viajado, passeado, festejado e chorado. Sozinho.
Sozinho?
Olhava para as fotos novamente, as dos jovens mineiros, ao lado das suas... e via os buracos se formando. Cinco jovens recém-apagados e em breve, para sempre esquecidos.
Suas mães logo parariam de chorar, contratariam uma faxina completa e seguiriam suas vidas, como se nada houvesse acontecido.
E era isto mesmo. Nada havia acontecido. Ninguém sabia o motivo, a forma e o destino dos desaparecimentos e depois de alguns dias, ninguém se importava.
Como ele lutava para se importar com alguém... Quem?
Faltava um pedaço nele. Um pedaço que coçava, mas só.
Jogou suas coisas na mala, pegou o telefone e ligou para BH: Pediu permissão para sair imediatamente de Santo Antônio do Monte e meia hora depois, seguia em direção a Divinópolis.
Na semana seguinte, um carro foi encontrado abandonado, às margens da MG-050, cheio de pó e documentos em branco. A viatura de polícia que atendeu ao chamado apenas comunicou à delegacia, para o marcarem em um mapa da região. Já haviam centenas de marcas naquele mapa...
Aquele era só mais um.
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Curtas, Contos E Pontos
General FictionHistórias escritas para concorrer "aqui e ali", mas que não passaram no meu filtro, no dos meus leitores beta S2, ou ainda, nos concursos já finalizados Eu os trouxe aqui para uma apreciação de estilos. Leiam, comentem... critiquem. Eu PRECISO de...