Ela esperou até a metade da sopa rala para perguntar:
— Mãe, o vizinho mata mesmo pessoas?
A mãe de Kate lhe deu Aquele Olhar. Claramente, não receberia ajuda aqui.
***
Kate definiu para si um objetivo vespertino. Descobriria o que estava havendo, o que a enviou numa missão ao centro de Watchcombe. O pai de Armand trabalhava na farmácia, então, ela decidiu ir até lá comprar sabonete ou uma rede de pesca. Era uma velha loja na praça do mercado, as vitrines emolduradas por papel celofane amarelo. Do lado de fora, estavam duas mulheres, ambas com ar de imensa pressa enquanto, porém, ficavam ali paradas para fofocar decentemente. Kate demorou-se perto delas, lançando um olhar crítico às casas à venda na janela da imobiliária.
— Bem — sibilou uma para a outra —, eu realmente não deveria parar, pois preciso comprar uns croquetes de peixe para o chá do Arthur.
— Allerdyce está colocando neles mais pão do que deveria — acusou a outra.
A primeira assentiu.
— A massa dele também não anda boa. — Estreitou os lábios. — Não desde que Lucy partiu.
— Ah, esta cidade — cacarejou a segunda, lançando um olhar intenso à farmácia. — Não é mais a mesma. Não é não.
— A velha miss Doyle foi a última. Causas naturais, é o que dizem. Mas sabemos que aí tem coisa, não é?
— Ah, sim — concordou a primeira. — Onde há fumaça, há fogo. — Satisfeita, deu as costas à farmácia e trotou rua abaixo.
***
Kate entrou na farmácia e passou pela prateleira de redes de pesca e pás plásticas. Ao lado, um velho cão dormia num cesto. Atrás do balcão, um distinto homem indiano entregava um pacote de papel a uma mulher de aparência severa.
— Seu medicamento, senhora.
— Esplêndido. Obrigada. — A mulher fez menção de guardar o pacote na sacola de compras, mas se deteve. — Tenho certeza de que está tudo em ordem, sr. Dass, mas estava só imaginando: será que o sr. Stevens se incomodaria em verificar?
O saco de papel pairou entre eles. O sorriso do sr. Dass congelou.
— É exatamente o que sua receita pedia, sra. Groves.
Ela não se moveu.
— Mesmo assim...
O sorriso do homem perdeu a força e desabou da cara. Com uma rapidez alarmante, um velho irrompeu dos fundos da loja, piscando os olhos e detendo-se apenas ao tomar o saco de papel e abri-lo.
— Fico imensamente feliz em fazer isso, sra. Groves, imensamente feliz — riu o homenzinho, segurando o frasco de pílulas diante da luz. — Tudo em ordem. Agora, não vá tomar mais que duas, sim? Cuidado nunca é demais, não é? — Entregou-lhe o pacote, que desta vez desapareceu na sacola de compras da sra. Groves.
Com um alegre "obrigada, sr. Stevens" ela deixou a loja, fazendo o sino da porta tinir.
O sr. Dass virou-se ao seu empregador, o tom de voz contrito.
— Eu realmente gostaria que o senhor tivesse me deixado resolver a situação. Não havia nada errado com o medicamento.
— Oh, absolutamente não. — O sr. Stevens sorriu.
— Nunca houve nada de errado com nenhum dos meus medicamentos. E... — a voz do sr. Dass aumentava. — E não vou deixar que digam... que houve qualquer erro da minha...
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Quando Cair o Verão & Outras Histórias
Mystery / Thriller"Quando o verão acabar, o Senhor do Inverno surgirá..." No vilarejo costeiro de Watchcombe, a jovem Kate está determinada a aproveitar o máximo sua última semana de férias de verão. Mas quando ela descobre uma misteriosa pintura com o título de 'O...