Capítulo 6

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Kate ofegou em horror. A criatura que a encarava era Brewster, mas, de algum modo, terrivelmente transformado — a boca espumava, e os olhos a fitavam com insanidade. Ela recuou, gritando por socorro, e sentiu a lanterna cair da mão com o impacto do cão. 

Normalmente, Brewster era um cachorrinho bem modesto. Mas agora era um furacão de dentes e fúria. 

— Socorro! — gritou, esperando que Milo, ou até Armand, viesse ajudá-la. Mas não pôde ver ninguém na boca de caverna. Estava por conta própria. O cão se lançou contra ela, derrubando-a de costas, o baque tirando-lhe o fôlego. Tudo nela doía, o animal sobre ela antes que tivesse chance de dominar os sentidos. 

Sentiu que algo fluía pelo pescoço. Oh , pensou, ele me mordeu, estou morrendo! E logo percebeu que era a baba do cachorro. 

Brewster recuou, pronto para outro ataque. Empinou-se para avançar, e, enquanto isso, Kate agarrou a parede da caverna e jogou-se contra o cão em pleno salto. 

As solas dos sapatos atingiram Brewster, atirando-o num giro para trás, escorregando impotente no gelo. 

Kate se levantou e correu, ultrapassando o cachorro, que se agitava confuso. Passou em disparada por ele, fugindo para a praia. Emergiu na escassa luz do dia. 

— Milo! Armand? — chamou. — É o Brewster! Ficou doido! — Mas sua voz ecoou pela praia vazia. Os garotos haviam desaparecido. 

Atrás de si, ouviu rosnados. 

Sem tempo para alcançar a estrada, começou a escalar o rochedo íngreme, as mãos nuas já entorpecidas de frio. Brewster tentou morder-lhe os calcanhares, incitando-a a subir. Chegou a uma pequena borda, a meio caminho do topo. 

Ainda não havia sinal de Milo ou Armand. 

Também não havia volta agora. Avançou lentamente ao longo da borda, alcançando a lateral da Angra da Caveira. Aqui, havia uma trilha estreita, pouco mais que uma calha natural de água de chuva, mas tornava a subida ligeiramente mais fácil. Agora, a dor nas mãos era penetrante — quanto mais alto ia, mais exposta ficava e mais frio sentia. Balançou a cabeça e se alçou para adiante, para cima, até jogar-se no topo do rochedo. O casaco fora cortado por espinhos, o cabelo estava uma bagunça e ela arquejava como se tivesse corrido uma maratona. Mas experimentou uma enorme sensação de realização. 

Quando se levantou, viu Armand e Milo ali, de pé, observando-a. 

— Aí estão vocês! — disse, aliviada. — Aonde vocês foram? O que aconteceu com o Brewster para ele ficar tão irritado? Os dois garotos continuaram olhando-a, inexpressivos. 

— Alguma coisa o assustou. É melhor que um de vocês seja corajoso o bastante para descer e acalmá-lo, porque eu não sirvo. — Kate deu uma risadinha. 

Nenhum dos dois riu. 

— O que há de errado? — perguntou. — O que aconteceu? Milo? 

O garotinho fitou-a, olhos arregalados. 

A suspeita despertou nela. Olhou para Armand. 

E percebeu algo. Ele estava mesmo nervoso. 

Tremendo. Com medo. 

— O que foi? — insistiu ela. 

— O que você fez? Fez alguma coisa horrível, não foi, Armand Dass? É bem típico de você me deixar na mão. 

Ele balançou ligeiramente a cabeça. 

— Não. 

A firmeza na voz de Milo a assustou. O garotinho dos cachos dourados e sorriso simples estava transformado. O sorriso agora era estreito e cruel. Os olhos azuis já não faiscavam. 

Quando Cair o Verão & Outras HistóriasOnde histórias criam vida. Descubra agora