O mundo recomeçou.
Kate estava na plataforma em cima do farol. Uma faixa de céu azul-claro raiava entre as nuvens. O sol estava quente contra a pele gelada. Ela sentou.
Pés retumbaram pelos degraus metálicos e Armand surgiu correndo para ajudá-la. Atrás dele veio Barnabas, segurando algo nos braços. Primeiro, ela pensou que fosse um casaco. Depois, entendeu.
Era o corpo do gato cinza.
— Ah! — disse Kate. Correu em direção ao Curador. — Faça alguma coisa! — gritou. Ele balançou a cabeça, tristemente oferecendo-lhe o volume que carregava.
Ela embalou o gato nos braços. Os olhos dele se abriram, trêmulos.
— Ah — suspirou o bichano. — Olá. — Tentou lamber uma pata, mas desistiu e piscou para a garota. — Está gostoso e quentinho aqui. Finalmente.
Kate ergueu o olhar. A faixa de céu azul se espalhava. As nuvens fugiam às pressas, como que envergonhadas.
Um raio de luz solar desceu, reluzindo no cata-vento.
— O inverno acabou — disse Barnabas, triste. — O sol está saindo.
— Estou vendo. — O gato esforçou-se debilmente para roçar no queixo de Kate. Desistiu.
— Então, é assim que é a morte. Eu ficava imaginando. Interessante. — Os bigodes se contraíram. — Pode me colocar sob o sol, por favor? Eu gostaria de sentir o calor.
Kate fez o que ele pedia, estendendo as mãos o máximo que pôde.
— Gostoso — murmurou o gato e bocejou.
— Não! — soluçou a menina.
— Receio que sim — disse o bichano. — Estou tão cansado. Terrivelmente cansado.
As pálpebras tremeram e se fecharam de vez. O gato cinza ronronou por algum tempo; depois, silenciou.
Kate segurou o volume imóvel até os braços doerem. Depois, Barnabas tomou-o gentilmente dela.
— Sinto muito — disse ele.
Kate esfregou o nariz, depois foi até a grade.
— Cadê o sr. Mitchell? — perguntou.
Armand apontou. O velho estava lá, desafiadoramente no chão.
— Façam como quiserem! — rugiu. — Daqui eu não saio.
Barnabas foi até a grade e olhou para baixo.
— Menininhos — bradou — não devem brincar com brinquedos que não são deles.
— Não sou menininho — replicou o sr. Mitchell, orgulhoso.
— Ah, é, sim — disse Kate. — Você envelheceu, mas nunca cresceu. É uma pena. Desperdiçou sua vida.
— Suba aqui — incitou-o Barnabas. — Este mundo está se dissolvendo e nós vamos para casa. O topo do farol é o único ponto seguro.
— Seguro? — gritou o velho. — Até parece. Vou ficar aqui.
— Não pode fazer isso! — disse a garota. — Ainda há tempo! O Senhor do Inverno se foi. O verão está voltando.
— Não acredito em você. — Ele foi desafiador. — Vou ser jovem outra vez! Ele não pode ser derrotado por uma menina idiota.
Nesse ponto, Kate decidiu que realmente não lhe importava o que acontecesse a ele. — Vou ficar aqui — repetiu o sr. Mitchell.
Enquanto falava, figuras surgiram pelo mar. Figuras espectrais com rostos jovens. Vestiam uniformes e marchavam silenciosamente em direção à costa.
— Viu só? — riu Milo. — Estão todos voltando para casa. Todos os meus amigos. Vamos todos ser jovens para sempre! Finalmente consegui o que quero.
Enquanto falava, uma fenda ecoou pelo mar. As figuras fantasmagóricas desapareceram quando o mar se partiu em dois, a água jorrando de um zigue-zague, icebergs desabando em direção ao porto. As paredes tremeram com o impacto e o farol se inclinou num ângulo alarmante. De fato, pensou Kate, se você estiver no topo de um farol, qualquer ângulo que não seja perpendicular é alarmante.
— Depressa! — gritou Barnabas. — Segurem na grade! Isto está prestes a ficar muito excitante.
O farol se inclinou, caindo em direção ao sol, que, de repente, vinha em direção a eles muito rápido.
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Quando Cair o Verão & Outras Histórias
Gizem / Gerilim"Quando o verão acabar, o Senhor do Inverno surgirá..." No vilarejo costeiro de Watchcombe, a jovem Kate está determinada a aproveitar o máximo sua última semana de férias de verão. Mas quando ela descobre uma misteriosa pintura com o título de 'O...