Capítulo 3

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Quando Kate acordou, era inverno. 

Por um tempo, ela não notou. Primeiro, descobriu que o gato se fora. Então, percebeu quão frio estava. 

Pôde ver a própria respiração vaporosa no ar do quarto. Saiu da cama, impressionada com a frieza do chão de madeira sob os pés. A busca apressada pelos chinelos foi infrutífera, e ela invadiu o guarda-roupa da sra. Mitchell para pegar um casaco de inverno muito antiquado que fedia a naftalina. Pôs três pares de meias que não combinavam e desceu a escada pisando duro. 

Agora, acima de tudo, gostaria que a mãe lhe tivesse feito uma xícara de chá. Mas não havia sinal dela. 

Nem na cozinha, nem na poltrona onde dormia, nem mesmo na cama. Talvez tivesse saído. Kate perscrutou o exterior por uma janela. 

Foi quando percebeu que havia nevado. Olhou para a neve. 

— Isso é lindo — suspirou. — Mas bastante absurdo. É 3 de setembro. 

Apesar disso, a neve ficou onde estava. Polegadas de neve densa, real e gloriosa, cobrindo desde o jardim até a estrada e a cidade. 

— Interessante — comentou Kate. — Nenhuma pegada. Então, ou a mamãe saiu antes de a neve cair ou... 

Mas não conseguia determinar o que seria esse "ou...". 

Então, preparou para si uma xícara de chá e saiu à caça de galochas e luvas.

***

Kate marchou ruidosamente pela neve. Era toda sua. 

Por toda a vida, quisera ser a primeira pessoa a andar na neve, mas nunca conseguira. Não importava quão cedo acordasse, alguém sempre estivera lá primeiro. Mas não agora. 

Podia ser a última semana do verão, mas Kate já conseguira dois amigos, encontrara uma pintura e um anel, consertara uma bicicleta e fora a primeira pessoa a pisar na neve. 

Tocou a campainha de Barnabas. Ele não estava. Passou pela casa de Armand. Parecia vazia. Não quis tocar a campainha, já que naquele momento preferia não falar nem com Armand nem com o pai dele. 

Desceu a estrada para ver se havia alguém na cidade. Mas todas as ruas pelas quais andou estavam desertas. As casas estavam escuras, os carros enterrados sob a neve. Embora fosse dia, as luzes dos postes ardiam fracamente. 

Tudo era silêncio. Silêncio total. Foi então que Kate entendeu o que havia de errado. O som que faltava. Desceu correndo até o porto e olhou. 

O mar congelara. 

***

Kate ficou ali, olhando o oceano por muito tempo. Nunca vira nada tão impossível, tão belo. Olhou para as ondas ao longe, congeladas na forma de picos de montanha, estendendo-se rumo a um escuro céu distante, e sentiu medo. Estava sozinha num mundo que era um sonho. 

Pensou ter ouvido algo. Um grito distante, quem sabe, ecoando na muralha de água. Gritou naquela direção, mas não houve resposta. Então, notou algo. 

Havia marcas na neve. Marcas pequeninas. Marcas de patas. Seguiu o rastro delas, as botas penetrando profundamente a neve, passando pelos pequenos barcos presos na água gélida, indo além de uma série de cafés e uma velha estalagem... até a muralha do porto. Sentado no muro, olhando para o mar, orelhas em riste, estava o gato cinza. 

Virou-se para olhá-la, sem piscar. Kate nunca havia ficado tão contente em ver algo na vida. Fez menção de tocar o gato, mas este recuou. 

— Ah, gato — disse ela. — Isso é simplesmente impossível. Eu estava lá em cima. Dormindo. Daí, isso aconteceu. Não faz nenhum sentido. Como pode ter acontecido? Alguém causou isso? 

Quando Cair o Verão & Outras HistóriasOnde histórias criam vida. Descubra agora