Sophia chegou à porta da sala da 7ªA, dentro da sala, Professora Lucinha lia Camões. O corredor estava em silêncio, como de costume, e, através do vidro da porta, ela viu Matt acompanhando o trecho lido pela professora.
— "Descalça vai pela neve: Assim faz quem Amor serve."
Professora Lucinha explicava com cuidado a poesia.
— Esta é uma redondilha e faz parte daquilo que chamamos de "O ciclo da Donzela." Esta donzela caminha, olhemos para a poesia, "descalça." Ela vai para um lugar, o lugar em que espera encontrar o seu amado. Observem que o amor da jovem donzela é tão forte que ela é capaz de transpor qualquer obstáculo. Vejam que na redondilha ela caminha sobre a neve, e está descalça. Conseguem imaginar alguém caminhando, sem nada nos pés, sobre a neve fria?
Mathieu sabia o que era o frio do inverno e o que a neve podia causar a pés descalços. Quanto ao amor descrito por Camões, ele sabia que este tipo de amor era possível.
— Lembrem-se do lirismo presente aqui. Vejam: "Moça fermosa despreza;/ todo frio e toda dor./ Olhai quanto pode Amor/ Mais que a própria natureza." Esse tipo de poema tem musicalidade, percebam que a emoção aqui é envolvente. — Profª Lucinha parecia empenhar-se em transmitir o significado daquela poesia.
Prosseguindo com a aula, a professora pediu para que Matt lesse "Cantiga Alheia" e ele leu:
— "Na fonte esta Lianor lavando a talha e chorando/ às amigas perguntando: vistes lá o meu amor?"
Matt olhou para a professora e a professora assentiu a que continuasse a leitura.
— "Posto o pensamento nele." — ele parou de ler, passou a mão nos cabelos e prosseguiu. — "Porque a tudo o amor obriga."
Sophia não ouvia o que diziam na sala de aula; e, sem saber, interrompeu a leitura ao bater à porta. Professora Lucinha disse para Matt continuar a leitura e foi ver quem estava à porta. Ela viu que era Sophia.
— Sophia, tudo bem? — a professora ficou intrigada.
— Bom dia, Professora Lucinha! Está tudo bem. Desculpe interromper; eu posso falar com Mathieu por poucos minutos?
— Não demore. Estamos em aula. Aguarde aqui. Vou chamá-lo.
A professora chamou o rapaz, porém a turma não viu que Sophia estava lá fora. Nem mesmo suas amigas sabiam o que ela pretendia fazer. Quando ele saiu da sala e se deparou com Sophia, seu coração mudou.
— Sophia, tudo bem?
— Mathieu... — ela estava insegura. — Podemos conversar?
— Sim. Claro que sim.
— Matt, eu quero que sejamos amigos...
Ela estava com um convite na mão direita. Parecia desconfortável com a situação. Parecia como quem enfrenta o maior de seus medos. Sentia-se como alguém que espera por um dia de sol, mas o que vê, são nuvens de uma grande tempestade.
O convite, em suas mãos delicadas, era todo feito com detalhes em prateado e em dourado. Feito carinhosamente pelas noviças que moravam no casarão do farol. As noviças eram encarregadas de fazer cada convite, um a um, manualmente. Cada letra e cada relevo eram igualmente compostos. As letras eram lindas. Linhas entrelaçadas, flores e traçados perfeitos. O carinho e o cuidado com as debutantes do colégio eram mostrados em cada um daqueles convites. Sophia recebeu um convite para entregar para aquele que dançaria a valsa com ela.
Ele a olhava e sentia-se ainda mais enamorado. Talvez, não pudesse manter a distância exigida; dizer não aos seus sentimentos. Mas por hora, precisava manter firme o que prometera.
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Todas as Manhãs
RomanceA vida é feita de memórias. Lindas e doces lembranças feitas com o tecido de grandes amizades, amores, gestos de afeto e muitas palavras. Essas memórias podem ser de muitas cores, mas formam uma única pintura. O livro "Todas as Manhãs" conta a hist...