Capítulo 15

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MARATONA- cap. 3/6

Entrei na faculdade de engenharia. Eu fazia mágica com o tempo. Trabalhava de tarde e, às vezes, de noite. Estudava, aprendia inglês. Passava os fins de semana fincado nos livros, pondo em dia a matéria ou trabalhando na loja, quando o serviço acumulava.
Consegui entusiasmar Carlos e Antônio para estudarem também. Eles faziam Direito. Eram amigos leais e simples. Durante aqueles anos todos, nunca deixei de pensar em ti. Vivíamos na mesma cidade. Nossos mundos, porém, continuavam distantes. Impossíveis.
A guerra havia terminado. E as coisas aconteciam muito depressa. Os meios de comunicação foram se expandindo, diminuindo o tamanho dos problemas mas criando outros, maiores e, talvez, piores. Como eu previra, a eletricidade que já desempenhava importante papel na vida do homem moderno, era agora um deus que alimentava as indústrias, dava conforto à vida. Uma nova era começava. Começou-se a falar em eletrônica. Poucos sabiam o que isso representava. Fui dos primeiros a pensar em construir uma televisão experimental, com os recursos do laboratório da Faculdade. A engenhoca não funcionou cem por cento mas deu para provar que era possível transmitir imagens à distância. Mais tarde voltaria a trabalhar nisso, mas em outras bases, e com mais sucesso.
Seu Tomás continuava ranzinza, mais por hábito do que por necessidade. Tínhamos dois balconistas e um ajudante na oficina. Estávamos pensando em alugar a loja ao lado, para aumentar a nossa. Eu sabia que não se podia pensar em coisas pequenas. Era importante para o meu futuro pensar grande. Eu pensava em ti.
Chegou o Natal. O terceiro que eu passava em São Paulo. Carlos e Antônio viajaram para suas casas, no interior do Estado. A pensão ficou vazia. Eu fiquei. Não tinha família. Pela primeira vez, percebi que estava realmente sozinho no mundo. Antes, quando era pobre, mal tinha tempo para pensar nisso. Mas agora que as coisas melhoraram, eu começava a sentir com nitidez a minha verdadeira situação. E mais do que nunca necessitava de ti. Pois não imaginava minha vida sem o teu amor.
Por causa disso, decidi fazer um Natal para os outros. Combinei tudo com Dona Maria. Convidamos os amigos e conhecidos que sabíamos que eram sozinhos no mundo, tal como eu. E mais Seu Tomás, Dona Joana, seus filhos e netos. Armamos uma enorme árvore de Natal na sala principal da pensão. Comprei presentes, frutas, flores. Na grande noite tivemos 20 pessoas para a ceia. Dona Maria estava feliz. Eu também. Tinha descoberto que se pode ser feliz dando alegria aos outros.
Mas nem tudo tinha acontecido, então. Eu teria de passar por uma prova amarga para o meu orgulho. E decisiva para o meu futuro.
Foi no 4° ano de Engenharia. Hospedou-se na pensão de Dona Maria um novo rapaz, Belmiro, de uns 22 anos de idade, vindo de Goiás. Era um rapaz calado, triste, que fazia questão de se isolar de todos. Eu respeitava a sua maneira de ser, mas Dona Maria não gostava dos modos dele:

   - Cuidado com esse Belmiro. Alguma coisa me diz que ele está escondendo alguma coisa!

Eu achava graça. No fundo, apreciava Belmiro, era diferente de nós mas mantinha sua dignidade. Pagava pontualmente seus compromissos e trabalhava num banco, como caixa. Mais tarde - dizia ele - iria reiniciar os estudos, pois queria ser contador.
Tudo aconteceu de repente. Foi no mês de abril, havia uma garoa insistente caindo sobre a cidade e eu fui para a Faculdade bem cedinho, pois tinha uma prova importante. Quando sai da pensão, notei que Belmiro também saía de seu quarto, levando uma enorme mala nova.

   - Vai viajar? - perguntei, interessado.

   - Sim... recebi uma carta, minha mãe está doente em Morrinhos e eu preciso ir vê-la.

Lamentei sinceramente a aflição do colega de pensão e não me passou pela cabeça que teria problemas por causa disso. Nem sequer dei importância ao fato de que ele levava uma mala absolutamente nova. Geralmente, as malas dos fregueses de uma pensão são velhas, herdada dos pais e avós, caindo aos pedaços. Aquela mala nova era  sinal de uma súbita abastança.
Fui para a Faculdade, fiz a prova, almocei por lá mesmo. Depois passei pela loja do Seu Tomás, da qual já era o sócio mais importante. Não acreditei quando vi o rosto dele, me olhando severamente:

~❤️𝑈𝑚𝑎 𝐻𝑖𝑠𝑡𝑜𝑟𝑖𝑎 𝐷𝑒 𝐴𝑚𝑜𝑟❤️~ Adaptação Sprousehart ❤️ Onde histórias criam vida. Descubra agora