Tive sonhos estranhos, eu já era um home feito e morava em uma cabana perto de uma floresta. Um sonho tão real que me arrepio só de lembrar.
Acordei com as estrelas, nem os primeiros resquícios do sol haviam aparecido. Como de costume acordei cedo, nunca conseguia dormir até tarde, arrumei minha cama e silenciosamente segui em direção ao corredor. A casa onde se localizava o orfanato não era tão grande ou espaçosa, muitas das paredes ainda eram de pedras que com o tempo ficaram verdes por causa do lodo. Desci as escadas em espiral nas pontas dos pés. Eu ia conseguir, assim que encostei os dedos na maçaneta da porta ouvi uma tosse atrás de mim.
- Indo a algum lugar Carlos? As estrelas nem se deitaram e já esta querendo sair?
Desviei meus olhos da madame Visco, que apenas usava um leve traje de dormir.
- Obrigado por ser tão respeitável, mas é falta de educação sair sem avisar.
Olhei em seus frios olhos verdes, alguns fios de seu cabelo grisalho saiam da touca que pendia em sua cabeça.
- Eu consegui um trabalho. Me contrataram em uma ferraria! Eu não posso me atrasar!
Seus olhos me analisaram e um suspiro saiu como um assovio de seus finos lábios secos.
- Só quero o melhor para vocês. Da próxima vez espero que me avise antes de sair assim.
Voltei meu olhar para meus pés quando a madame passou por mim e retirou uma chave de dentro da manga da vestimenta de dormir.
- Agora vá, não quero que se atrase.
Sai correndo, infelizmente meu novo e primeiro trabalho não era tão perto quanto eu gostaria. As ruas da pequena cidade ainda eram iluminadas pelas lamparinas quando cheguei na ferraria. O grande homem de barba ruiva e de aspecto sujo moldava uma espada. Assim que me viu o homem sorriu mostrando dentes já gastos pelo tempo e falta de cuidado.
- É assim que eu gosto! Pontualidade! Não acha que só por que tive pena de você, não significa que eu vou pegar mais leve não ouviu moleque? A vida é dura.
Apenas balançava minha cabeça confirmando tudo, aquele homem poderia dar medo em qualquer um, mas sabia que por me ajudar ele se tratava de uma pessoa boa.
Alguns anos depois...
Depois de anos trabalhando na ferraria, finalmente tive o dinheiro necessário para construir uma pequena cabana no meio da floresta, a casa era um pouco longe da cidade, mas assim como eu, Márcia não importava. Quero dizer, ela falava que não se importava, mas de acordo com que os anos iam passando ela ficava diferente, ela sempre relembrava seu passado de duquesa. Sempre dei tudo de mim para mantê-la feliz, já passei fome para ela comer o que tinha vontade, principalmente durante o final da gestação.
Bati com força o martelo na espada, moldava uma das minhas últimas espadas do dia. Um medo me passou pela cabeça, brevemente perderia todos os meus clientes, que já eram poucos. Depois de alguns anos, muitas pessoas saíram da cidade em direção a cidade grande, não que a capital fosse tão longe, mas as pessoas mudavam para comprar casas mais luxuosas, ir para bailes e outros eventos chiques da sociedade. Com isso todos os anos recebia cada vez menos clientes, até mesmo depois que o meu grande amigo e chefe morreu, em seus últimos momentos ele deixou a ferraria para mim, naquele ano várias pessoas morreram pela praga que assolava as cidades.
Terminando a espada fechei a loja e comecei a seguir para minha casa. A luz do sol ainda iluminava todo meu caminho quando cheguei a entrada da floresta. A mata era densa e as árvores altas, assim nunca teria intrusos. Depois de caminhar por cerca de vinte minutos, finalmente cheguei no centro da floresta, no meio de uma grande área de mata rala estava uma confortável cabana, nem um pouco luxuosa, mas com certeza um orgulho para mim que nunca havia pensado em ter uma casa, ou uma família.
- Meu amor? Cheguei!
Christopher veio correndo em minha direção, seus pequenos bracinhos me abraçaram pelo quadril. Ele olhava pra mim com seus redondos olhos acinzentado.
- Cadê a mamãe? - perguntei com a voz mais fofa que pude, a garganta rouca não ajudou deixando minha fala engraçada.
- Ela esta no carto!
Christopher começou a falar tarde, mas falava muito bem para uma criança da sua idade.
- Quer aproveitar o sol e brincar um pouco lá fora? - ele balançou a cabeça com veemência. - Então vá, mas não demore.
Christopher também era alto para a sua idade, ele abriu a porta e saiu a deixando aberta.
Com passos largos fui em direção ao nosso quarto. O presente! Tinha me esquecido totalmente do lindo presente que eu havia mandado fazer para meu amor. Voltei para sala já correndo para frente do sofá, agachei-me retirando uma pequena caixinha de veludo preta de baixo do sofá. Escondi a caixinha nas costas e andei em direção ao quarto.
- Amor? - a chamei suavemente.
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Uma vida em um Sonho
Kısa HikayeEm algum lugar perto de uma lareira, alguém lia um livro de contos, sobre como a mente humana é frágil e ao mesmo tempo complexa. Mas essas histórias não começam com o famoso "Era uma vez", diferentemente essa começava com um alto e agudo...