02 - Laços que se cruzam

39 6 0
                                    

Já era de manhã, quando Alan e dona Mercedez tomavam café. Esmeralda acordou em seguida — pois ainda estava exausta da noite anterior. — Ela foi rapidamente para o banho e assim que pôs uma roupa, desceu a escada em direção a sala de jantar, onde encontrou Alan comendo sozinho. O rapaz a encarou assim que a viu, seu sorriso amarelado pelo café a fez sentir borboletas no estômago. Parecia que estava conhecendo seu melhor amigo naquele instante. Meigamente, Esmeralda retribuiu o sorriso.

Alguns passos adiante e já estavam sentados um de frente ao outro. Esmeralda não sabia o que falar ou o que pensar. Ainda estava vergonhosa com a noite anterior e com o assunto da caixa dourada... Queria não poder tocar no assunto, mas sabia que isso seria impossível. Todavia o que pôde dizer no momento foi apenas um...

— Bom dia.

— Bom dia. — Retribuiu ele gentilmente. — Dormiu bem...? — Continuou Alan a puxar assunto, enquanto passava manteiga em uma fatia de pão de forma.

— Sim... E você? — Perguntou ela pegando a jarra de suco de laranja na mesa.

— Como nunca! Foi difícil dormir no começo, pois era a minha primeira noite aqui...

— Entendo...

Alan ia puxar mais assunto, até que dona Mercedez aparece e interrompe sua coragem. A velha senhora usara uma roupa formal, como sempre usava para ir ao trabalho. Milagrosamente Mercedez estava atrasada essa manhã.

— Bom dia, querida. Vejo que já se acordou... — Disse Mercedez beijando a cabeça de sua neta. — Isso é bom, pois quero que cuide do nosso convidado. — Ela sorriu para Alan enquanto falava com Esmeralda. — Ah, aliás Alan irá com você hoje ao colégio para se matricular...

— Hoje não terá aula. — Avisou Esmeralda. — Hoje vou, apenas, para arrumar a bagunça que ficou da noite passada... Penso que quase nenhum funcionário da secretária estará lá...

— Mesmo, assim... Leve-o e apresente-o aos seus amigos, assim fará novos amigos... — Indagou Mercedez pegando sua pasta preta e as chaves de seu carro. — E se tiver algum funcionário na secretaria, vocês resolvem logo essa questão...

Esmeralda assentiu.

— Bom... Estou indo... Tenham uma ótima tarde, crianças. — Disse por fim Mercedez saindo de sua casa.

Alan e Esmeralda ficaram em silêncio por um instante.

— Se não quiser, nem precisa me levar ao colégio hoje... — Disse Alan terminando seu café da manhã.

— Não fale bobagem. — Repreendeu Esmeralda. — Lógico que te levarei. — Ela levanta-se da cadeira. — Vai ser ótimo te apresentar aos meus novos amigos.

Alan sorriu.

— Só espere um segundo. Vou escovar os dentes e logo saímos. — Disse ela subindo a escada.

Alan fez questão de levar os pratos a cozinha, contudo foi impedido por Maria, que logo chega e pega os pratos das mãos dele.

— Não vai querer fazer o meu trabalho, certo? — Disse Maria erguendo uma sobrancelha.

— Não, não... Desculpa. — Ele ri, brincalhão.

De repente a campainha toca na porta.

— Eu atendo! — Disse ele correndo a porta de entrada.

Maria recua a cozinha, deixando-o atender a porta. O rapaz olha pelo "olho mágico" e se depara com um rapaz pálido e com cabelos finos e negros. Era Calisto, contudo Alan não saberia de quem se tratava. Mesmo, assim, o jovem rapaz abriu a porta.

Calisto imediatamente olhou-o estranhamente. Por um momento teve receio de ter errado a casa de Esmeralda, todavia conferiu o número da casa, discretamente, do lado de fora, sem que Alan percebesse. Ele não tinha gostado de ver um garoto na casa de sua amada.

— Bom dia, em que posso ajudar? — Perguntou Alan sendo gentil.

— Esmeralda se encontra...?

— Sim, sim... Ela está...

— Calisto! — Gritou Esmeralda ainda descendo a escada, interrompendo Alan de explicar onde ela estava. — Já estava saindo.

Imediatamente Alan abre mais a porta para que Calisto adentrasse na casa. O vampiro entrou e foi direto a Esmeralda para abraçá-la, o que deixou Alan enciumado. Por um momento pensou que Calisto fosse o namorado de Esmeralda, mas decidiu não acreditar nessa hipótese.

— Como você está? — Perguntou Calisto sendo carinhoso. — Conseguiu dormir bem...?

— Ah, sim... Claro. — Respondeu ela rindo. — Alias, quero te apresentar Alan. Meu amigo de infância. Estudávamos juntos na minha antiga escola...

Alan já estaria próximo deles. Educadamente cumprimentou Calisto com um aperto de mãos. Nesse instante percebeu o quanto Calisto era frio ao ponto de gélido, o que era inacreditável em uma região tão quente como aquela. Ele teria saído do freezer? — Perguntou a si mesmo.

— Prazer... — Disse Alan soltando a mão do vampiro.

Calisto assentiu.

— O que veio fazer nesse fim de mundo? — Ironizou Calisto sentindo ciúmes, algo que não conseguia esconder.

— Bom...

— Ele veio me visitar. — Disse Esmeralda interrompendo-o. — Veio morar conosco algum tempo, até encontrar um lugar pra viver. — Ela amarra o cabelo, fazendo um rabo de cavalo e dá uma pausa na explicação. — Alan quer ser independente. — Ela sorriu por fim.

— Péssima ideia. — Indagou Calisto sendo o mais sarcástico possível.

— Hã? Por quê...? — Perguntou Alan com os braços cruzados.

— Não ligue pra ele, Alan. — Falou Esmeralda dando um tapinha no ombro de Calisto. — Calisto é muito "otimista".

Já estava na cara que Calisto e Alan não estavam gostando um do outro. Era como se ambos fossem uma ameaça. Dentro de seus corações o orgulho batia mais alto e explicitamente, pois não queriam admitir que seu adversário fosse belo e um forte competidor na conquista da garota. Esmeralda não desconfiara de nada e nem queria pensar nessa hipótese. Já bastavam as rixas de Calisto e Rafael.

Alan sorriu forçadamente, querendo com todas as suas forças que Calisto fosse embora, contudo o pobre jovem não sabia que o misterioso e esquisito rapaz magro ficaria bastante tempo com Esmeralda e, pior, com ele.

— Calisto, Alan irá para a escola com a gente hoje. — Disse Esmeralda por fim.

— Sério? — Indagou Calisto fazendo uma careta de desaprovação. — Irá se juntar a criadagem? — Ironizou ele, pois todos iriam ajudar na arrumação da festa passada.

— Ele vai estudar na Brasílica. — Falou Esmeralda.

— Isso, sim, é uma novidade... — Calisto olhou de cima a baixo o pobre Alan, vendo-o como um inseto. Um inseto perigoso que deveria ser esmagado quanto antes.

Alan apenas assentiu. Estava com as mãos nos bolsos da bermuda cinza xadrez. Seu sorriso era desperto toda vez que Esmeralda o encarava. Borboletas surgiam em seu estomago.

Esmeralda usava naquele momento um short jeans e uma blusa regata azul, o que a deixava desleixada. Contudo, ainda ficava linda. Seus cabelos estavam, agora, amarrados num rabo de cavalo, como se ela acreditasse que iria por as "mãos na massa" junto de seus amigos para arrumar a bagunça da festa passada.

— Vamos indo, então... — Argumentou Esmeralda, pegando em um dos braços de Calisto e guiando-o perto de Alan, onde também pegou um dos braços do rapaz, conduzindo-os até a porta de entrada da casa.

Era engraçado ver Alan e Calisto se encarando desconfortavelmente. Parecia uma disputa de "quem agrada mais". Como se não bastasse passar por isso com Rafael, Calisto ainda teria que enfrentar as investidas de Alan para Esmeralda. O dia hoje prometia ser longo...

Eles não demoraram muito no condomínio "Novo Lar". Foram rapidamente para o carro de Calisto, que já estava estacionado próximo à casa de Esmeralda. Calisto abriu, gentilmente, a porta de carona para Esmeralda entrar, enquanto Alan se assentava no banco de trás do automóvel.

— Então... Alan, certo? — Começou Calisto já dirigindo o seu carro. — O que te trouxe a Coruripe?

— Estudar. — Disse por fim Alan, distraído com a paisagem do lado de fora do carro.

— Alan quer ser independente. — Argumentou Esmeralda.

— Hum, isso é bom. — Indagou Calisto prestando atenção na estrada.

— Sim, é. — Afirmou Alan, sério.

— Mas por quê escolheu Coruripe? — Calisto queria de qualquer forma entender as intenções de Alan para com Esmeralda. Queria descobrir e depois agir...

— Gosto daqui... Mas não posso negar que escolhi esse lugar por causa de Esmeralda. — Disse ele encarando Calisto pelo retrovisor.

Houve um breve silêncio no momento. Esmeralda estava envergonhada e temia ouvir nesse momento as declarações de amor do seu melhor amigo, temia que ele citasse algo da carta que tinha lhe escrito. Enquanto Calisto vibrava por dentro de ciúmes.

— Como assim...? — Perguntou Calisto.

— Nós somos próximos. - Disse Esmeralda, interrompendo qualquer argumentação de Alan.

— Sim, isso é verdade. — Falou Alan ainda distraído com a paisagem do lado de fora.

Eles passaram o resto caminho em silêncio. O clima parecia pesado para Calisto e Esmeralda, contudo para Alan continuava o mesmo. Sem assunto para discutirem.

O carro finalmente passava pela entrada da cidade. As casas e as pessoas começavam a aparecer na visão deles. Tudo parecia estar como antes. Nenhuma novidade e a mesma morgação de sempre. A lanchonete mais popular do bairro parecia estar vazia, ou quase vazia naquele instante. Era impossível não se lembrar de tudo o que aconteceu naquele estabelecimento. As lembranças tomavam conta da mente de Esmeralda.

Alguns quilômetros adiante e já estavam na rua do colégio Brasílica: O mais antigo e convencional colégio da cidade.

O carro para e todos descem.

— Bem-vindo ao Brasílica. — Disse Esmeralda a Alan, sendo irônica e cordial.

Ele assentiu sorrindo.

— O colégio mais chato e doentio da cidade. — Ironizou Calisto, apertando no botão de alarme do seu carro.

— Não seja tão exagerado, Calisto. — Protestou Esmeralda. — Houve bons momentos aqui... — Ela suspirou, relembrando tudo o que tinha acontecido com a mesma nesses últimos dias no colégio. Foram tantas recordações.

— Me parece ser um bom colégio... — Argumentou Alan.

— Só parece, mesmo... — Novamente Calisto ironiza.

— Para, Calisto! — Protestou Esmeralda dando um leve beliscão no braço de Calisto, enquanto o mesmo se dirigia ao portão de entrada.

— Ele é sempre tem esse pensamento "positivo" com as coisas...? — Perguntou Alan deixando escapar um meio sorriso.

— Você ainda não viu nada... — Indagou Esmeralda sorrindo e o levando em direção a entrada da escola. Alan a seguiu com o braço entrelaçado ao dela, deixando Calisto ainda mais enciumado, todavia o vampiro sabia muito bem disfarçar seus sentimentos.

Sangue & Cristais ( 2° Livro da série S&E)Onde histórias criam vida. Descubra agora