Capítulo vinte e cinco

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 Conduzido por sua cega ira, Ara trancou a cela. O sangue corria rapidamente dentro de suas veias, não imaginou que tais reações um dia pudessem possuí-lo, pela primeira vez em toda sua existência pode experimentar o medo e como aquela sensação cusumbia seu orgulho. Foram anos à frente de um reino, anos resistindo aos ataques irrefreáveis dos rebeldes, como de uma hora para a outra mudou?

Retirou a espada de seu cinturão e direcionou um olhar mortal para o soldado que há pouco lhe trouxe a notícia, respirou profunda e intensamente, se fosse morrer nessa luta, queria sentir ao menos a última vez o ar expandindo com toda sua excelência os seus velhos pulmões cansados.

— Pegue sua espada, seu inútil! — insultou o homem — faça a minha guarda até lá embaixo antes que eu mesmo mate você!

— Mas majestade... — sussurrou com a voz trêmula — eu...

— Covarde! — esbravejou o mais velho — e ainda dizem que a guarda real de Mizar é aterrorizante, até parece uma criancinha sem as guloseimas. Saia já da minha frente!

O guarda envergonhado abriu espaço para que o rei passasse, em seguida, desceu, pois apesar de sua covardia explícita, sua dignidade não poderia ser manchada.

— Temos que sair daqui — Avice cutucou Júlia — eu não acredito que somos... irmãs, por que não me contou antes?

Júlia abriu um sorriso doce, apesar de sua aparência terrível naquele momento

— Você acreditaria em mim?

A ruiva perguntou a si mesma e durou poucos segundos para concluir que ela tinha razão.

O ar gélido devido a altura da cela, invadia os espaços entre os blocos que formavam a parede.

— Temos que sair daqui — repetiu.

— Sequer tenho forças para levantar — sussurrou Júlia, quase inaudível.

— Princesa, por favor — a voz desesperada penetrou os ouvidos dela — como está minha filha?

Avice se apoiou na ponta dos pés, a fim de enxergar na pequena cavidade que a permitia se conectar com a outra cela.

— Eu não a vi, Léa — relembrou — pensei por um segundo que Nate havia desistido de toda essa loucura e que de alguma forma havia convencido você a não me ver. Sinto muito por meu descuido.

O coração de Léa se apertou dentro do peito, sabia que Nate jamais abandonaria Avice, mas não a culpava por pensar isso, a amiga parecia tão perdida em suas incertezas que ao mesmo tempo em que a admirava por tamanha coragem, sentia pena por tudo que ela teria de enfrentar sozinha. Agora, mais que tudo, a paz havia se perdido de seu eu, conhecia Nate o suficiente para saber que ele não se esconderia de uma guerra. Estava prestes a surtar, quando a voz de quem a tiraria desse obscuro pensamento soou entre as paredes ocas do calabouço.

— Avice?

— Thomaz? Estou aqui — ela deu pulinhos para que ele a visse — por favor tire-nos daqui.

Rapidamente ele a encontrou, olhou por entre o vão que os separava e viu que Júlia estava jogada ao chão quase inconsciente.

— Mas o que aconteceu aqui? — indagou, desesperado — Júlia, você ainda me ouve?

— Sim — sussurrou.

Não demorou muito para que ele se enchesse de ira, por fim conseguiu romper o cadeado o forçando contra o metal polido de sua espada.

Avice apoiou Júlia em seu ombro e a ajudou a levantar do chão. Antes de deixar completamente a masmorra, lembrou-se de Léa que também estava sendo mantida lá.

Entregou a rebelde para Thomaz e ousadamente falou:

— Não sairei daqui sem ela.

— Se pararmos agora não conseguiremos sair daqui.

— Eu sei — ela o encarou — por isso insisto que vão sem mim, me esforçarei para tirá-la disso.

— Acha mesmo que serei capaz de deixá-la aqui?

Agilmente, colocou Júlia no chão e ambos começaram a forçar o cadeado para que abrisse. Foi mais difícil do que da outra cela, entretanto, juntos conseguiram rompê-lo.

— Obrigada — Léa abraçou Avice — tive uma ideia... Thomaz, carregue Júlia enquanto eu e Avice descemos na frente.

— Irei protegê-los — Léa agarrou a espada — eu prometo.

Não havia rei sequer que pudesse impedi-la, pior que um homem irado e apaixonado por seu ego, é uma mãe furiosa por ser tirada de sua filha.

— Espere, sou eu!

Léa deu um pulo para trás quando viu Nolan. Sentiu seu coração estremecer, realmente estava com sangue nos olhos sedenta por vingança.

— Júlia... eu lamento — Nolan falou a observando no colo do irmão.

— Se lamente depois — falou o rebelde — tire minha irmã em segurança daqui e leve Avice com você.

— Não irei a lugar algum sem você — ela o encarou, furiosa — ainda não aprendeu que não sou mais uma princesa que precisa de proteção?

— Não quero de forma alguma interrompê-los diante deste impasse, contudo me sinto obrigada a lembrá-los de que estamos no meio de uma guerra e acredito que seja necessário sairmos daqui para discutirmos certos assuntos — Léa falou — preciso encontrar minha família.

— Tire Júlia daqui, Nolan — ordenou Thomaz, entregando-a para ele — e nós três... — desviou o olhar para as duas amigas que o encarava — vamos.

. . .

Thomaz puxava Avice para longe do caos que se instalou na entrada do castelo, o vestido que deveria ser branco, estava encoberto por manchas vermelhas de sangue. Quase não conseguiram sair. Ambos, se esforçavam ao máximo para correr rapidamente e sair daquela terrível confusão, quando repentinamente uma voz fez Avice parar.

— Nos espere!

A ruiva olhou para trás e viu Nate junto de Léa e a bebê correndo em direção à eles. Observava-os, podia ver a aflição em suas expressões, o desespero cortante de seus olhares. Parecia que sabiam... ela gritou tentando avisá-los, mas o terrível som das espadas se cruzando inibia sua voz. Era tarde demais.

O soldado enfiou a espada com violência em Nate que caiu no chão, Léa não conseguiu mais correr, a razão de sua existência estava partindo. Ela parou, ajoelhou-se sobre ele ainda com a filhinha nos braços, entretanto sua insistência em permanecer ali era um grande erro. O soldado ergueu o seu rosto para olhá-la nos olhos e impiedosamente lhe cortou a garganta. A árdua lembrança possuiu a mente do rebelde, estava com o sangue pulsando em suas veias, lembrou-se da mãe que morreu da mesma forma.

Irado correu em direção ao soldado que rapidamente correu, ele se agachou ao lado de Léa que ainda estava consciente.

Avice correu em direção a eles e se ajoelhou ao lado da amiga que agonizava enquanto tentava falar.

— Cui... cuide da minha pe... pequena Charlotte — sussurrou — di... diga que... que a amamos muito.

Uma única lágrima escorreu de seus olhos, e assim, sua respiração cessou.

. . . 

A princesa prometidaOnde histórias criam vida. Descubra agora