Os refugiados estavam exaustos, mas ainda havia tanto a percorrer!
Eram os 20 quilômetros finais que os levariam à Cidade de Luz, mas o caminho seria pela montanha rochosa, que o frio e o chuvisco tornavam ainda mais difícil e perigoso, e a noite sem Lua deixava aquele lugar na escuridão total.
E a via-crúcis para a liberdade só podia se dar sob a proteção do manto da noite, sem auxílio de fogo ou lanterna.
Relâmpagos iluminavam o caminho por frações de segundos, deixando antever não apenas a sinuosa e estreita trilha entre o costão rochoso e o precipício escarpado, mas também o quanto seria letal uma queda dali.
Instantes depois, o trovão ribomba como se destroçasse o ar, e o seu poderoso rugido se torna ainda mais assustador sobre aquela montanha.
Izaya encolheu-se, sentindo a energia daquele som reverberar em cada uma das suas células.Naga segurou a moça pelos ombros.
"Suporte mais um pouco, filha! Há uma gruta escavada na rocha, onde poderemos nos abrigar e descansar."
"Perdoe-me a fraqueza, papá! Mas é como se os Deuses blasfemassem em meus ouvidos! Eu não poderia ter abandonado a Cidade das Águas!"
"Tolices!"
Um homem de turbante negro mais à frente virou-se por sobre o ombro e gritou.
Era um homem forte e vigoroso devido aos trabalhos no campo.
Ele fazia parte do grupo de camponeses que se juntou ao grupo inicial guiado por Majore, um burguês oculto sob a fachada de Comunista, que auxilia refugiados a sair da Cidade das Águas, uma das sete cidades-estados do País do Leste, tornada Cidade Vermelha após o Golpe Militar.
"Nossos Deuses nos abandoaram há tempos! A senhorita não lhes deve mais nenhuma lealdade a ponto de ficar para morrer na Cidade Vermelha!"
Izaya baixou a cabeça e espalmou ainda mais forte a rocha protetora ao seu lado direito.
Sentia-se envergonhada por sua fraqueza.
Sussurrou um pedido de perdão ao grupo, que não poderia ser ouvido normalmente, quanto mais naquele instante em que um novo trovão estronda.
Ela era uma Miko, uma sacerdotisa do Templo de Seiryû Wu-ki, o Deus-Dragão da Água.
O Golpe de Estado orquestrado pelos militares derrubou a monarquia, instaurando a República Comunista.
Todos os Templos foram destruídos, simbolizando o Estado Ateu.
Muitos religiosos foram mortos, principalmente os do Alto Clero.
Izaya representava a Divindade no Plano Físico.
Através de sua fala, o Deus-Dragão se comunicava.
Ela apenas não pereceu pelas mãos do Ditador Vermelho porque havia caído nas graças dele.
O que para alguns fora um providência do próprio Seiryû, para a sacerdotisa fora uma condenação ao inferno!
Preferia mil vezes ter sido executada, como foram os demais religiosos, do que ter sido tomada por concubina, maculando seu corpo sagrado resguardado ao Deus-Dragão.
Por meses foi obrigada a servir de meretriz àquele homem asqueroso e bruto.
Por meses ficou confinada ao quarto do palácio que antes pertencia ao monarca deposto e executado.
Obrigada a estar sempre pronta para receber o seu dono a qualquer hora que ele tivesse vontade de usá-la.
E no princípio, essa vontade era constante, diária, por horas a fio e muitas vezes noites inteiras.
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K'ien
Fantasy💥 Completa 💥 Conto de Ficção Fantástica sobre Dragões. História completa. Será postado em capítulos curtos conforme a demanda de leitura. Izaya, a sacerdotisa da Deusa-Dragão Wu-Ki, falha em sua missão de proteger a Cidade das Águas, e um golpe...