Patrícia
A mão dele acertou o meu maxilar e perdi os sentidos. Acordei nua em cima da minha cama. Ele ressonava tranquilamente ao meu lado. Meu corpo todo doía. Levanto cambaleando e vou até o banheiro. Eu sangrava. Eu não queria acreditar nos sinais que meu corpo dava. Ele nunca havia forçado nada, mas eu sempre havia cedido. Entro no chuveiro e as lágrimas se confundem com a água que cai e o sangue que é lavado do meu corpo.
Acordei sobressaltada e vi que o sol já estava alto. Fazia muito tempo que eu não dormia tão bem. Mesmo tendo o pesadelo, ou lembrança, meu sono não foi afetado. Procuro Alfredo e noto que ele não está no quarto. Antes de sair atrás do pequeno chihuahua, que era como um filho para mim, fui até o banheiro me arrumar. Olhei no espelho e vi grandes marcas pretas ao redor dos meus olhos. A viagem exaustiva, a tensão dos últimos dias, o medo de ser pega pelo Maurício, o abuso vivido nos anos de casamento... as surras e por fim o estupro que culminou na minha decisão em fugir de tudo aquilo. Tudo isso me esgotou física e psicologicamente, tanto que durante anos eu fui criando uma máscara: criei uma Patrícia Dantas que não é real. Criei uma Patrícia que todos acham que é esnobe, mimada, arrogante... uma máscara. Espero que isso mude na minha nova vida aqui em São Gabriel do Oeste. Espero que eu consiga ser quem realmente eu sou.
Pensando agora... eu não sei quem eu sou de verdade. Eu vivo uma mentira desde que me conheço por gente. Os únicos momentos felizes da minha vida eu tive aqui nessa fazenda, mas sempre que eu retornava para casa eu voltava para a dura realidade.
Fui até a cozinha e a dona Nadir me serviu um café com bolo. Falando que logo serviria o almoço. Sai comendo o bolo de fubá e bebendo uma caneca de café a procura do Alfredo.
Caminhei pelo quintal e achei Zefa fumando um palheiro e Alfredo ao seu lado vestindo uma roupinha de vaqueiro e de chapéu. "Puta merda, de onde saiu essa roupinha?". Meu lindo saiu em disparada, correndo junto a outros cães da fazenda. Eram uns cinco ao todo de diferentes tamanhos.
— Zefa de onde você tirou essa roupinha para o Alfredo? – Sentei num tronco ao seu lado.
— Tinha nas suas coisas. No quartinho que você brincava quando pequena. Tá tudo lá ainda. Era de um boneco seu. Hoje de manhã eu peguei e Nadir arrumou pro Alfredão. Viu como ele gostou?
Sorri com carinho para tia Zefa. "Ai como eu senti falta dessas duas mulheres na minha vida!". Quando eu ia passar as férias na fazenda lembro de andar grudada a minha tia. Aonde ela ia, eu estava. Tia Zefa com todo o carinho do mundo me falava dos animais da fazenda, me mostrava os recém-nascidos, ela tinha a maior paciência. Me aproximei e a beijei no rosto sentindo o cheiro de tabaco tão esquecido e agora relembrado. Alfredo correu feliz para o meu colo.
— Tia, tem que dar remédio pra pulga e carrapato pra essa cachorrada. Olha aqui, já peguei uma no Alfredo. – Mostrei a ela a finada pulga na minha unha. Pena que não trouxe medicamentos da minha clínica. Saí tão apressada que consegui apenas pegar as roupas que tinha em casa. Deixei meu telefone desligado para ninguém me achar. Claro que o pessoal da clínica deve estar desesperado e a essa altura Maurício já voltou para São Paulo. – E também remédio para vermes.
— Precisa não, filha. A doutora Lorenza veio aqui semana passada inseminar umas vacas e já deu Ivomec pra toda cuscarada.
— Ivomec, tia? Mas Ivomec pode matar, dependendo da raça do cachorro.
— Ela disse, mas com tanto cusco aqui, um a mais ou um a menos não faz diferença.
— Não, tia. Inadmissível isso! Pode deixar que de agora em diante eu cuido dos pets daqui da fazenda.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Amor Animal (Concluído)
Romance+18 Conto Lésbico escrito em parceria com Sylvie de Paula (história registrada na Camara Nacional do Livro. Plágio é crime.) O que acontece quando dois mundos colidem? Faísca? Fogo? Explosão? Tudo isso acontece quando Patrícia, uma veterinária esnob...