Capítulo 5 - Habilidades Humanas

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Alice

Depois da massagem relaxante na sala de conferência, Vinícius havia sumido. Fiz mais algumas coisas, passei as últimas horas atendendo no telemarketing de uma das nossas vendas de produtos e então fui pra casa. Novamente na frente do carro, com papeladas contra os seios e sapatos me matando. Lembrando e querendo não lembrar. 

Eram dez anos com uma pessoa. Não era fácil desassociar uma vida construída, principalmente quando ainda se gostava dessa vida. E a lembrança que me paralisou foi quando nos "mudamos" para aquele apartamento. Nunca namoramos de fato. Ele não chegou em mim e me pediu em namoro. Aconteceu, como uma doença. E eu sou péssima em me abrir, mas acontecia facilmente com ele. Até que, um belo dia, se tornou rotina; eu o esperava depois da aula, jantávamos e fazíamos amor até arder. Então, depois de alguns meses dessa rotina, quando ainda trabalhávamos a ideia de negócio, ele me trouxe até essa mesma rua e apontou a cobertura. "Há um closet parcialmente vazio lá. Uma cama a ser dividida. É muito grande para um homem só, sabe?" Ele disse rindo e cruzou os braços. "Como passamos muito tempo juntos, pensei que poderíamos ter onde trabalhar melhor." E eu recusei. Com tanta veemência que ficamos duas semanas separados totalmente. Mas então houve as reuniões e quando dei por mim, estava pegando a correspondência com meu nome naquele prédio.

Estava decidido. O apartamento era dele também.

Com passos rápidos, entrei no prédio e subi até a sala de estar. Onde minha determinação saiu voando pela sacada. Vinícius estava de bermuda de dormir e um livro estendido.

– Você demorou a chegar então pedi comida. – ele disse. – Tudo bem no Marketing?

– Ótimo. Então você vai dormir aqui hoje?

– Sim. Como ontem. Dormi na sala e saí bem cedo. Quer falar sobre isso? Se quer que eu saia, posso me virar.

– Não seria justo.

Vinícius respirou profundamente, deixando o livro de lado e sentando mais ereto.

– Não quero discutir, Alice.

– Eu muito menos. Só estou seguindo um raciocínio.

– Está sendo orgulhosa.

– Você comprou o apartamento e eu vim morar com você.

– Comprei, sim. Para nós dois.

– Não existe mais isso. Existe o que você comprou e eu me apropriei, o que você começou. Então é seu, não tenho nada.

Meu colega baixou a cabeça e apertou a ponte do nariz. Estava estressando-o. Era um dia péssimo para ambos.

– Não vamos por esse caminho. – ele pediu.

– Então o que? Vai me dar? Não preciso de mimos. Posso sobreviver sem coberturas.

– Sem emprego, sem casa. Que merda, Alice. – Vinícius ergueu o olhar para o meu. – Eu só te pedi para casar comigo, não para sair por aí sem nada. Você prefere destruir tudo ao invés de construir mais?

Eu poderia responder. Mas seria algo definitivo demais. Seria a ruptura do amigável. Apenas deixei que ele visse minha mágoa e dei minhas costas.

No quarto, comecei a despencar, entrar em colapso. Mas arranjei algum controle. A raiva sempre ajudava. Não poderia ser normal agora, não tão perto dele.

E ele não ter tentado me seguir era um alívio. Eu devia lembrar que ele também não queria essa situação.

Peguei as malas no closet e comecei a arrumar e esquematizar. Já viajei muito e parecia algo simples e mecânico. Até que percebi o par de pés à porta. Ele se ajoelhou no chão e se pôs a guardar comigo.

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