Uma capivara

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Loydie havia destruído uma pia de gesso apenas com a força de seus chutes e dentadas. A pia de gesso acabou caindo em cima de sua perna, e Loydie deu um berro.

Cheryl se arrependeu de ter prendido aquela criatura dos infernos dentro do banheiro, pois a choradeira e gritaria depois do acidente da perna foi a coisa mais insuportável do mundo, e ela já não tinha mais idade pra aguentar birra de quem havia lhe metralhando em sua festa de casamento. Ela fez curativos e o entupiu de Tylenol, mas como ele era maluco, Loydie não parava de gritar. Cheryl disse pra ele calar a boca pois ela estava com dor de cabeça, mas nada funcionava, o que a fazia se sentir a beira de cometer um crime de ódio.

Cheryl despejou um litro de álcool sobre o ferimento para que ardesse até a morte e o filho da puta se calasse, e funcionou um pouco, já que Loydie realmente calou a boca. Talvez ele tenha se calado por ela tê-lo amordaçado, mas o importante era que havia sido efetivo.

Depois do pandemônio que foi fazer curativos na perna de Loydie, a vampira respirou fundo. Por algum motivo que nem ela mesma sabia, agora  arrancar balas dos outros e enfaixar pessoas havia virado rotina, (mesmo que aquela fosse a segunda vez que ela estivesse fazendo aquilo). Ao menos ela tinha conseguido um empréstimo do banco, e ali tinha bebida de graça, apesar de todo o tempo perdido e o estresse. Quando aquele povo voltasse pra anunciar a morte ou não morte de Charlie, e talvez o trazerem de volta, ela iria embora e daria um jeito na vida, como a pessoa bem resolvida que ela fingia ser. Lavaria o cabelo, tomaria banho, colocaria uma roupa daora, esperaria ficar de noite e iria atrás do desgraçado do ex-noivo que a tinha bloqueado em todas as redes sociais possíveis para resolver aquilo da forma mais infantil possível, pois ela estava com vontade de fazer birra feito uma adolescente imatura, e ainda por cima ela estava faminta e fome nunca é um bom aditivo pra gente com ódio. Ela nem queria mais casar com ele, e havia percebido que talvez, talvez, nunca tivesse tido tanta vontade de casar assim. Provável que isso fosse apenas ela tentando se dar um motivo para não ficar triste com a situação, mas tantos maridos dela já haviam morrido, qual era a dificuldade de fingir que esse cara estava morto também? E ele era bem trouxa. Trouxa demais. Cheryl tinha a sina de se apaixonar apenas por idiotas. 

Cheryl colocou Loydie devidamente amordaçado e enfaixado em cima do balcão, quase como se ele fosse um vaso de planta, e falou para Demian ficar de guarda. Ao menos Loydie não podia correr com a perna daquele jeito, mas isso não o impedia de olhar para todos com cara de que iria matá-los apenas com a força do pensamento, rosnando baixo feito bicho. Exalar ódio era quase um dom divino concebido a ele no nascimento, e Loydie podia não acreditar em deuses, mas usurfruia de seus dons com bom grado.

Depois de mais de quatro horas esperando que as criaturas voltassem pelo elevador junto com o demônio sequestrado, Demian resolveu parar de olhar para o teto, pois era hiperativo demais para fazer aquilo por quatro horas seguidas. Cheryl aparentemente havia dormido; Ela ainda tinha um quarto intacto no andar de cima, da época em que havia morado com Charlie, e era melhor se esconder lá do que ter que lidar com Demian monologando sobre comunismo ou os rosnados abafados do maluco da metralhadora.

No fim, Demian arrombou os cadeados que protegiam a porta do quarto de Charlie e pegou a televisão, antes que o tédio o consumisse. Colocou a televisão lá no bar, ligou os cabos e tomadas necessários, e perguntou para Loydie se ele preferia assistir My little pony ou Duro de matar. Loydie estava amordaçado mas rosnou em resposta, o que fez Demian acreditar que ele havia escolhido Duro de matar.

Assistiram as três sequências de Duro de matar.

Sem pausas.

Assistir três filmes de porradaria e vingança seguidos com alguém realmente ajuda a criar um elo de amizade indescritível, mesmo que uma das pessoas tenha sido basicamente sequestrada e amordaçada depois de causar um tiroteio num evento em que a outra pessoa estava.

Demônios, maldições, e todas essas coisas que jovens gostam.Onde histórias criam vida. Descubra agora