Eu estou sentado em um banco de praça de algum lugar do mundo, em uma dimensão qualquer, tomando sorvete de casquinha. Eu não sei bem o sabor do sorvete. Provavelmente é baunilha, coco ou creme, o que não faz muita diferença já que todos tem o mesmo gosto.
Roberta, a capivara, está no chão, também tomando sorvete de casquinha. Estou segurando sua coleira cor de rosa para fingir ser um transeunte qualquer que casualmente estava passeando com sua capivara de estimação e acabou decidindo se refrescar um pouco com o sabor da baunilha, do coco ou do creme. Ao que parece, está funcionando, já que ninguém prestou grande atenção em mim ou notou o quanto minha aparência é destoante em comparação com as das criaturas que vivem por aqui.
É um belo dia.
Pego meu caderno de anotações, já pronto para o que está por vir. Uma das vantagens de ser eu é que é de meu feitio saber das coisas, e eu sabia desde o princípio que essa hora iria chegar. Está um clima até que agradável para esse acontecimento: Choveu pela manhã e agora o sol está aqui, secando as gotas de água nas folhas das árvores e deixando tudo meio fresco. Roberta pestanejou horrores sobre minhas decisões para que chegássemos à este ponto, pois eu deveria ter prolongado mais a narrativa e consequentemente ter tentado achar algum jeito de evitar que isso acabasse dessa maneira, mas como ela é uma capivara e não deveria estar falando, notei que estava imaginando coisas e desconsiderei suas opiniões.
Logo, ouço passos sobre as folhas secas e percebo a mulher sentando ao meu lado, em uma distância considerável. Ty está usando suas roupas pseudo-hippies de sempre: O top de crochê meio brega, a saia verde comprida com uns bordados esquisitos e os chinelos de dedo. Ela está fumando cigarro de menta.
- E aí? - A mulher peixe diz e eu a cumprimento com a cabeça. Ela continua quieta até terminar o seu cigarro, apagá-lo no chão e ir até uma lixeira próxima e se livrar da bituca. Quando volta, inicia, de jeito despreocupado, uma explicação que eu não preciso ouvir, mas que é necessária mesmo assim. - Eu vim aqui pelo Departamento de Maldições de Sentenças de Morte, em nome da Central de Controle do Multiverso e tal. Eu meio que faço o trabalho sujo deles, de vez em quando. - Ela conclui, dando um sorriso amarelo e um tanto nervoso.
Termino meu sorvete e pego Roberta no colo, limpando o focinho dela que estava sujo.
- Tudo bem. Antes, eu preciso de sua ajuda. - Digo, empurrando o meu caderno de anotações pelo banco, até que quase encostasse nela.
Ty olha para mim, para a capivara e para o caderno, e só então seu olhar vai para o sorvete de Roberta que estava no chão.
- Sorvete não faz mal pro bicho? - Ela pergunta, e eu quase consigo me emocionar com sua preocupação para com a integridade física do meu animal.
- Roberta é uma capivara mágica. Capivaras mágicas sabem muito bem o que podem ou não comer, então não se preocupe.
Ty levanta as sobrancelhas e dá de ombros, e eu cruzo minhas pernas, levantando o queixo e sentindo a brisa no meu cabelo. Raramente eu tenho uma forma física para sentir essas sensações mundanas, então aproveito-as sempre que posso.
- Quer minha ajuda com o quê? - Ela questiona, voltando o olhar para o meu caderno de anotações, retornando a soar despreocupada.- Eu não posso demorar muito aqui, e em teoria eu nem deveria estar conversando amigavelmente contigo já que é o criminoso mais procurado do momento.
Não consigo ficar sem sorrir com essa informação.
- O mais procurado?
- É. Fala logo o que quer, rapaz. - Ty diz, tentando cortar minha arrogância antes que eu comece a me gabar sobre isso. Ela consegue e eu prontamente aponto para o caderno que estava perto dela.
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Demônios, maldições, e todas essas coisas que jovens gostam.
ParanormalCharlie não tinha nenhuma grande expectativa de vida. Ele estava condenado a viver no Vazio, em um bar abandonado e sem clientes, tendo como única companhia um cacto chamado Tiffany e um gameboy quase sem bateria. Mas então, um elevador apareceu e e...