A sensação de ser parado pela polícia nunca é boa. Não importa se você tenha ou não cometido algum crime. O policial é treinado para identificar sinais de que algo está errado, eles fazem isso naturalmente depois de um tempo. O olhar, geralmente intimidador faz com que a maioria dos civis por mais inocentes que sejam, simplemente desviem do olhar vindo de policiais, que invade o espaço pessoal sem hesitação. Assim sendo, mesmo a pessoa mais inocente do mundo pode sentir-se mal de ser parada por um policial.
Mas, como sabemos, o caso de Clara não se limitava a ser uma passageira qualquer em um táxi qualquer.
Pelo contrário, ela com certeza estava sendo procurada.
Em sua mente, ela pensou em poucas coisas além de “como será a cadeia?", e dentre essas poucas coisas que pensara, algo como correr que nem louca ou até mesmo ter ficado com a arma com balas de festim de Thomas.
Acontece que ela estava ciente de que era impossível correr mais que um policial e tampouco tinha a arma de Thomas e a coragem suficiente para simular uma ameaça.
Clara ouviu duas portas da viatura abrindo e fechando, logo em seguida flashes de lanterna disparados em direção ao automóvel na qual se encontrava, sentada no banco traseiro.
Seu coração acelerava mais e mais a medida que os passos de botas se aproximavam.
Clara nunca havia pensado que algum dia estaria do lado em que os bandidos geralmente ficam.
Mas ainda tinha uma esperança: talvez tivesse algo errado com o táxi, um farol quebrado, uma placa irrigular ou até mesmo talvez não tenham ido com a cara do taxista, que, assim como Clara pensou, não tinha um semblante muito amigável.
Mas as sensação de ter as suas esperanças arrancadas é para Clara, assim como para qualquer um que já tenha alguma vez passado por alguma situação semelhante, horrível.
“Boa Noite Senhor, para onde está indo?”, disse o oficial de polícia. Sua voz era grossa e firme.
E com uma voz tão grossa quanto, porém com pelo menos vinte anos adicionados, o motorista do táxi respondeu “estou indo para aquela direção, não vê?”, e encarou o policial.
Clara pode ver a supresa no rosto do policial ao receber a ríspida resposta do taxista.
“Perdão senhor, creio que ainda não notou que estamos em uma abordagem e preciso que me responda de forma acertiva!”, disse o policial, com tonalidade agressiva na voz.
“Afinal, o que diabos vocês querem?”, respondeu o taxista ainda bravo.
Clara notou que o outro policial observava todo o veículo por fora e fez um sinal de positivo para o parceiro assim que colocou a lanterna cegadora no rosto de Clara.
O policial que falava com o taxista apontou para o banco onde Clara estava e disse “Estamos procurando por um homem e uma garota, a menina bate com a descrição que nos foi informada" e jogou também a lanterna no rosto de Clara “precisamos verificar".
O taxista bruscamente tirou a lanterna do rosto dela “tira essa porcaria daí”, disse o mesmo, de forma agressiva “Ela é minha Filha, ela estava estudando e eu vim busca-la. Será que não consegue ver um palmo a sua frente?”.
A última coisa que Clara esperava naquele momento era que o taxista a apoiasse e ainda fingisse que era seu pai.
Ela também se perguntou se talvez o motorista não tinha algo ilegal no veículo, e, na verdade estava limpando a própria barra.
“Agora chega! Saiam os dois com as mãos pra cima!”, disse o policial, retirando sua arma do coldre na cintura.
Clara não viu escolha, estava agitada e sem chão. Mas assim que foi abrir a porta para sair, o taxista a impediu.
“Você não vai sair!”, disse o taxista olhando para trás e encarando-a “e você, o que pensa que está fazendo, tirando essa porcaria do coldre? Que merda de preparo dão pra vocês hoje em dia hein?”, disse o taxista para com o policial.
“Como é?”, indagou o policial ainda bravo e desconfiado.
O taxista abriu o porta luvas e assim que colocou a mão dentro, o polcial apontou a arma.
“Já falei pra abaixar essa merda aí, rapaz. Jesus! Pensa que vou tirar uma granada daqui?”, disse o taxista ainda mais furioso.
Clara não estava entendendo o que acontecia mas estava se preparando psicologicamente caso houvesse um tiroteio.
Mas o taxista tirou apenas um documento do porta-malas e entregou ao policial.
Após analisar com calma, o policial simplesmente devolveu o documento e colocou a arma devolta no coldre.
“Me desculpe senhor, foi só o procedimento e...”, disse o policial porém, interrompido bruscamente pelo taxista “desculpa o caramba, eu servi na corporação por quarenta anos e não fiz as merdas que você ta fazendo. Vai com calma garoto. Analisa a situação primeiro!”.
“Sim senhor. Boa noite para você e sua filha", disse por fim o policial antes de sair e dar o sinal para o parceiro se retirar.
O momento que Clara considerava até então o de mais sorte em sua vida foi sucedido pela subita sensação de alívio a agradecimento.
Aquele taxista que Clara havia julgado mentalmente assim que entrou no veículo, acabara de salvar sua pele.
“Então o senhor foi policial?”, perguntou Clara surpresa. Pouco depois que o carro deu partida.
Após um pouco de silêncio o taxista respondeu “quarenta anos de tiros e confusão, nem uma aposentadoria decente a corporação pôde me proporcionar. Esses merdas só querem colocar uma farda em você e te matar, é isso que querem!”, ele tossiu um pouco e prosseguiu “aí que escolha a gente tem? A minha foi comprar um taxi. Assim ganho dinheiro e não tenho que olhar pra cara da minha esposa. Haha. Ah não leva a mal garota, não bato mais tão bem da cabeça”, disse o taxista por fim, apontando para a cicatriz acima de sua sobrancelha.
“Obrigada por me ajudar, mas por que se arriscou tanto por mim?”, perguntou Clara, curiosa.
“Conheço um criminoso quando vejo, meu bem, sei que uma menininha abobada que nem você não farial mal a ninguém. Talvez o coração de alguns babacas, mas nada fora isso”, respondeu o marrento taxista.
Clara deu um sorriso, afinal ele podia ser um velho grosseiro mas era gentil de uma forma singular.
Mas Clara ainda se perguntava quantas situações perigosas como essa ainda teria que passar na estranha fase que sua vida seguia.
Ela só foi perceber o quão tarde era quando viu as dezenas de ligações perdidas de seu pai pelo visor do celular.
Haviam varias mensagens, as últimas entretanto, regadas de ameaça e palavras de baixo calão.
Quando retornou para a escola, as aulas haviam acabado há pelo menos uma hora e meia.
Ela andou o longo caminho ate sua casa. Um caminho realmente perigoso a noite. Não adiantava retornar as ligações, seu pai simplesmente não a atendia, na verdade, fazia questão de atender somente para desligar na cara dela.
Realmente, Clara se sentiu não somente em um caminho perigoso em seu percurso até em casa, mas também em sua vida.
Seria um caminho para a decadência...
Clara se perguntava se seria uma boa ideia ligar para Thomas. Mas já estava na metade do caminho e com certeza não seria uma boa idéia ficar parada sozinha de noite e em ruas mal iluminadas e desérticas.
Pouco depois finalmente alcançou sua casa. Mas pouco adiantou bater na porta ou mesmo tocar a campainha, aparentemente seu pai havia trancado a porta por dentro com um cadeado.
Depois de tudo... Do dia mais perigoso de sua vida até então, ainda teria que passar o resto da noite do lado de fora.
Um ódio tenebroso pesou em sua mente. Pensou que tinha o pior pai do mundo. Um verdadeiro escroto.
Mas talvez não... Se a noite estava ruim para ela... Então imagina para a pequena Lívia, que tinha como pai não somente um escroto, mas um verdadeiro monstro.
E foi no pequeno lance de escada que ligava a calçada com a porta de sua casa que Clara adormeceu, com olhos lacrimejantes aquela noite.
Clara nem sabe de onde tirou a energia suficiente para retornar ao colégio no dia seguinte.
Mas assim que foi vista pela sua amiga Beatriz, ela soube que estava com uma cara péssima.
Não demorou muito pra Bea arrasta-la banheiro adentro.
Dentre alguns questionamentos como “afinal o que você está fazendo, menina?”, “foi culpa daquele cara, né? Ele não te machucou, foi?” e “meu Deus! Parece que você morreu e esqueceram de enterrar, Clara!”, Beatriz prosseguia arrumando a amiga.
Clara somente olhava para baixo, estava realmente cansada. Tinha passado por tantas coisas. Sentia tantos nós na garganta que nem sabia se algum dia voltaria a comer. Suas emoções em colapso. Amor, ódio, tristeza... Clara não era de contar as coisas.
Ela evitava sempre contar as coisas ruins que acontecia em sua vida. Sempre achou que seus problemas podiam atrapalhar os outros. Então procurava manter somente o lado bom da história.
Mas naquele dia tão exaustivo ela não pôde se conter. Ela precisava desabafar.
“Eu preciso te contar algo.”, disse Clara.
Então ela contou tudo que estava se passando desde que conhecera Thomas. Tudo mesmo. Até a parte onde descobriu o vídeo que seu primo George fizera delas em segredo e a intenção de matar o investigador Ricardo.
Naquele dia Clara sentiu-se aliviada. Mas ela não imaginava que seria uma das piores decisões que já tomara em vida.
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MORTO EM COMUM [Original]
Romance[Esta não é uma história de romance comum] Alguns casais podem dizer que se conheceram por algum amigo, lugar, festa em comum. No caso de Clara e Thomas, este algo "em comum" é um MORTO. Cuidado. Assassinatos em série, manipulação psicológica e uma...