— Pirralhos, desçam já! — Ordena a Federowski, diretora do abrigo.
Uma velha amargurada com uns cinquenta e todos anos, cabelos castanhos com alguns fios brancos, que insiste para nos referirmos à ela como srta. Federowski. A velha sempre odiou a todos no abrigo. Digo que já desço, desanimado. Acabo de amarrar os cadarços do meu tênis surrados e velhos. Meus pais me abandonaram aqui quando eu tinha oito anos. Se é que dá para chamar aqueles dois de pais. Minha “mãe” jamais me deu um abraço sufocante cheio de beijos ou apertou minha cabeça contra seu peito e acariciou meu cabelo. Meu “pai” nunca tinha tempo para brincar comigo, ou me ensinar a jogar bola, me ajudar com o dever de casa.
Éramos pobres. Vivíamos em uma casa de madeira caindo aos pedaços, só com um quarto, um banheiro minúsculo e sala e cozinha juntas. Porém, eu sei que se eles me amassem mesmo na miséria, demonstrariam seu carinho por mim. Ao invés disso, descontavam suas frustrações me batendo vez ou outra e me insultando de nomes que nenhuma criança deveria escutar.
Um dia, meu “pai” chegou a nossa casa muito feliz porque conseguiu um ótimo emprego, que pagava bem, mas teria que se mudar para outra cidade. Nunca vi minha “mãe” tão contente como naquele dia. Automaticamente, eu também fiquei, pensando que finalmente as coisas iam melhorar. Talvez eles só me odiassem tanto porque não vivíamos em uma boa casa, muito menos circunstância. Às vezes nem tínhamos o que comer.
Mas a felicidade daquele menininho de oito anos foi por água abaixo quando antes de irem para o aeroporto, o casal tê-lo simplesmente largado na frente deste abrigo, sem sequer dar um adeus. Lembro-me que corri atrás do carro velho, chamando por eles, implorando para não me abandonarem e prometendo me comportar melhor se ficassem comigo, mas foi tudo inútil. Numa noite de Natal, em que toda família deveria ficar unida e comemorar, a minha me abandonou.
Na época, a Federowski era um pouco mais jovem, mas já era amargurada e megera. Eu e outros dois garotos que moravam aqui que fazíamos todos os afazeres domésticos que cabia a ela fazer. E, se um de nós se recusasse, ficaria sem almoço e janta. Não mudou muito com o passar dos anos. Ao todo, tem dez pessoas morando nesta casa, contando comigo.
Nick, é meu único amigo. Ele chegou há quatro anos e fizemos amizade de cara. Sua mãe era uma drogada que morreu de overdose, deixando o filho desamparado, já que não tinha outros familiares, as autoridades o mandaram para cá. Nick também tem quinze anos.
Ambrose e a pequena Lola são irmãos. De certa forma, a historia deles lembra-me a de Nick. Os pais eram traficantes de drogas e faziam os filhos venderem a “mercadoria” por aí, até que a polícia os prendeu. Os irmãos nunca fizeram nada de errado, já que recebiam ameaças caso não fizessem o que os pais queriam, então as autoridades os mandaram para cá. Diferente da amizade que eu e Nick temos, eles são mais fechados e só confiam um no outro. Não posso culpá-los, afinal, eu não consigo confiar em ninguém, nem em mim mesmo. O restante dos outros garotos e garotas não se aproximam de ninguém e ficam na deles. Nem os conheço direito. Mas estamos todos ligados por algumas coisas em comum: o abandono, os maus-tratos e a exploração, por exemplo.
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Feliz natal, Adam
Short StoryAdam é um garoto de quinze anos que vive em um abrigo desde os oito, quando seus pais o abandonaram e nem se deram ao trabalho de olhar para trás. Adam havia perdido as esperanças de ser adotado por uma família. Afinal de contas, os casais só têm ol...