10.lilly

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O desgraçado comprou cortinas

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O desgraçado comprou cortinas.

É claro que ele compraria. Para transar comigo, ele deixava as janelas limpas. Para me manter como prisioneira, todo o apartamento está numa escuridão abafada. A única iluminação que temos está enrolada ao meu redor. Além de ter me prendido com fitas em uma cadeira no centro da sala, o sádico enrolou suas luzes de natal em mim. E cobriu a minha boca.

Não acho que seja para conter meus gritos e sim meus dentes. Eu o mordi com força na noite anterior. Ainda há manchas de seu sangue no meu rosto e pelo meu colo. Me sinto pegajosa, mas orgulhosa de ter dilacerado uma das orelhas de Tom.

Eu posso até sair morta daqui. Mas ele sairá para sempre com uma marca de que eu passei por sua vida. Eu vou persegui-lo como um fantasma.

Tento ouvir alguma coisa vindo do quarto. Mas já não ouço nem seus roncos. Faz duas semanas que estou presa em seu apartamento. E tudo que ele me dá é geleia. Meus cativeiros variam entre o banheiro e a área de serviços. Mas agora ele me colocou na sala como se eu fosse um animal empalado. Tudo porque eu comi a sua orelha direita.

Já desisti. Quero dizer, na verdade eu não me importo de morrer aqui. Ninguém veio procurar por mim. Eu não tenho nada na minha vida. O único dom que pareço ter não é suficiente para me sustentar sozinha e longe dessa imundice. Eu nasci para ser um fracasso.

― Bom dia, minha princesa.

Aperto os olhos de nojo. A voz dele rasteja pelos meus ouvidos e me causa um arrepio involuntário. Odeio o Tom, mais do que odeio a minha própria vida. Se ele me matar eu gostaria que ele fosse preso. Mas estou cada vez mais perto de aceitar que ele vai sair impune.

― O que você quer comer hoje? Deixa eu adivinhar. Geleia!

Ele não se aproxima muito, mas arranca a fita da minha boca. Não vou gritar, em todo caso. Ninguém se importa. É um prédio de gente esquisita. Gritos são parte da trilha sonora.

― Você é um bosta. ― Suspiro.

― Eu não era até você passar as noites aqui em troca de casa e comida. Poderíamos viver assim até eu me cansar de você, Lilly. Ou você se tornar maior de idade e não ameaçar a estragar minha vida. Estou planejando deixar você presa aqui até completar dezoito anos. Quando isso vai acontecer?

― Daqui um ano.

― Que pena. Teremos muita geleia até lá então.

Tom some do meu campo de visão e volta tão rapidamente que acho que estou sem noção de tempo e espaço. Meus membros estão formigando por causa da fita apertada e das malditas luzes de natal. Meus olhos borrados de rímel e lágrima ardem. Ele sorri de um jeito esquisito, mas antes que possa dizer algo, uma batida na porta nos desperta.

A fita volta imediatamente para meus lábios e começo a chorar. Alguém bate na porta novamente e grita.

― Entrega! Cortesia especial de geleia para o senhor Tom! Cortesia do mercado.

Gemo, tentando lutar contra a cadeira. Tom dá uma olhada por cima do ombro e sorri. Ele é louco. Está se divertindo enquanto eu choro.

― Não é adorável? Comprei tanta geleia para você que eles me mandaram presentes. Fique quieta ou vou furar seus miolos.

Seus passos prepotentes andam até a porta e ele abre uma fresta. Gemo mais alto porque não me importo de morrer. Mas me importo que ele fique impune. Então ouço um estrondo e Tom cai de costas no chão. É inacreditável, mas o maluco do metrô, Carson Rowan, está ali. Ele balança o punho e cai no chão, socando Tom antes que ele consiga se levantar.

Meus gritos abafados concorrem com as batidas da cabeça de Tom sendo socada. Não posso permitir que Carson o mate e vá para a cadeia. Começo a pular até a cadeira tombar. A luzes falham e se apagam. É o suficiente para ele parar de batem em Tom. O cara já está completamente inconsciente quando Carson corre até mim.

― Felicity. ― Ele me segura, puxando a cadeira para cima. ― Vou tirar você daqui.

Suas mãos trabalham com as fitas e com o celular.

― Polícia, eu tenho uma ocorrência.

Carson resume o caso para os policiais enquanto me liberta. Minha pele está sensível demais para eu sentir uma dor lancinante quando ele puxa a cola da fita para me soltar. O alívio de estar sendo libertada, no entanto, é muito maior. Assim que ele liberta os meus braços e joga as luzes de natal para longe, eu caio sobre ele em um abraço.

― Jesus Cristo. ― Sua voz soa como o som dos anjos no meu ouvido. ― Você está bem? Ele fez algo contra você? Está sangrando!

― Estou bem. Ele só me manteve presa aqui. O sangue é dele. Eu comi a orelha do imbecil.

Carson se afasta e segura o meu rosto. Seus olhos me analisam com cuidado e acho que ele está aliviado pelo modo como sorri. Eu me inclino mais uma vez, encostando minha testa na dele e fechando os olhos.

― Como você me achou aqui?

― Esbarrei com seu irmão. Eu procurei você todos os dias, por toda a cidade. Estava preocupado. Ele me disse onde esse ― ele olha rapidamente para Tom ― morava e eu investiguei com a vizinhança.

― Você me procurou? ― Uma risada meio maluca faz cócegas na minha garganta. ― E veio atrás de mim?

― Estou aqui, Lilly. ― Carson me puxa da cadeira. É bom que seu corpo me apoie porque estou fraca demais. ― Vou cuidar de você agora.

A polícia invade o apartamento e encontra Tom desacordado no chão. Eu suspiro de alívio e gratidão quando eles correm para nós.

Eu sou uma perdedora. E estou exausta. Fui derrotada pelo meu próprio jogo. E estou afogando nos meus erros. 

Mas um dos pesadelos finalmente acabou. E Carson Rowan foi quem me buscou para a nova realidade que terei que encarar: que estou mais ferida agora do que quando entrei nessa. Não sei como me curar, afinal. 

 

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