28 de agosto

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Estou bem no centro do Grande Salão do Metropolitan Museum of Art, a
exatos três passos de distância do lugar onde vomitei no meu décimo
aniversário, logo na saída da ala Egípcia. Mas desta vez não há pochetes, nem
sons de tênis rangendo no piso bem polido. Em poças aos meus pés não tem
vômito rosa brilhante (gelato de framboesa, se tiver interesse) salpicado com
pedaços de cereal Lucky Charm (“Só no seu aniversário”, meu pai disse — e
depois nunca mais repetiu isso). Estou com um vestido de sete quilos, incrustado
de cristais, igualzinho ao que a Beyoncé usou na cerimônia do Grammy. Na
noite de hoje, as luzes estão acesas e piscando, e as pessoas estão sussurrando e
olhando na minha direção. Na noite de hoje, por algum motivo, eu sou alguém.
Beberico champanhe e deslizo de salão em salão, admirando a arte. E é ali que
Max me encontra, parada em frente às bailarinas de Degas, na seção
Impressionista.
— Sabe, eu sei dançar também. — Ele passa um braço em torno de minha
cintura e meu corpo inteiro fica instantaneamente mais quente.
— Prove — eu digo. Não tenho que tirar os olhos da pintura para sentir o
olhar dele em mim, para saber que ele está sorrindo. Tenho cada milímetro de
seu rosto mapeado no meu cérebro, todos os seus trejeitos. Tenho um medo
constante de esquecê-lo.
Ele toma meu braço e me gira, e fecho os olhos. Quando os abro novamente,
estamos no jardim do terraço, embalados. Os arbustos estão cobertos por luzes
cintilantes.
— Você fica bem de smoking — balbucio no pescoço dele.
— Obrigado. É o que a Beyoncé usou na cerimônia do Grammy — ele diz
em um tom sério, e nós dois explodimos em gargalhadas. Antes que eu consiga
recuperar o ar, os braços de Max me seguram com força, e ele me beija, me
inclinando tanto para trás que perco todo o equilíbrio e senso de mim. Não
sabia que havia um tipo bom de tontura antes disso.
— Senti sua falta — ele diz então, e me gira de novo.
O entregador da Joe’s Pizza da 110ª avenida aparece, com uma cara impaciente.
— Está com fome? — Max pergunta. — Eu pedi.
Mas dentro da caixa de pizza não tem pizza, só um biscoito Oreo gigante
cortado em oito fatias, como um bolo. Nós enfiamos a mão na caixa e cada um
pega um pedaço pesado. Assim que aproximo o biscoito da boca, vislumbro um
ar de travessura refletido nos olhos verde-acinzentados de Max, e ele depressa
amassa seu biscoito na minha bochecha. Póf. Jogo o meu de volta nele.
Corremos pelas galerias, nos escondendo atrás de estátuas romanas e
desviando de patronos mortificados enquanto atiramos punhados de bolo de
Oreo um no outro. Noto um segurança do museu marchando em nossa direção.
Quando olho com mais cuidado, vejo que ele também é meu professor de
ciências do ensino fundamental. Sempre odiei aquele cara. Corremos mais
rápido.
Quando estou finalmente encurralada no pátio da tumba de Perneb, paro e
encaro Max. Estamos cobertos de bolo. Joias da exposição de têxteis europeus
balançam em torno do meu pescoço e braços, e Max tem um capacete medieval
na cabeça. Parecemos um casal da realeza que deu horrivelmente errado. Um
país sob nosso comando com certeza iria se revoltar.
Max diz alguma coisa, mas não consigo ouvi-lo pelo capacete, então ele o
ergue, revelando bochechas coradas.
— Vamos dar um tempo — ele repete. Nós nos deitamos no chão do pátio da
tumba, ouvindo a sinfonia e o murmúrio baixo de conversas que continuam do
lado de fora. Sobre nossa cabeça, onde o teto do museu deveria estar, há, no
lugar, um céu estrelado.
— Sabe que, quando a realeza egípcia morria, eles costumavam fazer entes
queridos serem enterrados com eles — eu digo.
— Acho que na verdade eram só servos, para que eles pudessem ter garçons
na vida após a morte — Max me corrige. Sempre um sabe-tudo.
— Bom, se eu morresse, eu iria enterrar você comigo. — Eu me viro de lado para olhá-lo.
— Ah, amor, obrigado — ele exclama. — Essa é de longe a coisa mais
esquisita que você já me disse.
Um ronco baixo ecoa nas paredes de pedra, e noto um pequeno javali
a

fricano deitado ao lado de Max, encarando-o com doçura.
— Quem é? — pergunto.
— Essa é a Agnes. — Max acena para o animal com a cabeça. — Ela está
me seguindo desde a ala da Oceania. Acho que está apaixonada.
— Bom, entra na fila, Agnes — digo, descansando minha cabeça no peito
dele e respirando fundo. Como sempre, ele cheira a sabão líquido de roupa e algo amadeirado. O som dos seus batimentos cardíacos me acalma.
— Não pegue no sono — ele implora. — Não tivemos tempo suficiente.
Mas eu discordo. Esta noite foi perfeita, tudo que eu poderia pedir.
— A gente se vê logo — digo, rezando para que eu não adormeça até ouvi-lo dizer o mesmo de volta. É uma coisa nossa, quase um hábito supersticioso, para
nos certificar de que vamos nos achar de novo.
— A gente se vê logo — ele enfim diz com um suspiro.
Meus olhos oscilam devagar até fechar, o som de Agnes roncando com
leveza ao pé do meu ouvido.

O garoto dos meus sonhos - Lucy KeatingOnde histórias criam vida. Descubra agora