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“Não, escute, você tem que ouvir − eu não sei de nada, você não quer fazer isso. Eles me pediram para fazer
relatórios sobre amostras de solo e água, é isso, eu não sou ameaça para você! Eu juro!”.
Foster estava cavando a própria cova, e Nicholai decidiu que fazê−lo esperar pela morte seria cruel,
principalmente um homenzinho tão deplorável. O pesquisador já estava se agachando no canto nordeste de sua
sala, suas feições de rato apavorado suadas e coradas. Só tinha levado menos de cinco minutos para achá−lo
assim que chegou na estação.
“... e eu vou embora, tá bom?”. Foster ainda tagarelava. “Eu irei embora e você nunca mais me verá de novo,
juro por Deus, porque você quer me matar, eu não sou ninguém. Me diga o que quer e eu faço, seja o que for,
peça para mim, cara, tá? Vamos conversar, tá bom?”.
Nicholai percebeu que estava apenas olhando para Foster, como se tivesse entrado em transe com os pulos do
histérico homem. Foi um interminável dia em uma série deles... mas por mais que quisesse sair de lá, terminar a
operação inteira, Nicholai sentiu−se estranhamente obrigado a dizer algo.
“Não há nada pessoal nisso, tenho certeza que entenderá”. Nicholai disse. “É sobre dinheiro... ou era no
começo, mas agora as coisas estão diferentes”.
Foster acenou rapidamente de olhos arregalados. “É, claro que são diferentes”.
Agora que começou, Nicholai não conseguia parar. De repente parecia importante que alguém entendesse pelo
que ele estava passando, pelo que ainda estava disposto a fazer − mesmo que fosse alguém como Foster.
“O dinheiro ainda é o maior motivo, claro. Mas depois que vim para cá, depois de Wersbowski, eu comecei a
sentir como se estivesse em um lugar especial. Eu senti... eu senti como se as coisas estavam finalmente se
tornando o que deveriam ser. Do jeito que minha vida deveria ter sido. Circunstâncias extremas, entendeu?”. Foster mexeu a cabeça de novo, mas sabiamente não disse nada.
“Mas então Carlos brincou comigo; ele não podia ter morrido na explosão por que Jill recebeu o antídoto. E eu
estou começando a achar que ela é o motivo, as coisas mudaram por causa dela”. Enquanto falava, ele sentiu a
verdade daquilo, uma luz estava amanhecendo em sua mente. Era verdade, falar ajudava.
“Desde o começo, ela arruinou a armação que eu tinha com Carlos e Mikhail. Manipuladora, haviam muitas
como ela. Ela provavelmente dormiu com os dois, também. Os seduziu”.
“Vagabundas, todas elas”. Foster concordou sinceramente.
“Aí ela ficou doente e mandou Carlos roubar a vacina. Eu não estou tirando a culpa dela nisso tudo, não mesmo,
mas tem algo sobre ela... é como se sua presença alterasse as coisas, fazendo tudo dar errado de alguma
forma. Eu nem acho que esteja morta agora. Se o caçador não consegue matá−la, um mutante certamente não
o fará”.
Nicholai levantou silenciosamente, perdido em pensamentos. Ele nunca foi supersticioso, mas as coisas
realmente eram diferentes. Jill Valentine era −
− uma mulher, ela era só uma mulher e você não está pensando claramente, não está pensando há dias −
Nicholai piscou, e o pensamento se foi, e Foster ainda estava no canto, olhando−o com uma expressão de terror
cauteloso. Como se achasse que Nicholai fosse louco. Nicholai sentiu uma onda de ódio pelo homenzinho, por
tentar brincar com ele, fazê−lo falar e depois julgá−lo por isso. Ele merecia morrer, tal como qualquer um deles.
"Eu não sou louco,”. Nicholai gritou, bravo. “e chega de falar nisso! Você é o último, depois de você estará
acabado e é assim que as coisas são, então seja um homem e aceite isso!”.
Três balas, um estouro de tat tat tat através de um dos apelantes olhos verdes de Foster, e a cabeça do
pesquisador foi para trás, sangue espirrando na porta em que estava encostado, seu corpo caindo sem vida no
chão frio.
Nicholai não sentiu nada. O último Watchdog morto, e não houve sentimento de realização ou conquista. Apenas
outro corpo no chão à sua frente e um profundo desejo de sair de Raccoon, de onde as coisas tinham ficado tão
azedas.
Nicholai balançou a cabeça, seu coração pesado, e começou a vasculhar o escritório atrás dos dados de Foster.
Jill parou na frente da estreita ponte que conectava o portão de trás do Memorial Park com o pavimento superior
do complexo da Umbrella, suspensa sobre o que deveria ser um brejo ou um pântano, a julgar pelo cheiro de
grama e lama. Estava escuro demais para dizer só olhando, mas o odor era inconfundível − tal como as pegadas
frescas que iam de onde estava até o lado oposto. Como esperava, Nicholai estava lá.
Maravilhoso. Que prazer.
Nicholai à parte, ela estava grata por ter achado a ponte; ela esteve preocupada com o parque não ter saída e
ter que voltar. A ponte convenientemente levava ao andar superior; fazia sentido que os escritórios e salas de
controle − esperançosamente um deles teria um sistema de transmissão − ficassem no andar superior do prédio
de dois pavimentos, o térreo era onde a água era tratada. Considerando que a Umbrella não tivesse se
importado com o layout do prédio, ela conseguiria entrar e sair facilmente. Se não houver um rádio, ela daria a
volta em torno do andar térreo para verificar as estradas.
Ela se aproximou cuidadosamente da ponte de madeira e metal, respirando fundo, concentrando−se enquanto
tocava o baixo corrimão de madeira para se equilibrar. Lidar com criaturas da Umbrella, acidentais ou criadas,
exigia habilidade e concentração, mas encarar um adversário humano exigia mais do que isso; pessoas são bem
menos previsíveis do que animais, e se ela quisesse ficar longe de Nicholai, ela teria que ficar o mais alerta
possível, sua intuição e lucidez armadas para sentir o ataque a caminho −
− como agora −
Jill congelou na metade do caminho, tocando a trava de segurança da Beretta com o dedão, algo estava muito
errado e não sabia dizer o que era−
Ka thud! Atrás dela.
Jill girou, coração a toda, e viu Nemesis de pé a seis metros de distância, seu horrível corpo transformado pelo
fogo e tiros de granada. Seu peito e braços estavam nus, deixando claro para ela como os inquietos tentáculos
eram presos, brotando de suas costas superiores e ombros. A maior parte de sua pele tinha sido queimada,
revelando fibrosos músculos vermelhos em pedaços de preto acinzentado. “Starsss”. Ele resmungou, dando um passo adiante, e ela viu que seu lado direito inferior estava retalhado onde
tinha acertado com o lança−granadas. A carne da base de seu tórax até a metade da coxa parecia macarrão
queimado, esmagado e fatiado − mas duvidava muito que sentia dor, e tinha poucas ilusões de que sua força
tivesse sido afetada.
Num instante, sua mente drogada com adrenalina correu por centenas de opções e a trancou com a melhor
delas. A laje da torre do relógio. Carlos tinha empurrado ele para baixo, mas estava cego, distraído −
− distraia a coisa!
Ela abriu fogo, mirando na parte mais óbvia de sua face deformada, seus dentes brancos − e viu pelo menos
dois tiros quebrarem o sinistro sorriso, pálidos estilhaços explodindo como um espirro.
O matador de S.T.A.R.S. gemeu, seus carnudos tentáculos esticando−se como uma capa atrás dele,
enquadrando a besta num emaranhado de membros trêmulos.
− não está sofrendo, talvez, mas está sentindo algo −
− VAI AGORA!
Jill continuou atirando enquanto corria para ele, seus instintos gritando para ela correr na outra direção, sua
lógica lembrando−a de que não poderia correr rápido o bastante.
Nemesis ainda uivava quando Jill se jogou nele, empurrando para cima e para frente a fim de chicoteá−lo no
peito como Carlos tinha feito, encolhendo por dentro ao sentir sua pele nas mãos, molhada, granulada, fria −
− e ele cambaleou para trás, caindo pesadamente na beira da ponte, a centímetros do espaço vazio. Seu peso e
massa ajudaram Jill enquanto rezava para que a ajudassem, ela ouviu a explosiva rachadura de uma
desgastada tábua sob seus calcanhares, o corrimão lateral quebrando enquanto o gigante caía sobre as tábuas

− mas dois, três dos tentáculos estavam agarrando o corrimão do outro lado, o hesitante Nemesis esticando os
braços, forçando para recuperar o equilíbrio.
Jill pulou, sabendo que não podia deixá−lo se levantar de novo, e desceu ambos os pé em seu arruinado
abdômen, saltando do corpo do monstro com toda sua força.
Ela caiu solidamente nas pranchas de madeira, gritando de dor assim que seu ombro ferido absorveu a maior
parte do impacto − mas a visão dos cipós de carne cedendo enquanto Nemesis perdia o agarre, a fizeram muito
bem... assim como a tenebrosa pancada na água que ouviu pouco depois.
Ela cambaleou para ficar de pé e cruzou o resto da ponte, agradecendo silenciosamente ao encontrar a porta de
acesso ao complexo destrancada. Dentro, um curto corredor virava à esquerda quatro metros e meio à frente,
chão de grades metálicas e paredes de concreto. Ela rapidamente trancou a porta pela qual passou e apoiou−se
nela, apontando sua arma para a curva enquanto recuperava o fôlego.
Nenhum passo lá fora ou dentro, nada além de um fraco som de maquinário vindo de algum lugar mais adentro
do complexo. Quando passou a respirar quase normalmente, ela andou, ansiosa para sair antes que Nemesis
retornasse. Ela tinha que pedir ajuda e fugir, ou apenas fugir; Nemesis não desistiria, e ela não podia evitá−lo
para sempre.
Mais adiante no corredor, ela viu uma porta de enrolar metálica à direita, de frente para a continuação do
corredor que não podia ver. Mais um passo à frente e ela espiou em volta da curva. Vazio, outro corredor que
virava à direita. Ela recuou um passo e olhou a porta metálica de perto, do tipo que abria com um cartão
magnético.
O nome da sala estava bem acima da porta; em estêncil preto: COMMUNICATIONS. Jill sentiu uma corrente de
esperança, e viu que não havia fechadura manual. O leitor de cartão à direita da porta era o único modo de
entrar.
Frustrada, Jill virou. Ter cruzado com Nemesis tinha mudado as coisas. Ela podia partir, ficar longe dele e de
Nicholai e tentar pensar em algo diferente, ou podia continuar, procurar o cartão e pensar em outras
possibilidades.
Jill sorriu exausta. Na verdade, ambas opções soavam terríveis, mas a primeira parecia melhor. Ao menos suas
roupas teriam uma chance de secar.
Tremendo, Jill andou pelo corredor adjacente, vagamente com inveja de Carlos, quente e dormindo na capela.
O complexo da Umbrella era uma série de pequenos prédios térreos e um com dois pavimentos, posicionados entre várias áreas abertas com lixo empilhado − pilhas de móveis usados, carros velhos e sucata eram os
principais competidores por espaço. Se houverem helicópteros por lá, Carlos considerou estarem atrás dos
galpões − quase impossíveis de se contornar, claro, a não ser que quisesse escalar outra pilha de carros.
Não, só se eu precisar, muito obrigado. Sua escalada tinha sido o suficiente para durar o resto da vida. Ele tinha
batido os dois joelhos fortemente no teto de um caminhão enquanto descia, e mancou o resto do caminho até o
complexo.
Ele parou num pequeno e lotado pátio, onde esperava achar uma cerca, memorizando o layout do amplo
complexo o melhor que podia antes de ir para o prédio principal. Ele queria ter certeza de que Jill estivesse bem
antes de procurar o helicóptero. Assim que alcançou o prédio, Carlos quebrou a primeira janela que conseguiu
alcançar com a coronha da M16 e puxou−se para cima.
Ele sentou na moldura da janela, olhando para uma longa e estreita sala, pobremente iluminada e forrada com
corpos. À direita ficava uma porta dupla com uma placa de saída acima, provavelmente dando acesso ao galpão
principal; ele tentaria essa porta quando fosse procurar os helicópteros. À esquerda, ficava uma escada metálica
de mão que subia até uma abertura no teto. Ele não queria mais nada.
Bom, um elevador, talvez, ele pensou enquanto se jogava da janela, suas costelas atadas protestando. E se não
fosse pedir demais, se de repente eu acordasse e descobrisse que tudo isso foi um sonho ruim, não seria nada
mau, também.
A sala cheirava podridão e sangue, um cheiro com o qual já tinha se acostumado. Cheirava igual Raccoon, e
enquanto subia a escada lentamente, ele pensou que morreria feliz se apenas pudesse fazer isso respirando ar
puro e fresco.
A tampa de metal no topo da escada levantou facilmente, presa em dobradiças terminando apoiada num gradil
lateral. Carlos emergiu cuidadosamente em outra escura sala com ar de esconderijo, cercada de consoles,
armários e nenhum corpo −
“Caramba”. Ele suspirou, afastando−se da escada e indo para o console da parte frontal, embaixo de grandes
janelas que se voltavam para o pátio escuro. Era um velho sistema de comunicações, e mesmo enquanto
levantava os fones de ouvido, pôde ouvir o barulho de estática vindo do pequeno alto−falante preso num painel
lateral, seguido por uma fria voz feminina.
“Atenção. O projeto Raccoon City foi abandonado. Manobras políticas para retardar os planos federais falharam.
Todos devem evacuar imediatamente para fora do raio de explosão de dezesseis quilômetros. Mísseis serão
lançados ao amanhecer do dia. Essa mensagem está sendo transmitida em todos os canais disponíveis, e será
repetida em cinco minutos”.
Ele colocou os fones e começou a apertar botões. “Alô? Alguém pode me ouvir, eu ainda estou na cidade, alô?”.
Nada. Carlos correu para a porta no fundo da sala, seus pensamentos repetindo−se infinitamente, amanhecer,
Jill, helicóptero, amanhecer, Jill −
− e a porta, uma porta metálica de enrolar estava firmemente trancada. Sem fechadura nem nada. Ele não podia
entrar no prédio.
E eu nem sei se ela está lá, talvez já tenha voltado, talvez...
Talvez muitas coisas, e por mais que quisesse achá−la, se não achasse uma rota de fuga segura, eles não iriam
conseguir.
Ele se afastou da porta, sem querer ir embora, sabendo que não tinha escolha. Ele tinha que achar um dos
helicópteros dos quais Trent tinha falado, e certificar−se de que funcionavam e tinham combustível. Talvez
pudesse voar pelo complexo, chamar a atenção dela, ou encontrá−la voltando para a torre do relógio.
E se eu não conseguir. Ele não terminou o pensamento, ciente sobre o destino de Jill caso falhasse.
Quase sem perceber a dor em seu lado, Carlos correu para a escada, seu coração pulando e cheio de pavor.

Resident Evil #5 Nêmesis Onde histórias criam vida. Descubra agora