Não dormi nada aquela noite. Chorei até não conseguir mais chorar, quando vi tava na hora de ir pro último dia de congresso, mas o que eu realmente queria era a minha casa. Me levantei da cama, fui pro banheiro e me olhei no espelho. Tava horrível, parecia que eu tinha levado dois socos, um em cada olho. Tomei um banho, me vesti, peguei meus óculos e fui pra esse maldito congresso. O ônibus já esperava na entrada do hotel.
— Bom dia, não viu a hora não? — disse o professor.
Quase mandei aquele velho tomar no cu! Passei por ele sem responder.
— Vinícius, cadê o Rodrigo?
— Sei lá! — me sentei na parte dos fundos do ônibus.
Ele esperou mais um tempo e depois mandou o motorista ir. Eu tava e não tava ali ao mesmo tempo, resumido, não prestei atenção em nada do que eles falavam. Eu só queria ir embora, pegar o primeiro voo e ir embora. A gente chegou no hotel por volta das duas da tarde, só pra arrumar o que tinha mesmo e depois ir por aeroporto. O nosso voo tava marcado pras cinco horas daquele dia. Joguei minha roupa na mala e desci. Fui até a recepção fechar a conta do quarto e pagar. Mas a moça da recepção:
— Olha, a conta foi fechada hoje de manhã.
— Como?
— Não só fechada, mas também já foi paga.
— Tem certeza disso?
— Ah, agora lembrei. Foi um jovem que pagou, ele veio aqui logo cedo e disse que tava pagando, mas que tu tava pro congresso, acho que é isso.
Filho da puta! Aquilo me deu um ódio! Ele pensava que eu era o quê? Uma puta que ele comia e depois pagava a conta? Se eu visse ele na minha frente, não sei o que eu seria capaz de fazer.
— Tu podes me dizer quanto deu o total da conta?
Ela ficou olhando no pc dela um tempo.
— Quatrocentos e oitenta reais.
— Muito obrigado.
Saí da recepção, fui pro quarto pegar a minha mala e depois eu desci. Logo depois nós fomos pro aeroporto e nada do Rodrigo aparecer, até que um cara da turma dele disse que o Rodrigo tinha avisado a ele por mensagem que ia ficar mais dois dias por lá.
Bem, eu cheguei em casa por volta das onze da noite. A mamãe me abraçou e me deu um beijo.
— Meu querido, como foi o congresso?
— Legal.
— O que foi que aconteceu contigo? Tu tá triste. — mãe é bicho foda, viu.
— Nada não, só tô cansado mesmo. Vou me deitar.
Fui pro meu quarto, tirei minha roupa, fiquei só de cueca e deitei na minha cama. Quando eu vi já tava chorando, me sentia um lixo, usado pelo Rodrigo. Passei dois dias em casa, não saía nem do quarto. A mamãe perguntava o que eu tinha e eu só dizia que não tava legal. O Guga me ligava, mas eu não atendia e nem respondia as mensagens.
Na quarta de manhã, acordei com alguém sentado na minha cama, era o Guga.
— Vai fugir de mim até quando? — ele falou rindo.
— Como tu entrou aqui?
— Tua mãe abriu a porta pra mim. — ele passou a mão na minha cabeça, mas eu me afastei.
— O que foi que aconteceu? Te liguei, mandei mensagem e nada.
— Não aconteceu nada, só não quero falar com ninguém, vai embora Gustavo.
Eu me virei, ficando de costas pra ele, mas ele não foi embora. Ele deitou ali na cama e me abraçou, a gente ficou tipo de conchinha.
— Não vou embora, além de tudo tu é meu amigo não posso te deixar assim.
Não falei nada, só o deixei ali, ele ficava passando a mão dele na minha.
— Tu não sabe como eu fico te vendo assim.
Ele me puxou pra mais perto dele e assim eu fiquei até dormir de novo. Quando acordei de novo, eu tava só na cama, fiquei pensando se tinha sido um sonho, mas logo a porta abriu e o Guga entrou com um copo na mão.
— Bom dia!
Ele sorriu pra mim.
— Agora sim, bom dia.
Ele sentou na cama e me perguntou se eu queria água, bebi quase toda a água dele.
— Que horas tem?
— Duas horas.
— Dormi tanto assim?
— Que até roncou!
— Preciso de um banho e comer alguma coisa.
Levantei da cama, me espreguicei, peguei minha toalha e fui pro banho. Não tem nada melhor que um bom banho gelado pra tirar as coisas ruins. Saí do banho novo! Enrolei a toalha na cintura e entrei no quarto.
— Ah não, isso só pode ser provocação, né Deus? — ele falou aquilo tão engraçado que eu ri. – Olha, tirei um sorriso da tua boca!
Peguei uma cueca na gaveta e vesti de costas pro Guga.
— Para de olhar pra minha bunda, tarado!
— O que é bonito é pra ser admirado.
— Tu nunca viu pra tá falando, cara.
— Mas imagino como seja.
— Cala a boca, vai — vesti uma bermuda e uma camiseta — bora lá em baixo, tô com fome!
Saímos do quarto e só tinha a gente em casa, a mamãe voltava do trabalho às seis. Esquentei o almoço.
— Já comeu?
— Sim, o tempo que tu dormia eu fui na casa do Rodrigo e comi lá.
Eu respirei fundo e não perguntei mais nada.
— Porque ele só veio hoje de lá?
— Não sei!
— Ele tá todo estranhão, falava com ele e ele nem respondia, ficava viajando.
— Por favor, bora mudar de assunto?
Ele ficou me olhando. Às vezes eu achava que o Guga lia meus pensamentos porque sempre que eu não queria falar de uma coisa ele vinha e falava.
— Tem bola hoje, tu vais?
— Cara não sei, não tô no clima.
— Sei...
Me sentei na frente dele na mesa e comecei a comer.
— Ah, já sabe da festa de formatura do Príncipe, né? — ele continuou.
— Hum... Quando vai ser?
— Dia 29.
— Agosto, agora?
— É sim, ele disse que tá querendo falar contigo.
— Também tô precisando falar com ele.
— Tô gostando disso não, o que tu tem pra falar com ele? — ele fez uma cara de bravo, mas logo riu.
A gente ficou o resto da tarde em casa e depois ele foi me deixar na faculdade. Quando a gente chegou, o celular dele tocou.
— Fala Rodrigo!
Só de ouvir o nome dele me dava raiva.
— Vai rolar sim a bola, aparece láBeleza, vou te esperar ou a gente pode ir juntosSelado, quando eu for eu passo aqui e te pego, falou.
— Tô indo nessa Gustavo, valeu pela carona.
Ele segurou meu braço.
— Calma, não vai me dar nem um abraço? — peguei e o abracei, ele deu um gemido com o meu abraço — É tão bom te sentir, sentir teu cheiro, teu corpo.
— Pode me soltar?
— Égua, tu não entra no clima uma vez?
— Quem sabe um dia Guga, quem sabe?
— Bora lá na bola hoje?
— Não, fica pra próxima mesmo, deixa eu ir nessa cara.
Eu fui pra sala e me sentei no fundo, fiquei pensando, pensando. A aula terminou e eu saí da faculdade, mas antes passei no banco e tirei 500 reais, peguei um táxi e disse o endereço pra ele. Olhei no relógio era 10:15 da noite, cheguei aonde eu queria, paguei o táxi e entrei. Ali tava cheio, fui andando, falando com algumas pessoas até que eu vi eles sentados e bebendo. Então eu o vi ali sentado, sem camisa e rindo, meu sangue ferveu na hora. Fui andando até que ele me viu e ficou me olhando.
— Opa, vou querer um copo — coloquei minha mochila numa cadeira.
— Olha quem apareceu, saudades de ti cara! – o Fábio me deu um abraço, e fui falando com todo mundo e ele me olhando.
— Príncipe, seu safado, saudades!
— Eu que digo, pegou quantas lá?
— Nenhuma, sou um rapaz comportado.
— Mas não era tu que não vinha? – disse o Guga.
— Pois é cara, lembrei que eu tinha que fazer uma coisa — falei aquilo e abri a carteira peguei os 500 reais.
— Eita, pra quê é essa grana toda?
— Tu já vai saber, Gustavo.
Fui andando até parar na frente do Rodrigo e com o dinheiro na mão dei um tapa no peito dele.
— Olha aqui filho da puta, eu não preciso que tu pague porra nenhuma pra mim!
Ele ficou assustado assim como todos que estavam ali. Ele me empurrou.
— Tá ficando doido, filho da puta?
O Guga segurou o Rodrigo e o Fábio me segurou.
— Filho da puta é tu, me solta Fábio!
— Não! Tá ficando doido?
Ele foi me empurrando até que eu vi uma garrafa de cerveja em cima da mesa. Consegui empurrar o Fábio, peguei a garrafa e fui pra cima do Rodrigo, mas alguém me segurou. Mesmo assim eu joguei a garrafa nele, que não pegou. Nessa hora todo mundo que tava na arena tava ali vendo aquilo.
O Guga veio até mim e foi me arrastando,
— Isso não vai ficar assim fudido, tu me paga! – falei, ele me olhava com raiva, o Guga me levou até chegar no carro dele.
— Que porra foi aquela, Vinicius?
— Não te mete Guga, aquilo é entre eu e aquele filho da puta!
— Como não, caralho? Tu jogou um garrafa nele! Tu ficou doido?
— Ah, sem drama, vai. Nem pegou naquele filho da puta.
— Me diz o motivo daquilo!
— Ele é o motivo! Ele! – o Guga ficou me olhando e eu vi que tinha falado merda — ele sempre se achando o melhor, porra, sabia que ele sumiu do hotel e ainda pagou tudo?
— E tu fez essa porra toda por causa disso?
— Ah, Gustavo, tu não entende.
— Se eu não entendo, então me explica.
— Esquece, vou indo nessa.
— Eu te levo — ele me segurou.
No caminho ninguém falava nada, ele me deixou em frente de casa.
— Brigado.
— Amanhã a gente se fala.
Ele tinha ficado com raiva porque eu não queria falar o real motivo. Eu não ia dizer pra ele que aquilo foi porque a gente transou lá e depois ele pagou tudo como se eu fosse uma puta!
Saí do carro dele, entrei em casa, falei rápido com o papai e a mamãe, fui pro quarto e me joguei na cama. Aí que eu lembrei.
— Puta que pariu! Deixei minha mochila!
!II
Fui tomar um banho, saí do banheiro com meu celular tocando. Era o Príncipe.
— Posso passar na tua casa daqui a pouco?
— Claro que sim!
— Beleza, em 30 minutos tô aí.
— Beleza! — achei ele diferente pelo telefone, vinha bronca por ali.
Desci, fui comer algo e logo depois recebi uma mensagem do Príncipe dizendo que era pra eu ir à casa dele. Avisei pra mamãe e fui, ele me esperava na frente.
— Estou aqui.
— Entra aí, bora lá pra cima — a gente subiu até o quarto dele —senta aí, não vou te bater não!
Me sentei na ponta da cama dele e ele do outro lado. Ele continuou:
— Eu conversei com o Rodrigo — na hora eu gelei e olhei pro chão — e ele me contou o que rolou entre vocês.
Pensei que eu fosse cair duro ali no chão, minha vista chegou a ficar escura, eu não conseguia olhar pra ele.
— Cara, eu sei que não deve ser fácil isso.
— Ele te falou tudo mesmo?
— Tudo, do beijo, de vocês em Fortaleza, tudo cara.
— E ele falou que depois de ele ter comido o viado aqui, ele foi embora e ainda deixou tudo pago como se eu fosse uma puta? — eu falei alto aquilo, e olhei pra ele. Nessa hora eu já tava com os olhos cheios de lágrimas — Hein, Rafael, ele te falou que eu me senti um lixo depois daquilo?
Não teve como segurar, comecei a chorar. O Rafael veio até mim e me abraçou.
— Fica assim não, cara.
Eu consegui parar de chorar.
— Cara, é foda, do dia pra noite eu me vi apaixonado por ele, eu tenho raiva de mim por sentir o que sinto por ele!
— Cara, deve ser mesmo, me conta como aconteceu tudo.
Eu respirei fundo e fui contando pra ele, morrendo de vergonha, mas contando. Em nenhum momento ele me julgou ou fez algum comentário preconceituoso.
— Então é isso.
— É foda mesmo.
— Me diz o que o Rodrigo falou pra ti?
— Cara, ele falou quase a mesma coisa que tu me contou. Ele me disse que quando tu beijou ele, ele sentiu raiva de ti, mas depois ele se viu pensando no beijo, mas que ele sabia que era errado e que ele não era gay pra pensar em outro homem. Mas ele disse que com o tempo um desejo de ficar perto de ti foi crescendo até que lá ele não aguentou e rolou entre vocês, mas depois ele ficou com medo e saiu de lá.
— Ele sempre foi assim, quando tem medo foge.
— E agora? Como vai ser as coisas em vocês?
— Não vai ser! Se eu ver ele na minha frente, não sei o que eu faço.
— Sempre disse que ia dar em namoro e eu tava certo.
— Teu cu!
— Deixa eu pegar teu convite e a tua mochila.
—Cara, ainda bem que tu pegou ela!
A gente ficou conversando até tarde, me senti aliviado, de certa forma.
Enfim chegou o dia da formatura dele, foi no Hangar a festa. Quando eu cheguei lá o Rodrigo já tava, o Príncipe me viu e veio falar comigo.
— Caralho Rafael, isso tá foda!
— Porra, tô mega feliz cara, mas bora beber!
— Bora, porra!
A gente ficou lá conversando e rindo, mas toda vez que o Rodrigo chegava pra conversar eu saía. Não demorou muito o Guga apareceu. Nossa, ele tava lindo! Ele falou com o Rafael e depois veio falar comigo.
— Oi amor!
— Oi meu lindo, tudo bom?
— Opa, tô gostando!
— Pensei que tu não vinha.
— Porra, perder bebida de graça?
— Ai, Gustavo.
— Tu tá lindo!
— Para com isso, cara.
Porra, a festa foi foda demais, a gente curtiu pra caramba. O Guga teve que ir embora cedo porque teria que deixar os pais no aeroporto, eles iam viajar. Eu fui deixar ele no estacionamento.
— Porra, tu não volta mais, né?
— Não cara, tô cansado também.
— Então tá, falou?
Eu abracei ele, que me abraçou, mas quando eu fui sair ele segurou a minha nuca e me beijou. Foi muito bom o beijo dele, cheguei até esquecer que tava ali no estacionamento.
— Opa, tu sempre te aproveita de mim, né?
— Vou passar a me aproveitar mais.
Ele foi embora e depois voltei pra festa, que terminou por volta das cinco da manhã. Eu tava levemente alterado, mas não porre. O Fábio tava de carro então eu vim com ele e com a gente veio o Rodrigo e a Carla, uma amiga nossa. Ele deixou eu e o Rodrigo na esquina e depois foi deixar a Carla. Eu vim andando na frente e o Rodrigo atrás de mim, eu vinha até andando rápido quando ele falou:
— Bonita cena a tua e do Gustavo no estacionamento! — eu parei e me virei pra ele — Vai querer dar pra todo mundo mesmo, né?
— Se eu quiser o problema é meu e vai tomar no cu!
Voltei a andar quando ele passou na minha frente.
— O problema não é só teu, caralho!
— É sim, e sai da minha frente.
Foi então que ele me segurou com força pela camisa e me empurrou até a porta da loja fazendo um barulho alto.
— Eu não sou gay, porra!
Ele falou aquilo quase gritando e me encarando, ele tava com raiva e eu ali sem reação alguma.
— Eu não sou gay!
Falou mais calmo e foi olhando pro chão.
— Eu só me apaixonei por outro cara.
Ele largou minha camisa.
— Eu me apaixonei por ti! — disse ele quase sussurrando.
Fiquei sem reação alguma. Ainda tava tentando raciocinar o que ele tinha me dito.
— Eu não paro de pensar em ti!
Foi aí que eu fiz algo que definiu o rumo da minha vida
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Eu não sou gay, eu só me apaixonei por outro cara.
Historia CortaHistória real, conto romântico homossexual contando a história de Vinicius e Rodrigo que de inimigos se tornaram namorados. É aquele velho ditado. Os opostos se atraem.