1595- Soneto 020

108 5 0
                                    

Transforma se o amador na cousa amada,
por virtude do muito imaginar;
não tenho, logo, mais que desejar,
pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si sòmente pode descansar,
pois consigo tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semideia,
que, como um acidente em seu sujeito
assi co a alma minha se conforma,

está no pensamento como ideia:
[e] o vivo e puro amor de que sou feito,
como a matéria simples busca a forma.

ANÁLISE

(Só) Pela força da imaginação o eu-lírico, extremamente platônico, consegue amar sua dama. E ele se contenta com isso, nem precisa mais desejar pois se sente completo. O segundo quarteto é um excelente exemplo de que o “EU” seja platônico, pois o centro de seu amor (Cérebro/coração) já está satisfeito – o contato físico mancharia o amor imaculado. Trata-se de um encontro transcendente de almas. Outra vez, o texto se inicia, nos tercetos, com um conjunção adversativa. Ele afirma que sua “linda ideia” é coerente como a a forma que compõe o sujeito ou o refrigera a alma. O poeta finaliza o texto dizendo que sua essência não é a razão (cérebro), mas o amor, natural e simples tal qual a formação do universo. 

SONETOSOnde histórias criam vida. Descubra agora