1616- Soneto 120

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Cá nesta Babilónia, donde mana
Matéria a quanto mal o mundo cria;
Cá, onde o puro Amor não tem valia,
Que a Mãe, que manda mais, tudo profana;

Cá, onde o mal se afina, o bem se dana,
E pode mais que a honra a tirania;
Cá, onde a errada e cega Monarquia
Cuida que um nome vão a Deus engana;

Cá, neste labirinto, onde a Nobreza,
O Valor e o Saber pedindo vão
Às portas da Cobiça e da Vileza;

Cá, neste escuro caos de confusão,
Cumprindo o curso estou da natureza.
Vê se me esquecerei de ti, Sião!

ANÁLISE

O texto se inicia com a localização do eu-lírico: babilônia, cidade criada após o dilúvio e que representava a rebelião direta do homem em relação a Deus – por isso sua projeção vertical até o céu. O eu-lírico, então, a adjetiva com tantos pontos pagãos: emanadora de matéria, sem amor puro, mãe profanadora, mal afinado, o bem desordenado, tirania, monarquia, elevação vã do nome de Deus, terra labiríntica, terra cobiçosa e vil. Lugar caótico, escuro e confuso. No entanto, o verso chave de ouro, o último, fecha o poema com a possibilidade de redenção: mesmo diante do “inferno instituído” o eu-lírico se lembra da terra prometida: Sião. A bíblia coloca Sião como sinônimo de Jerusalém ou todo o estado de Israel, berço cristão. O texto é maneirista pois apresenta um pessimismo em oposição a empolgação humanista proposta pelo renascimento.

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