1595 - Soneto 003

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Busque Amor novas artes, novo engenho,
para matar me, e novas esquivanças;
que não pode tirar me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.

Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê.

ANÁLISE

Outra vez a temática de que estar amando é estar afetado, contaminado. O EU-lírico está deprimido, quase sem esperança de amar, quase num estágio de “desamor”. Logo, se o amor mata, ele estaria imune porque sua esperança de amor está em grau zero.

A segunda estrofe marca um oxímoro: o Eu afirma ter outra esperança: uma perigosa segurança. Isso quer dizer que ele se sente seguro porque está se fortalecendo diante da morte, mas qualifica este poder como perigoso, pois, afinal, estaria sem amor, perdido e confuso como um barco sem leme em mar revolto.

Os tercetos se iniciam com uma conjunção adversativa – ela inicia um esclarecimento: não se pode sofrer a ausência de esperança, pois é o amor que enfraquece o homem. E quase nada de esperança há. Em destaque está o amor silencioso e letal que, de acordo com os últimos tercetos é uma incógnita: neoplatônico porque não é físico e indecifrável. Daí o temor do EU-lírico.

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