Soneto 129

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Na ribeira do Eufrates assentado,
discorrendo me achei pela memória
aquele breve bem, aquela glória,
que em ti, doce Sião, tinha passado.

Da causa de meus males perguntado
me foi: Como não cantas a história
de teu passado bem, e da vitória
que sempre de teu mal hás alcançado?

Não sabes, que a quem canta se lhe esquece
o mal, inda que grave e rigoroso?
Canta, pois, e não chores dessa sorte.

Respondo com suspiros: Quando crece
a muita saudade, o piadoso
remédio é não cantar senso a morte.

ANÁLISE

Mencionado no livro de Gênesis, Eufrates era um dos quatro rios que tinham sua fonte no Éden. Ele faz fronteira com o estado de Israel e está a 568 km do Egito. O rio, a moda de Heráclito ou qualquer poeta neoclássico, o faz pensar, de novo, em Sião – espécie de galardão/paraíso, situado em Israel. Parece que, na segunda estrofe, alguém ou o próprio rio lhe perguntou sobre as causas de seu sofrimento. Parece que o interlocutor está indignado diante do grande homem que chora. Tal interlocutor indaga por que o eu-lirico não canta/pensa/poetiza as glórias que viveu no passado. É o que afirma os tercetos: quem canta seus males espanta – “Canta, pois, e não chores dessa sorte”. Há aqui uma injeção de ânimos. No entanto, o EU se justifica afirmando que sua tristeza tem endereço definido e o problema não é com ele: é saudades de Sião.

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