Kara Danvers

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Padrões salpicados de luz da tarde deslizava sobre as minhas mãos, enquanto me ajoelhava sobre um tapete de espuma verde, a sombra lançada pelo carvalho antigo cobria o meu corpo e o vento batia suavemente contra as maçãs do meu rosto. Da rua erguia-se o som de uns quantos automóveis a passar, mas notava-se que a estrada ficava afastada.
Endireitando-me, espreguicei-me para fazer estalar as costas, em seguida relaxei, estremecendo quando o cheiro do café deslizou pela janela da cozinha, impregnando a paz da fria tarde de primavera e soube que Eliza já se encontrava a preparar o lanche.
A brisa agitou uma madeixa loira e encaracolada que me fez cócegas no rosto e eu prendi-a, olhando de relance para o fundo do canteiro, do outro lado da roseira. Os meus lábios afastaram-se, numa expressão de desilusão. Tinha sido espezinhado.
- O lanche está pronto? - questionei, encostada à janela da cozinha encarando Eliza.
- Está pois - um breve sorriso apanhou-lhe o canto direito dos lábios, mas logo desapareceu ao olhar para mim.
- Tens que me desculpar, mas isto está tudo a ser muito estranho, eu sabia que existia versões alternativas de Kara noutras Terras, mas não estava à espera de alguma vez chegar a conhecer uma –
Assenti em concordância e Eliza esticou a caneca com café na minha direção. O sangue das minhas mãos começou a ferver com a temperatura do café. Respirei fundo apreciando a tarde e traguei um gole do líquido quente.
- Ela também se chamava Kara? - questionei com a curiosidade a bater à porta.
- Sim, vocês são muito similares, até chegam a ter a mesma cicatriz na testa - apontou e delicadamente tocou no corte marcado na minha pele.
A uma velocidade superior à do pensamento, agi por reflexo e rapidamente desviei-me do toque inoportuno de Eliza.
- Desculpa - disse, retornando a bebericar no seu café.
- Não tem problema - encostei a caneca aos meus lábios e deixei o café derramar pela minha garganta aquecendo o meu espírito.
- Acredito que ela tenha tido uma boa vida com vocês aqui - ajeitei os óculos desnecessariamente, sendo que esses já se encontravam perfeitamente alinhados na minha cara, porém, era já um vicio que ao longo dos anos foi-se tornando comum.
- Ela chegou cá quando tinha treze anos, é uma longa história - comentou e eu ajeitei-me perto da janela demonstrando interesse em querer conhecer um pouco mais acerca da Kara Danvers.
- Estou à espera - murmurei com um pequeno sorriso a saltar-me da boca e Eliza devolveu o mesmo iniciando então o conto.
Após terminar a extensa história que foi a vida de Kara Danvers, sou apanhada de surpresa com a questão de Eliza - E a tua? Também espero que tenha sido uma boa vida -
- Não tão emocionante quanto a da sua filha, até ontem não sabia sequer que terras alternativas existiam e hoje descobri que existem aliens. A vida da vossa Kara foi sem dúvida muito mais intensa que a minha e ao menos teve a sorte de ter vocês quando cá chegou - tentei desviar suavemente o assunto que rapidamente tinha-se virado na minha direção.
- É uma pena que a vida dela tenha terminado tão rapidamente - uma súbita tristeza apoderou-se de Eliza, mas fez questão de imediatamente recompor-se.
Acredito, que de facto, eu estava a tornar-me um incómodo e apenas estou aqui desde a noite passada. De inicio Eliza confundiu-me com Kara Danvers e nunca antes eu tinha recebido um abraço com tanto amor nele impregnado, porém, no momento em que Lena fez-se explicar, Eliza imediatamente desapareceu até esta manhã. Não a culpo, eu própria teria feito o mesmo.
- Lamento as circunstâncias, se eu soubesse que era a mãe de Kara Danvers, eu teria-me negado vir para aqui, mas Lena só soube explicar-me depois de ontem ter saído - saiu sussurro sôfrego acompanhado de um suspiro pesado que bateu contra o café.
- Não lamentes, Kara. A culpa não é tua. A Alex de certeza que mandou-te vir para cá com as melhores intenções - pousou a sua mão sobre a minha. Desta vez deixei ficar.
- Olá - uma voz quebrou o momento e num ápice guardei a minha mão no bolso, deixando apenas a outra a agarrar a caneca.
- Lena, que bom te ver - Eliza saiu pela porta indo de encontro a Lena. Jogou-se contra ela enrolando a mesma nos seus braços. Já Lena, fez igual, parecia apreciar o momento com gosto.
- Ainda bem que estão a dar-se bem - Lena, agora já livre, dirigiu-se até mim com intenções de cumprimentar-me com um aperto de mão, contudo, mantive-me imóvel, completamente perdida. Navegava nos meus pensamentos mais profundos tentando lembrar-me de onde reconhecia a sua feição, todavia, cortei a minha linha de raciocínio ao aperceber-me que parecia estar a ignorá-la.
- Olá - respondi finalmente de volta, ainda com a mão escondida no bolso. Não pretendia agarrar a dela, não estávamos a tratar de negócios.
O sorriso no rosto de Lena morreu juntamente com a sua mão que caiu de encontro ao seu tronco.
- Bem, o apartamento na qual vais ficar já está pronto. A Alex disse que é capaz de levar mais tempo do que estávamos à espera para arranjar os dispositivos de viajar entre Terras sem o Win por cá, então aconselhava-te a talvez arranjares um trabalho - Lena murmurou com um tom de voz rancoroso, provavelmente tinha encarado o meu gesto como falta de educação, contudo, mantive-me em silêncio perante a sua fala, não iria desculpar-me por algo tão simples quanto aquilo.
- Está bem, não tem problema - despedi-me de Eliza com um olhar silencioso e a mesma respondeu de igual forma. Talvez a retornar-se a encontrar, mas por agora preferia manter esta despedida como definitiva.
- Até logo, Eliza - Lena fez questão de retornar a abraçar a esguia figura de Eliza, que ficou esmagada nos seus braços. A relação delas era intensa, mas não de uma boa forma, havia ali um violento sentimento de tristeza quando se miravam.
- Então, como é que arranjamos uma identificação para eu puder trabalhar? - questionei à medida que caminhávamos para o carro de Lena.
- Irás ser a Kara Danvers por cá, ela desapareceu há uns meses, mas todos acham que ela apenas foi de férias, seria suspeito ela ter desaparecido ao mesmo tempo que Supergirl. Vais ficar com a identificação dela, mas podes trabalhar na tua área e fazer a tua própria vida - com frieza amarrada à voz, estendeu o braço na minha direção e um envelope entregou-me, não chegando a fitar-me sequer.
- Kara Danvers, soa melhor do que o meu nome de qualquer forma. De certeza que não vai ser estranho assumir a identidade da vossa amiga? - inquiri com calmaria, enquanto abria o envelope. Retirei o passaporte e automaticamente esse abri na parte onde estava descrita a minha nova identidade. Além de algumas informações acerca do passado de Kara Danvers.
- Foram ordens da Alex, ela decidiu juntar o útil ao agradável, eu só estou aqui para ajudar. Ela não está a lidar muito bem com a tua presença - Lena, ainda com o gelo a esfriar as suas palavras, jogou de boca para fora.
- Que bom saber. Vocês é que me trazem para cá e eu é que tenho de levar com isto. Eu não sou uma jornalista ou muito menos tirei um curso de tal na universidade, esta vida é dela e não minha. Como é que é suposto arranjar um trabalho na minha área se tenho o passado de outra pessoa agarrado a mim? - a raiva agora amargou, dava para sentir o ácido na minha fala e Lena finalmente mirou-me.
Estava numa terra desconhecida, com respostas a meio, com falta de descanso ou de alguém com quem comentar acerca desta loucura, aguentar com a tristeza de Eliza, levar com o mau humor de Lena e a pessoa que me arrastou para cá não conseguia ver-me pela frente.
- E nós não temos de levar com a tua falta de educação. Essa era a irmã dela, a minha namorada, a filha de Eliza e amigos de muitos, além de que a heroína de outros. Não tens noção do quão difícil está a ser, então deixa de ser mal-agradecida - com os olhos agora espelhados, devido à leve manta de água que se formava sobre eles, explodiu ainda com uma estranha quietação no seu ramalhar.
- Para o carro! - exclamei, resolvendo ignorar o incomodo que apertava o meu peito.
Lena encarava-me com intensidade, a fúria a queimar a sua íris verde, estava capaz de engolir-me viva.
O motor parou e olhei para o lado, onde Lena se encontrava, remetida a um novo silêncio. O som lento dos grilos erguia-se de um lote vazio próximo. Ela parecia agora nervosa, os dedos rápidos mexiam no fundo da sua bolsa. - Vais até lá a pé, desenrasca-te - resmungou com furor e aguardou que eu saísse do veículo.
Senti um formigueiro rasgar através de mim como um choque estático invertido. Desta admito que não estava à espera, mas não iria perder um bom desafio.
- Irei mesmo - arranquei da mão dela um papel que ela estava a esticar-me, abri esse revelando a morada na qual iria ficar estagiada. Sai do carro e o baque estrondoso da porta rebentou ao longo da estrada vazia, ainda estávamos perto do campo.
O arranque do carro estalou nos meus ouvidos e no mesmo segundo esse desapareceu da minha vista pela estrada à fora.
- Estúpida, deixou-me na porra do meio do nada - murmurei com indignação. 

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NOTAS

Olá! Espero que estejam a gostar, vocês não têm noção do fim que tenho planeado para esta fianfic xD Mas sei que vai ser um do vosso agrado.

Até à próxima.

Perdida entre terrasOnde histórias criam vida. Descubra agora