Capítulo 45

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O Lamborghni seguiu pelas ruas e avenidas com uma velocidade razoável, seguida de perto por um conversível preto no qual estavam três seguranças.
- Como você aguenta andar pra lá e pra cá com essa escolta real armada?
- Depois de um tempo você se acostuma. Pelo menos, eles fazem o máximo para não me incomodar quando eu peço que seja assim...cuidado com o carro da direita!
Arkin notou a fina milimétrica que Cruello tirara de um veículo que buzinou, o qual Cruello buzinou de volta, colocando ainda a cabeça para fora do vidro.
- Tá buzinando por quê?! A rua é para os vivos!
- Os anos passam e você continua do mesmo jeito alterado ao volante. Igual sua tia!
- Eu não sou alterado! Os motoristas em geral que são um bando de beócios ao volante!
Arkin não retrucou, limitando a manter uma mão no botão do cinto e outra na maçaneta da porta. Se percebesse um acidente iminente, estava disposto a se arriscar e saltar para fora do veículo. Com Cruello ao volante, o perigo poderia ser constante. O loiro olhou para trás, notando que o conversível preto com seus seguranças continuava seguindo-os. Na certa estavam apreensivos que ele pudesse sofrer algum acidente por conta das imprudências do primo. Mas, por mais incrível que fosse, Cruello nunca havia se envolvido com nenhum tipo de acidente automobilístico. O "anjo da guarda" dele deveria ser muito bom, mas em se tratando de um Devil, devia ser protegido por um demônio mesmo.
A fim de evitar focar demais na forma como o outro dirigia, Arkin procurou encontrar um assunto qualquer que pudessem conversar.
- É...depois de mais de uma década, você finalmente está amando. Difícil de acreditar.
- Quem disse que eu estou amando?!
- Ora, dá pra ver claramente que você é louco pela sua namorada. É a primeira vez que vejo Cruello Devil correndo atrás de alguém. Você sempre dizia que eram os outros que deveriam correr atrás de você.
- Eu não estou correndo atrás de ninguém!
- Qual seu problema em querer admitir os próprios sentimentos? Sabe, é natural amarmos alguém e querermos...
- Ora cale a boca!
- Ei, ei, ei! Não me mande calar a boca! Lembre-se que, embora eu seja seu primo, sou uma autoridade real! –Arkin olhou para fora. – Estamos entrando no subúrbio de Londres?!
- Infelizmente sim. A tal ONG onde Igraine trabalha fica nessa região...aliás, chegamos.
Arkin olhou para a modesta fachada da ONG Bicho Alegre, com um franzir de sobrancelhas. O local parecia pequeno, o portão de ferro estava velho e manchado pelas intempéries do tempo, o painel com o nome da ONG estava começando a desbotar e o muro precisava de uma nova pintura. A ONG se localizava em um bairro tranquilo e mediano, afastado do centro comercial de Londres.
- Esse é o lugar que sua namorada trabalha? É meio...
- Pobre. Sim, eu sei!
- E você não fez nada sobre isso? Alguma doação, sei lá...
- Por que eu deveria?! Não tenho apreço nenhum por esse tipo de coisa filantrópica onde não vou ganhar nada em troca!
- Cruello, nem tudo que devemos fazer é esperando algo em troca!
- A Devils já realiza doações para instituições filantrópicas a fim de aliviar a imagem que minha tia prejudicou com sua obsessão por casacos de peles. E para deduzir do imposto de renda também. Mas ajudar uma ONG mequetrefe de bichos já é demais! A Devils não vai ter a imagem dela vinculada a esse tipo de coisa! Pelo menos isso, eu devo honrar a memória de minha tia!
- Mas essa é a ONG onde sua namorada trabalha!
- E o que isso tem a ver? Eu tenho meu trabalho e Igraine não interfere nele, muito embora já tenha tentado interferir. E eu não interfiro no dela. Fim da história.
- Mas já parou para pensar que a opinião pública pode...
- Vamos descer, não quero levar o dia todo pra resolver o que preciso resolver aqui!
Arkin não argumentou. Saiu do carro junto com Cruello, não sem antes colocar boné, óculos escuros e fechar o blusão de moletom simples que vestira.
- Que raios de visual é esse?!
- Eu sou um membro da realeza europeia! Por vias oficiais, ninguém fora do meu círculo de assessores mais íntimos tem conhecimento de que vim para a Inglaterra para te tirar da cadeia! E também prefiro não ser flagrado por algum papparazi adentrando em estabelecimentos do subúrbio londrino!
- Viemos aqui em no meu Lamborghini e seguidos por um carro com homens de preto de aparência de agente secreto. Óbvio que já chamamos atenção.
- ...eu deveria ir embora.
- E me deixar aqui sozinho? Ora, vamos logo entrar e acabar com isso!
O portão estava aberto e ambos subiram a pequena rampa em direção a área construída, na qual havia o que parecia ser uma casa grande e comprida e dos lados, cercados de alambrados onde ficavam alguns cães. Logo na primeira porta, havia uma plaquinha que dizia Recepção e quando ambos entraram, se depararam com uma sala pequena, mas até que arrumada, apesar da construção ser antiga e um pouco mal cuidada.
Assim que entraram, puderam ouvir o som de latidos e berros de aves, notando também algumas pessoas andando pra lá e pra cá, carregando sacos de rações, gaiolas (vazias ou com algum pássaro ou gato). Não demoraram muito para Cruello chamar um dos voluntários, que usava camisa de cor verde com o logo da ONG bordado no peito.
- Ei, você! Indivíduo,venha já aqui!
Mesmo a contragosto pela forma rude como o outro falara, o voluntário se aproximou, limpando as mãos no avental que usava.
- Onde está a Igraine?
- ...quem?
- Como assim não sabe quem é a Igraine, criatura? – Cruello colocou ambas mãos na cintura. – Ela vive enfurnada nesse muquifo em vez de estar enfurnada na Devil's!
- ..Devil's?
- O que, indivíduo? – Cruello arqueou uma sobrancelha. – Por um acaso você não sabe quem eu sou?! – o homem negou com a cabeça. – Olhe para mim, para meu cabelo1 Como não é capaz de me reconh...ai!
Cruello fuzilou Arkin com o olhar quando este lhe deu um puxão na camisa.
- Isso aqui é tecido delicado! Não puxa com força senão esgarça! E por quê fez isso? – ele sussurrou.
- Eu não vim até aqui para ser reconhecido!
- Você não veio, eu não tenho problema algum com isso!
- Olha, eu não sei quem o senhor procura – o homem comentou, achando muito estranho a forma como aqueles dois caras afgetados se comportavam. - Mas pode se informar lá na administração.
Ele apontou na direção onde estava o prédio térreo.
- É isso mesmo que eu vou fazer!
Cruello tomou a frente e Arkin se tratou de agradecer ao voluntário e segui-lo.
A administração da ONG ficava já na primeira porta do prédio, com uma pequena placa a indicar. Ali dentro, no que poderia ser definida como recepção, havia uma mesa de madeira repleta de papéis, um computador e uma xícara de chá já frio. Atrás dela, Yumie parecia absorta em conferir as informações da planilha que tinha na folha em mãos e a planilha que estava na tela do computador.
- Yumie, cadê a Igraine?! – ralhou Cruello de supetão.
- Que te importa?
- O quê?!
- Eita! Nossa, senhor Cruello, que milagre o senhor por aqui! Em que posso ajudar?
- Eu vim procurar a Igraine!
- Poderia ter vindo fazer uma doação para a ONG ou mesmo oferecer a proposta de uma campanha solidária da Devil's para ajudar. Sabe como é, vindo de alguém influente e carismático como você, as chances de conseguirmos mais doadores, financiamento e voluntários é maior. Poderia ser garoto propaganda e...
- Ficou doida?! Tanta tinta para colorir seu cabelo acabou intoxicando seu cérebro?! Eu sou Cruello Devil, herdeiro de Cruella Devil! Jamais fazer campanha para esse tipo de coisa, era só o que me faltava. NUNCA!
Yumie pensou em responder com um "Credo, seu grosso! Seu afetado, rico metido e insensível", mas preferiu ficar quieta. Notou que ele estava acompanhado de um rapaz loiro e bonito, que mais parecia um astro de cinema ou talvez, um príncipe de contos de fadas. Ou poderia apenas ser mais um amigo rico e afetado de Cruello. Mas isso não a impediu de medi-lo de cima abaixo.
- Hãn...posso ajudar vocês em alguma coisa?
- Estou aqui para falar com a Igraine. Pode chama-la?
- Eu não sei onde ela está. Deve estar com o Javier em algum lugar por aqui...
Cruello não demonstrou qualquer reação. Apenas se endireitou como se estivesse pensando em algo. Então, calmamente, saiu. Arkin se adiantou e foi até a porta, vendo o primo sumir em uma das portas que havia no prédio.
- O que deu nele?
- Acho que...ele foi dar uma volta na ONG para encontrar a namorada. – o loiro falou diante da pergunta de Yumie.
- E o senhor?
- Eu o quê?
- Deseja alguma coisa? Gostaria de contribuir com alguma doação para a ONG? Você parece ter dinheiro, pode ajudar.
- Hãn, bem...eu...Gostaria de conhecer o lugar e o trabalho feito aqui. Assim, quem sabe...
- Oh, mas é claro! Pode vir comigo! Eu sou a proprietária responsável, melhor guia para lhe mostrar a ONG não há! – Yumie o puxou pelo braço. – Venha, tenho certeza de que irá adorar nosso trabalho, conferir nossa situação precária e querer ajudar!
Arkin não relutou. Talvez fosse melhor caminhar pela ONG porque, caso Cruello resolvesse fazer um escândalo ali (coisa que acreditava veemente que poderia acontecer visto que, quando Cruello ficava sério e calada em uma situação que normalmente começaria a dar alguns de seus ataques de afetação, era porque a coisa poderia se tornar problemática) ele poderia ajudar a acalmar os ânimos exaltados ou, se fosse necessário, avisar seus seguranças particulares para agirem.

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