2 : Memórias

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  A noite caia pela grande cidade de São Paulo, onde as pessoas voltavam para suas casas depois de um dia longo e cansativo de trabalho. No subúrbio da metrópole, sons de ambulância e rádios de polícia eram ouvidos, um acidente havia acontecido. Um carro e uma camionete havia batido em cheio um contra o outro, o que tinha feito a frente do carro ser amassado completamente. Ainda não era possível saber qual dos dois tinha causado o acidente, mas se sabia que no carro haviam três pessoas. Uma contadora, uma adolescente, e um estudante de direito. Pessoas ao redor se amontoaram.
  
Depois de bastante tempo de resgate foi possível tirar os corpos das pessoas do carro. A polícia esperava que todos estivessem mortos, até que perceberam um sinal vital de uma das vítimas. O estudante de direito, loiro alto porém completamente machucado respirava e tinha pulsação. Seu rosto estava completamente coberto de sangue, ali em primeiro momento era difícil saber se era seu próprio sangue ou de alguma outra pessoa do carro. Os cidadãos a sua volta, já sabendo das notícias que corriam sobre o acidente, sentiam pena do garoto. Todos imaginavam que as outras duas vítimas, recentemente dadas como mortas, eram parentes próximas do garoto que começa a ter consciência. Seus olhos se abrem aos poucos e passeiam pelo local. Uma dor inimaginável percorre seu corpo mas ele estava tão fraco que nem gritar ele conseguia. Olhando para o lado ele percebe que alguém estava sendo colocado em um saco preto, mas não conseguia raciocinar, tudo que ele pensava era quando aquela dor iria parar.
  
O aparelho apita e a luz aparece diante do garoto que em alívio respira fundo. "Chegou a minha hora" o garoto pensa. E sentindo que sua dor estava passando, ele se levanta da maca, mal sabendo ele que aquele poderia ser o último momento que sentiria o chão frio em seus pés. Para sua surpresa aquilo não o amedrontava, e sim trazia paz. Ele passeia entre os paramédicos que correm ao encontro da maca. Olhando para trás vê que alguém ainda estava deitado na cama hospitalar, que se debatia com todos os choques que eram depositados em seu corpo para que o mesmo não morresse. Sabendo que quem estava na maca era ele, e que se ele voltasse aquela dor em suas costas também voltaria, ele olha para luz e se dirige a ela o mais rápido possível, mas quanto mais ele se aproximava mais ela se tornava amarelada e mais sons estranhos saiam dela. A cada passo, uma voz diferente. Vozes de pranto, gemidos de dor. "Me tira daqui!" Ou "eu não mereço isso, por favor!" eram os mais ouvidos, assim como risadas malignas que ecoavam pelo local. Antes que ele pudesse se aproximar mais alguém segura sua mão.
  
_Não, por favor, não vá! Não chegou sua hora. _Uma voz doce e gentil sussurra em seu ouvido. Ele se vira para ver quem era e se depara com uma linda mulher que acaricia seu rosto. Tinha pele pálida e dedos frios, cabelos negros como a noite, lábios rosados como rubi, e olhos verdes. Verdes esses que ele só havia visto uma vez, num sonho. Era mais claro que o normal, cintilava no meio da escuridão. Ele se via hipnotizado por aqueles olhos e dentro daquele olhar ele podia ver um grande campo florido, campo florido esse que ele tinha visto apenas num sonho. Sim, foi esse campo que aparecia em seus sonhos, esse tom de verde coloria as gramas que compunha o grande campo.
  
De repente ele se via novamente maca, agora com inúmeros paramédicos ao seu redor, foi colocado uma mascara de oxigênio e, com uma agulha, um dos paramédicos injetaram uma anestesia e um sonífero o que fez a visão do mesmo se escurecer após alguns instantes.

   Janeiro de 2018

   _Gabriel, vim te dar um banho. _ O garoto abre os olhos deixando suas memórias de lado, lembranças essas que explicavam o que havia acontecido com ele. Com bastante impulso se senta na cama vendo um enfermeiro trazendo uma cadeira de rodas.
  
_Será que isso nunca vai deixar de ser constrangedor? _ o rapaz apoia seu corpo no ombro do enfermeiro que o põe na cadeira de rodas o encaminhando ao banheiro.
  
_Achei que já tínhamos criado intimidade depois de um ano. _O homem sorri tirando a roupa do rapaz e o levando para o banheiro.
  
Após o banho o enfermeiro ajudou Gabriel a se vestir e avisa que a psicóloga estava lá para vê-lo. Eles passeiam pelos corredores brancos e vazios do hospital indo em direção a uma sala. O enfermeiro abre a porta dando de cara com uma mulher morena e sorridente.
 
_Obrigada, Luan, por trazer meu paciente. _ ela segura a cadeira de rodas e a posiciona perto da mesa. Gabriel olha para Luan que dá as costas para eles e sai da sala. _ E aí Sr Alencar, como foi sua noite? Teve aqueles sonhos novamente? _ A mulher diz pondo o óculos e se aconchegando na cadeira abrindo um caderninho onde ela depositava todas as observações sobre seus pacientes.
  
Gabriel suspira se lembrando de como havia sido a noite passada. Normal para não dizer monótona. Era sempre assim: ele tomava um banho com a ajuda do Luan, lia um livro e dormia, ou pelo menos tentava. Sempre que ele se deitava, fechava os olhos e se lembrava do dia do acidente e, quando conseguia dormir, sonhava com a garota de olhos verdes. Sonhava que estava deitado em um campo verde cintilante. Se sentando, encontrava uma flor rosa na mão de uma linda moça que o observava com um lindo sorriso. Seus cabelos eram negros como a noite, lábios rosados como rubi e olhos verdes como aquelas gramas. Ela estendia a mão para o mesmo o ajudando a ficar de pé. Ao segurar a mão da moça, ele sentia-se amparado, amado, desejado. Ela sorria cariciando seu rosto, dizendo: “boa noite Gabriel”, afastando-se. Logo em seguida, o céu se escurecia e as plantas verdes morriam se tornando completamente sem cor, tudo preto e branco. A garota a sua frente não parava de se afastar, o que fazia Gabriel entrar em desespero, tentando dar um passo para se aproximar da garota, mas a cada tentativa mais ele se afundava na terra. Diante de tudo aquilo, o vento começa a soprar e as costas da garota começam a sangrar, manchando seu grande vestido de renda branca. Para a surpresa de Gabriel, nenhum sinal de dor era ouvido ou visto vindo da garota que apenas olha para ele por cima do ombro e sorri. Um buraco negro no chão se abre, de lá saía faíscas de fogo fazendo com que aquilo parecesse um grande vulcão entrando em erupção. O cheiro de enxofre se espalhava pelo ar e ele, sabendo que aquilo não era um bom sinal, grita para a garota pedindo que a mesma se afastasse. O vento se intensificava e os cabelos negros da garota tampavam seu lindo rosto, deixando a mostra apenas seus olhos verdes que ainda cintilavam. “Desculpa” disse a garota desviando o olhar de Gabriel e pulando dentro do grande buraco. Naquele momento ele se via numa grande escuridão, preso nos piores sentimentos. Queria poder pular com ela, queria poder vê-la mais uma vez. Queria tocar nela, queria sentir seu toque. Era estranho ele sentir aquilo por alguém que nunca tinha visto, pelo menos era o que os outros diziam.
  
Após escrever tudo que o garoto havia contado sobre o sonho, a psicóloga anotou os fatos mais importantes e encarou o garoto loiro suspirando logo em seguida. Ela acompanhava o garoto desde que o acidente aconteceu, detalhando tudo o que ele falava para um psiquiatra, pois Gabriel disse que não se consultaria com uma médica “de loucos” como ele mesmo dizia. A verdade é que, depois de tanto ouvir que era louco, Gabriel se negou a ser tratado como um. Pelos corredores do hospital, era possível ouvir, inúmeras vezes, cochichos sobre o estado mental do garoto de cadeira de rodas, porque a todo momento ele tinha ataques de pânico. Ele dizia ver coisas estranhas o rondando durante a noite. Sem falar que sempre que o acidente era citado ele falava sobre a linda mulher que salvou a sua vida. Com o tempo Gabriel aprendeu a guardar aquilo para si mesmo, se abrindo apenas com a psicóloga e com Luan, que havia se tornado seu melhor amigo e o único que parecia se importar com ele desde o acidente. Aquele fatídico dia trouxera inúmeros desgostos ao garoto, como a morte da sua mãe e da sua irmã adotiva, uma depressão enorme, afastamentos de amigos e familiares (adotivos), internamento em um hospital psiquiátrico e, o pior, perdera sua capacidade de andar. Por sorte não perdera o movimento dos braços e das mãos, o que o deixava um pouco menos dependente. No fim das contas, ele estava se acostumando, apesar de ter saudade de sua vida. O que ele mais sentia falta era de jogar bola, de dançar, de dirigir até sua faculdade. Ah, a faculdade de direito. Sempre que Gabriel se lembrava dela seu coração apertava. Depois do acidente ele trancou a faculdade, não tinha mais vontade de fazer nada, ainda mais depois que todos seus amigos deram as costas para ele dizendo que o mesmo era louco ou simplesmente por causa da sua condição dependente. Ninguém estava disposto a cuidar de um paraplégico.
  
Assim que acaba a consulta, Gabriel roda as rodas da cadeira de rodas para fora da sala andando sozinho pelos corredores brancos do manicômio. Ele era o tipo de paciente que tinha passagem livre, pois não tinha diagnóstico perigoso. Já outros pacientes eram tão perigosos que seus dormitórios mais pareciam uma prisão. As vezes na calada da noite era possível ouvir gritos de alguns. Vez ou outra, também era possível saber de histórias sobre enfermeiros que foram atacados. Gabriel particularmente, mantinha distância da maioria dos pacientes, exceto de uma que usava óculos escuros. Ela era pálida, tinha cabelos pretos e lábios rosados. Ela nunca falava mas eles conversavam por post It que eles deixavam numa das mesas do refeitório. Ela era sempre fria nas suas respostas desde o primeiro dia. Gabriel sempre se lembrava desse dia com um leve sorriso no rosto. Naquele tempo fazia seis meses que o acidente havia acontecido e uma semana que ele estava no hospital psiquiátrico. Ele já havia notado que ela sempre o seguia, já que em todo lugar que ele estava ela estava também. Com um pouco de medo se aproximou dela. A mulher estava sentada em uma das mesas segurando um livro, era Dom Casmurro, livro de Machado de Assis, era um de seus livros preferidos. Então, intrigado, tentava a todo custo puxar assunto com a moça, que apenas o olhava com apreensão, ou pelo menos era o que ele pensava, já que seus óculos escuros o impediam de ver seus olhos. “ Será que ela é cega?” ele pensou, mas logo descartou essa possibilidade pois ela estava lendo um livro. Mas nem passara por sua cabeça que talvez ela só gostasse de sentir o livro em suas mãos. Depois de bastante tempo tentando conversar com ela, raciocinou que talvez ela fosse muda, muda e cega talvez? Por via das dúvidas perguntou se ela enxergava e a mesma concordou com a cabeça. Perguntou a ela também se escrevia e a mesma disse que sim concordando com a cabeça novamente. Com isso eles começaram a mandar mensagem pelos post It que eram colados debaixo das mesas. Ele sabia que sua cor preferida era preto, que ela tinha 24 anos como ele, que ela não falava porque tinha medo, porém não quis dizer o por que do medo. Mas ela era tão reservada que nem seu nome ela deixou escapar.
  
Gabriel entra no refeitório e se dirige a mesa onde era de se esperar que ela tivesse colado algum post It. Na noite passada ele havia deixado um recado que dizia para eles se encontrassem no dia seguinte, porém aparentemente não tinha resposta, já que ele olhou debaixo da mesa e o post It da noite passada ainda estava lá. O garoto suspira passando a mão pelo seus cabelos loiros e olha para trás vendo Luan escorado na porta.
  
_Vendo se a garota misteriosa deixou algum post It, é?_ Luan diz se aproximando.
  
_Sim. Ela sumiu faz alguns dias, estou preocupado. _Gabriel diz meio desconcertado.
  
_Gabriel, ela deve ter sumido por que você está tomando seus remédios. Já disse que nunca ouve nenhum registro de alguma paciente que não falasse ou que sempre usasse óculos escuros. Pelo menos não enquanto eu trabalhei aqui. _ Luan diz, e ele estava falando a verdade. Sempre que Gabriel falava sobre ela pra qualquer médico eles diziam que era coisas da sua cabeça. Alguns diziam que poderia ser ele mesmo que escrevia os post its e logo se esquecia.
  
_É pode ser, mas independente do que ela seja, eu gosto de receber seus post its, as vezes eu canso de só conversar com você sabia? _ Gabriel diz olhando para a mesa pensando se ela era só visão da cabeça dele ou se ela realmente existia.
  
_A verdade é que você me ama e odeia admitir. _ Luan diz bagunçando o cabelo do rapaz que tenta desviar das mãos do mesmo. Os dois começam a rir e então Luan segura a cadeira de rodas. _Quer ir a algum lugar? Comer alguma coisa?
  
_Estava pensando em ir para o jardim respirar ar fresco. _ Gabriel diz sem expressar qualquer reação. Luan concorda com a cabeça empurrando a cadeira de rodas em direção a porta que dava ao jardim.
  
Era um local bonito, cheio de árvores e grama. Perto de alguns arbustos era possível ver pequenas flores. Um homem de macacão cinza, braços fortes, cabelos raspados e pele morena cortava algumas ervas daninhas da plantas. Em alguns bancos haviam alguns pacientes. Uma idosa colecionadora de bonecas que realmente acreditava que elas eram suas filhas (inclusive, era necessário que na hora do almoço e do jantar fosse colocados pratos de comida para todas as bonecas). Uma mulher algemada que todos diziam que era um assassina a sangue frio que matara o marido rasgando sua barriga com os próprios dentes. Um senhor que era viciado em sexo, não apenas como alguém que não consegue ficar um dia sem, ele não conseguia ficar um minuto sem (era difícil olhar para ele e não o encontrar com as mãos dentro da calça). Havia também uma adolescente que fora diagnosticada com depressão profunda, a garota já havia tentado suicídio de tantas maneiras que é quase impossível citar todas. Um dia ela foi encontrada sangrando na banheira, aparentemente ela tinha visto isso em um série uma vez. Gabriel achava um absurdo que essa adolescente estivesse nesse manicômio, quem em sã consciência largaria sua filha aqui? Era um lugar afastado de tudo e de todos com pessoas com os mais diversos e aterrorizantes distúrbios.  As vezes Gabriel se questionava se as autoridades sabiam que esse lugar existia. Por último, havia uma mulher que aparentava ter uns 40 anos. Gabriel nunca tinha visto ela por lá e então se intrigou.
  
_Quem é aquela mulher? _ Gabriel aponta com a cabeça em direção a mulher.
  
_Maria Paula, ela foi diagnosticada com esquizofrenia e epilepsia. Um padre trouxe ela pela manhã, dizendo que a princípio pensaram que era algum caso de possessão demoníaca. Obviamente não era, e trouxeram ela pra cá. Aparentemente ela é surtada, fique longe dela por favor. _Luan diz encarando a mulher que os encara de volta e começa a falar de forma estranha, uma língua estranha que nunca tinha sido ouvida.
  
_Você não acredita em possessão, Luan?_ diz Gabriel encarando a mulher que começava a se debater levemente.
  
_Não! Você acredita? _ Luan continua encarando a mulher.
 
_Bem, nunca acreditei em Deus ou em coisas sobrenaturais até.... _Luan o interrompe
 
_Se você for falar “ate ver a mulher que salvou minha vida” _ Luan imita Gabriel de uma forma engraçada. _ seria melhor você nem falar nada. Todos já explicamos para você que foi coisa do momento. Sua cabeça cria alucinações Gabriel. _Luan diz se agachando e olhando para o rapaz na cadeira de rodas.
 
Gabriel encara rapidamente Luan e desvia o olhar olhando para o chão. Ele realmente acreditava que aquilo fora real. O toque da moça tinha sido tão real, ela parecia um anjo que tinha vindo o salvar do inferno, ou o trazer de volta para o inferno, pensa ele olhando para suas pernas imóveis. Após alguns segundos raciocinando sobre aquilo ele ouve um barulho e olha para frente. Era a mulher que agora se debatia contra o chão e babava dizendo coisas estranhas ainda mais alto. Antes que seu enfermeiro pudesse se aproximar ela se levanta indo atrás do cadeirante.
  
_Filho, o filho de Miguel. Você é meu! Só meu! _ uma voz rouca e abafada sai da garganta da mulher enquanto ela ficava cada vez mais vermelha, suas veias quase saltavam para fora de sua pele e sua locomoção ficava mais estranha. Ela corria na direção do Gabriel e Luan se levanta mas ela o empurra fazendo com que ele perdesse o equilíbrio e caísse no chão. Com essa brecha ela pula em cima da cadeira de rodas o que faz os dois caírem no chão. Os Sons dos gritos dos pacientes era quase ensurdecedor. A idosa tampava seu ouvido enquanto balançava pra frente e pra trás quase chorando, o velho viciado continuava com a mão dentro da calça, a assassina ria enquanto batia palmas e a adolescente começa a entra em crise puxando os cabelos quase os arrancando da cabeça.  A mulher fica em cima do garoto paraplégico e começa a enforca-lo. Gabriel sentindo uma dor insuportável na garganta que se distribuía por todo seu corpo e sabendo que sua respiração estava acabando e sem conseguir se mover segurou o rosto da mesma tentando a afastar. Ela com um grande reflexo morde um pedaço do dedo do rapaz fazendo sangue jorrar da ponta do dedo dele. Após alguns segundos Luan com a ajuda de outros enfermeiros conseguem tirar a mulher de cima do Gabriel. _Não adianta fugir, filho de Miguel. Você está na nossa mira. Você estará nas nossas mãos logo. _ ela diz e, a cada palavra, mais sua fala ia ficando mais baixa e desaparecendo assim como sua imagem
  
_O que foi isso? _ Perguntou Luan se aproximando. _Ela tem dentes fortes, ainda bem que só arrancou a cabeça do seu dedo. Vamos fazer um curativo.
  
Antes que Luan chegasse perto do garoto sentado no chão, Gabriel vê ali na sua frente a garota que ele tinha visto no dia do acidente, a mesma que ele via nos sonhos. Seus olhos se arregalam e suas pupilas dilatam.
  
_É ela, eu disse que ela existia! _ Gabriel diz sorrindo alegremente enquanto alterna seu olhar para a garota e para Luan que o observa confuso. _ Ali Luan, ela está ali! _ Ele diz apontando mas Luan olha e suspira.
  
_Vem, vou te dar seus remédios. _ Luan segura o braço de Gabriel e tenta fazer com que o mesmo suba no seu colo mas o rapaz não aceita. Gabriel se debate nos braços do enfermeiro que tenta a todo custo segura-lo.
  
_Não! Não vou com você! É ela que está ali, eu tenho que agradecer, tenho que falar com ela. _ ele diz se debatendo e tentando se soltar dos braços de Luan que o seguram com força. _Para caralho! _ outros enfermeiros começam a aparecer e Gabriel, cansado de ser taxado de louco, se debate mais ainda conseguindo se desprender dos braços do homem e dando um murro no mesmo que cai para trás tampando o local que fora atingido. Gabriel começa a se arrastar pelo chão, tudo que ele queria era mostrar que não era louco, mas ele não percebia que aquilo só contribuía com seu diagnóstico. Ele vê a garota acenar para ele com um sorriso, como se estivesse indo embora. _Não! Por favor, espera! Não me deixa aqui!_ ele vê a mesma se afastando e então os enfermeiros pegam-no pelo braço o levando até a cadeira de rodas. _Se fosse pra me deixar aqui era melhor ter me deixado morrer! _ ele diz esperando que a garota o ouça, mas para sua tristeza ele não a enxergava, só conseguia ver os enfermeiros que olhavam para ele intrigados. Gabriel olha para Luan que ainda estava no chão. O mesmo tira a mão do rosto deixando a mostra um grande hematoma roxo na região do rosto como também um corte que sangrava. O cadeirante suspira, percebendo que só havia piorado a situação. Luan se levantou e seguiu na frente indo direto para a enfermaria.
  
Gabriel ficava calado pensando no que tinha acontecido. Filho de Miguel? Quem era Miguel? Ele sabia que tinha sido adotado pela mãe com dois meses de idade, mas nunca procurou saber o nome do seu pai ou da sua mãe biológica, ele sentia que não tinha motivo para isso. Sua vida era ótima com a família que tinha e não sentia necessidade de procurar pessoas que aparentemente não se importavam com ele. Mas o que havia acontecido ali o deixara intrigado, mais do que normalmente ficaria com essas coisas. “Por que comigo? Por que bem comigo que aquela mulher foi implicar?” pensava o rapaz a cada vez que a roda da sua cadeira de rodas girava em direção a enfermaria. Pensava também na garota. “Por que ela decidiu aparecer só agora?” essa pergunta martelava na mente do garoto.
  
Dessa vez Luan não estava com ele, e sim dois homens grandes e fortes. Um homem negro de cabelo raspado e o outro era bronzeado também com o cabelo raspado. Gabriel imaginava que eles não usavam cabelos grande para não correr o risco de algum paciente puxar os cabelos deles num momento mais tenso. Então isso significa que agora os médicos pensavam que ele era um perigo para o convívio saudável do hospital, mas quem não era? Qualquer pessoa completamente sã que morasse naquele hospício entraria em colapso com certeza. Porém, apesar de saber disso, Gabriel se culpava completamente achando que ele poderia ser realmente louco. Mal sabia ele que tudo isso seria para um bem maior. Eles entram na enfermaria e se deparam com uma enfermeira gorda e mal arrumada, de cabelos espetados e loiros.
  
_Hum, então foi ele que bateu no Luan? Sempre achei que ele fosse meio pirado mesmo. _ ela diz pegando o dedo do rapaz e examinando a ferida. _ Ah nem foi tão feio assim, Jajá melhora. _ Ela começa a por um curativo.
  
_Não foi nada pra você que não viu o que aquela mulher fez comigo.  _Gabriel diz sem paciência.
  
_Olha, tá nervoso o garoto. _ ela ri e olha para os marmanjos que estavam logo atrás dele. _ Ele vai ser castigado?
  
_Sim, vai ficar na sala branca por uma semana. _ o negro mais alto responde. Gabriel olha para ele incrédulo. Ele não podia ir para sala branca, não podia. Diziam que todos que iam para lá saiam piores do que entravam. Desnutridos, virose, pneumonia, tudo de ruim era possível lá. Era completamente uma violação aos direitos humanos.
  
_Não, eu não vou pra lá. Foi só um deslize. _ Gabriel diz um pouco revoltado. _Não vou pra lá!
  
_É o que veremos, amigão. _ o bronzeado diz dando um peteleco na cabeça de Gabriel que se encolhe um pouco. A enfermeira e o brutamonte maior começam a rir e então tiram ele dali. Gabriel suspira de alívio mas logo percebe que era em vão, pois estava sendo levado para a sala branca.

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⏰ Última atualização: Mar 04, 2022 ⏰

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