Capítulo 06: Cecília Britto

93 35 114
                                    

CECÍLIA BRITTO

Assim que cheguei a minha casa, depois de conversar com Clarice e Roberto, encontrei minha mãe. Ela tirava pó dos objetos da estante. Cantarolava alguma música que não consegui identificar qual era. Estava de bom humor.

Será que, seu eu pedir a ela para ajudar a mover a estante para o lado e resgatar algumas das minhas canetas debaixo dela ela iria reclamar? Se bem que da última vez, ela me veio com um sermão de como eu deveria parar de jogar minhas canetas para um canto qualquer em meus momentos de frustração. Mas, o que eu podia fazer? Eu não conseguia controlar. Quando percebia, a caneta estava voando para algum lugar da casa. Mais especificamente, para debaixo da estante.

Melhor deixar esse assunto de lado e pensar em algo realmente útil. Como por exemplo, em algo para ajudar minha amiga. Renata sempre em ajudou. Aliás, foi ela quem deu aos pais a ideia de me apresentar na lanchonete nas noites de fim de semana. E, desde minha primeira apresentação, fui contratada para fazer alguns shows em eventos (casamento, aniversário, festas familiares).

Deitei no sofá. Minha mãe não protestou. Nem pediu para que eu a ajudasse. Melhor para mim. Não estava com a mínima vontade de fazer faxina (aliás, quando estou?). Bem que podíamos ter uma empregada. Mas, o dinheiro que minha mãe recebia como cabeleireira domiciliar e o meu pai como fotografo não sobravam para termos uma funcionária para limpeza. E, o dinheiro que eu ganho dos meus pequenos shows era o suficiente apenas para os meus luxos, como meus pais diziam. Ou seja, roupas, cosméticos e afins.

— Mãe, o que você acha de Renata? — perguntei.

Minha mãe parou o que estava fazendo e olhou para mim.

— Não sei. Depende do que você quer dizer. Se for em relação a Pedro…

Me segurei para não revirar os olhos. Por que em todos os assuntos que eu estava tendo com minha mãe nos últimos dias ela dava um jeito de colocar o nome do meu amigo no meio?

— Não. É que ela quer ser atriz. O que você acha?

— Ela quer ser atriz? — minha mãe comentou com desdém — Não sei. Por que essas perguntas, minha filha?

— Renata quer ser atriz. Mas, ela acha que não tem talento. Pedro conversou com o pai dele e está tentando ajudar…

Eu contaria a minha mãe tudo o que Pedro explicou a mim e a Ricardo. Explicaria, caso ela não me interrompesse espantada, jogando o pano em cima do sofá vago.

— Calma, Cecília. Espere. O que você disse? — minha mãe perguntou — O pai de Pedro vai ajudar Renata?

— É mãe. — falei cansada, me sentando — Paulo é amigo de um diretor de teatro. E ele vai vir aqui, em Traunge. Paulo vai conversar com ele sobre Renata…

E, de novo, não consegui terminar de explicar. Por que minha mãe tinha que ser tão exagerada e inquieta, que nem me deixa concluir o que eu falava?

— Quer dizer que Renata ele ajuda? — minha mãe perguntou brava e irônica, mais para si mesma do que para mim.

Quando ela terminou a sua pergunta e consegui entender o problema. Por. Que. Eu. Fui. Abrir. A. Boca? Por um momento, pensei que minha mãe fosse uma mãe normal, como qualquer outra. Que torceria pelo sucesso da amiga da filha. Que ajudaria, com o que fosse necessário. Como Clarice, por exemplo. Mas, não. Ela não é normal.

Tentei ficar séria para ela. Mostrar que sua reação era exagerada e desnecessária. Mas, quem disse que ela me deu atenção? Ela continuou brava. E por um motivo idiota.

Sonhos Possíveis [Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora