Capítulo X

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Como ele havia dito, era realmente perto, por trás da igreja. A rua era cheia de casinhas simples, um bairro simples. Não havia muitos prédios por perto e os que tinham iam só até o terceiro andar. Sua casa era pequena, a sala e a cozinha praticamente dividiam o mesmo espaço, do tipo cozinha americana, e um corredor curto devia levar aos quartos e banheiros. Talvez eu devesse usar o singular, já que a casa era realmente pequena, não sei, não me preocupei em explorar o local. Contudo, era bastante confortável e até convidativa. Comparada à igreja enorme, cheia de imagens e pinturas de santos e uma arquitetura gótica, essa casinha em tons neutros de bege, marrom e alguns toques de cor espalhados em uma almofada azul ou o verde de uma planta, fizeram meus ombros instantaneamente pensarem menos. Até tinha uma cruz ali, uma imagem de santo acolá, mas eram sempre calmos, discretos. Eles não me julgavam.

— Você pode retirar os sapatos, por favor? — pediu ainda na entrada, retirando os próprios sapatos e meias. Era estranho que eu achasse seus pés, longos como as mãos, incrivelmente lindos?

— Charmosa sua casa — falei deixando meus sapatos ao lado dos dele na pequena sapateira.

— Obrigado. — Isaque parecia meio tímido. — Quer alguma coisa para beber?

— Tem certeza? — perguntei lembrando daquela noite.

— Nada alcoólico, claro.

— Café?

— Achei que você queria dormir.

— Café não tira meu sono.

Ele assentiu. Isaque colocou água para ferver na chaleira elétrica, foi até o armário e tirou uma prensa francesa. Dei um pulinho para conseguir sentar na banqueta e esperei por ele. Isaque colocou uma xícara sobre um pires na minha frente.

— Sem açúcar — pedi ao ver que ele ia pegar o açucareiro.

Colocou o pó de café dentro da prensa, mas ainda faltava a água. Enquanto a água esquentava, Isaque veio até a bancada e apoiou-se com os cotovelos sobre a superfície, de frente para mim.

— É engraçado — começou. — Até um tempo desses, a igreja católica pregava que paixão era uma inflamação da alma. Paixão vem da palavra pathos, que também derivou a palavra patologia. Eu achei que, como padre, eu deveria ser capaz de fugir de tudo isso. — Ele riu de si mesmo, passando a mão nos cachos bagunçados. — Mas então eu te conheço e você faz com que eu me sinta completamente doente, quase um moribundo.

Ele sorriu ao olhar para mim, o que só fez com que eu me sentisse pior pelo que estava acontecendo.

— Desculpa — pedi.

— Não é culpa sua — falou afastando-se da bancando para pôr a água na prensa. — Eu deveria ter resolvido isso quando eu estava começando a sentir esses sentimentos.

Ele trouxe a prensa até mim. Ainda tínhamos que esperar alguns minutos até pressionar, mas já dava para sentir o aroma gostoso do café.

— Talvez não seja pathos. Talvez seja eros — falei me referindo a outro tipo de amor definido pelos gregos. — Talvez seja só um impulso, talvez a gente deseje o que não tem, mas uma vez que a gente tire isso do nosso sistema, podemos voltar a ser quem éramos. O objeto de desejo, após obtido, não é mais desejado.

— Você acredita mesmo nisso? — não havia julgamento em sua voz, era uma pergunta sincera, até esperançosa.

— Não. — Eu também tinha que ser sincera. — Acho que meu cérebro doente está tentando me convencer a fazer algo que eu não devia.

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