Capítulo 2

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São Paulo... Brasil...


                             
Brunna


                             
Eu acordo sobre um colchão e lençóis muito macios, cheirosos. Mmmm, sorrio, me esticando, ainda de olhos fechados, meu corpo gostando desse tratamento após alguns meses dormindo numa cama de solteiro horrível. Esse pensamento me faz arregalar os olhos, os acontecimentos da noite de ontem sendo processados. O quê? Eu ofego com as imagens evocadas. Ludmilla Oliveira. Ela foi atrás de mim e me obrigou a voltar para cumprir um acordo imoral, digno dos Senhores Feudais. Serei sua prostituta pelo tempo que a mulher ridícula me quiser. Mais imagens voltam em meu cérebro ainda lento do sono e gemo, mortificada. Eu a deixei me foder com os dedos, chupar meus seios e me fazer gozar. Me comportei exatamente como ela quer: uma puta, me dando sem nenhuma vergonha. Repulsa me invade e levanto o torso, meus olhos correndo pelo cômodo semiescuro e silencioso. É um quarto enorme. A cama que estou é absurdamente grande, lençóis de aparência extravagante e cara deslizam em meu corpo.

                             
Meus olhos ampliam mais quando percebo que estou vestindo uma curta camisola de seda – que não é minha – igualmente cara, como tudo nesse recinto. Quem me despiu e vestiu isso? Espera... Quem me trouxe para cá e de quem é esse quarto, em primeiro lugar? Me arrasto pela imensa cama, escorregando minhas pernas para o chão. Me espreguiço, bocejando e meu olhar recai sobre o criado-mudo. O relógio está marcando 11:45 da manhã. Estamos no Brasil, possivelmente na casa da Senhora Feudal? Bufo ironicamente, mas, sorrio grata ao ver as sandálias Havaianas no chão. Essas são minhas. As calço e me levanto, indo em direção ao feixe de luz de uma porta entreaberta, onde presumo, seja o banheiro. Meu tornozelo direito reclama do simples esforço. Droga. Meus ombros caem em derrota. Era uma vez um sonho de ser bailarina. Infelizmente a dança profissional estava com os dias contados para mim, essa é a triste verdade que estou escondendo de todos. Parece que se eu não contar, não se torna realidade. O médico me proibiu de dançar desde que sofri uma fratura por stress no meu pé de apoio, apenas um mês depois que cheguei em Nova Iorque.

                             
Para ser sincera, é uma lesão crônica, sinto-a desde os quinze. Comecei no balé bem cedo. Era uma estratégia para fugir de casa e da minha triste vida familiar, porém, passei a amar a dança e a sonhar com uma carreira. Eu queria ser como a, Ana Botafogo, a bailarina brasileira que mais teve projeção mundial. Apenas um sonho tolo de menina. Como tudo em minha vida, isso também tinha que ser arrancado de mim, claro. Minha mãe, meu pai — e não estou me referindo a apenas o seu estado vegetativo de agora, o perdi no instante em que levou aquelas duas víboras para a nossa casa —, e agora, meu sonho escorregou por entre meus dedos. Tudo se foi. O médico disse categoricamente em minha última consulta, que se insistisse em dançar, iria usar muletas num futuro bem próximo. Estremeço, meus olhos enchendo de lágrimas. Eu teria que parar, mesmo se não tivesse tido a triste sorte de ser a escolhida para incubadora particular daquela tirana. Um soluço de dor e desilusão me escapa. Suspiro tremulamente quando chego à porta, confirmando que é um banheiro. Um banheiro maior do que o lugar onde vivi nos últimos meses. Certo, isso foi exagero, porém, isso aqui parece coisa de outro mundo. É muita riqueza. Entro, minha atenção sendo captada pelo enorme espelho sobre a bancada de mármore da pia. Apoio as mãos na pedra fria e encaro meu reflexo. Sou a imagem da derrota. Meus olhos castanhos estão opacos, sem vida, sem esperanças.

                             
— Não há mais nada para você, Brunna. — minha voz quase não sai, embargando, minhas faces sendo banhadas por lágrimas quentes. — Você não tem nada. Nunca teve.

                             
Estou amaldiçoando minha sorte quando algo me chama atenção em meu pescoço. Arfo, levantando a mão, tocando a pele arroxeada e levemente dolorida. É um chupão, ou uma mordida, sei lá. Raiva ferve em mim. A cretina me marcou. Contudo, mesmo revoltada, me recordo da sensação indescritível que senti quando gozei em seus dedos, sua boca chupando, mordendo meu pescoço. Meu núcleo palpita, umedecendo contra a minha vontade. Meu Deus, estou ficando louca! Nada mais explica minha atração por Ludmilla. Ela é a mulher mais cruel e sem escrúpulos que já conheci. Era para odiá-la, completamente, só que não é isso que acontece. Algo nela me excita demais, me deixa fraca, facilmente entregue quando estou em sua presença. Uma imagem meio borrada me vem à cabeça. Um cheiro gostoso de perfume bem em meu nariz. Ela me deitou em seu colo quando entramos em um carro negro que nos aguardava na área dos vôos particulares no aeroporto de Guarulhos depois que saímos do jato. Depois, me trouxe até aqui. Lembro apenas de trechos desse trajeto.

                                             
                       
Estava cansada, física e emocionalmente e apaguei todo o vôo. Um suspiro bobo escapa da minha boca, recordando-me da sensação gostosa de te-la bem próxima a mim. Sei que esse definitivamente não é o caso, mas, senti uma inexplicável sensação de proteção ao ser deitada com delicadeza sobre a cama macia. Mãos, porém, cuidadosas, me despindo e depois, me vestindo. Franzo o cenho, confusa agora. Isso não combina com sua frieza. Um flash dos olhos verdes, ela debruçada sobre mim, olhando meu rosto de perto, me bate claramente. Durma bem, baby. Murmurou e é só o que me lembro. Devo ter apagado de novo. Eu bufo para meu pensamento ridículo. Proteção. Aquela mulher quer apenas foder o meu corpo, como fez questão de me dizer sem o menor remorso ou decência. Sou apenas o seu depósito particular de esperma até gerar o seu herdeiro. Volto a estremecer ante a ideia. Como isso vai funcionar? Deus, eu sou virgem ainda. Como pode querer me engravidar assim, sem a menor consideração, como se estivéssemos numa sociedade séculos atrasada?

Tomo banho, constatando que há inúmeros artigos de higiene na prateleira do box. Todas as marcas que uso e outras que tenho medo até de tocar nos frascos por que, caramba, são caríssimas! Parece que alguém estava bem preparada me esperando. Ironizo. Escovo os dentes e me enxugo, vestindo um dos roupões novos que encontrei. Meu Deus, o tecido é tão macio que a gente não quer mais sair dele. Há opulência para todo lugar que olho. Eu sempre soube que os Oliveira eram podres de ricos, mas, nunca, e quero dizer nunca, estive num recinto tão luxuoso. Penteio os cabelos e os deixo cair molhados sobre ombros e costas. Me sinto acordada agora, meu estômago está roncando, me lembrando de que já tem algum tempo que não como. Começo a pensar nas prioridades do dia. Preciso ir visitar meu pai no hospital, e avisar a vaca da minha madrasta que estou de volta. Embora suspeite de que ela já saiba. Quando volto para o quarto, estaco. Há uma mulher loira, elegantemente vestida, parada no meio do cômodo. De onde ela veio?

— Oh! — ela arregala os olhos, surpresa genuína invadindo seu rosto bem maquiado. — Realmente jovem... — diz quase só para si, enquanto seus olhos azuis se estreitam e deslizam por mim. A forma como faz isso me deixa um tanto desconfortável. Permaneço parada. Vem até mim, parecendo uma modelo de passarela, me rodeando. Tenho a impressão de ouvir um leve bufar. Quem é ela? Me pergunto desorientada. — Sou Lourdes Maria, querida. — sua voz é forçosamente educada quando para em minha frente, seus olhos intrusivos nos meus. — Ludmilla me enviou para cuidar de você. Serei sua personal stylist de agora em diante.

— Prazer em conhecê-la. Sou Brunna. — estendo a mão. Ela rola os olhos e se afasta sem aceitar minha mão. O quê? Meu rosto esquenta com sua falta de educação.

— Eu sei quem você é, querida. — seu tom se torna abertamente zombeteiro. — É a bocetinha jovem que Ludmilla cismou em foder apenas para se divertir. — eu ofego com sua linguagem vulgar. — Me surpreende que seja tão jovem. Mas... Ela é assim mesmo, uma força espetacular da natureza, não é? — seu tom amolece um pouco nessa última frase, um sorriso maldoso se abrindo. — Fogosa, viril demais..

Fico sem ação com tamanha grosseria. Essa mulher está tão despeitada que não consegue ser profissional comigo. Com certeza já esteve na cama de Ludmilla. Uma sensação ruim e inesperada abre espaço dentro de mim. Algo que me deixa ainda mais revoltada: ciúmes. Estou com ciúmes de Ludmilla com ela. De jeito nenhum! Não estou com ciúmes daquela Senhora Feudal. Não e não!

— Ah, e você deve ser uma das muitas mulheres descartáveis que ela come, estou certa? Vejo os tablóides sensacionalistas. Não é nada pessoal, querida. — a réplica desaforada escapa para fora da minha boca antes que a detenha. Droga. Quero me bater agora. Não sou uma menina que usa palavrões.

Minhas palavras surpreendem a mulher também. Tenho que admitir que gosto disso, de ver como seu rosto vai de descaso óbvio ao ódio em segundos. Se afasta um pouco, me medindo dos pés à cabeça. Sei como pareço perto dela, pequena e insignificante. Ela é alta, muito bonita, elegantíssima. Pelo menos no exterior, adiciono sarcasticamente. Seu corpo é maduro, de mulher, envolto em um vestido vermelho com abertura frontal, deixando boa parte das coxas à mostra. Devolvo sua análise minuciosa.

               
                       
— Ora, ora, o casamento deve estar subindo à cabeça. — ela zomba e se vira, indo até sua bolsa sobre uma das poltronas. Volta para mim segurando um tablet. — Não se iluda achando que pode agradar... — bufa, rindo com claro deboche. — Ou segurar uma mulher como Ludmilla Oliveira, querida. — meu sangue ferve. Que mulher mais horrorosa, sem educação. Se Ludmilla a enviou, deveria estar me tratando com o mínimo de profissionalismo. Eu rolo os olhos ao pensar isso. Em primeiro lugar, a cretina não devia ter me enviado uma mulher que já esteve em sua cama. Parte da minha raiva vai para ela também. Ela suspira dramaticamente. — Enfim, deixe-me trabalhar. Já abasteci seus armários com artigos mais genéricos como roupões e roupas de dormir. Porém, vou precisar das suas medidas exatas para providenciar o restante do guarda-roupas digno da senhora Oliveira.

Tenho vontade de rir pela forma desgostosa que pronuncia isso. Coitada. Deve ser humilhante ter que vestir alguém que considera uma rival.

— Vamos encerrar aqui, Lourdes Maria. — digo, passando por ela em direção ao closet, que mais parece outro quarto. Me pergunto se esse é o quarto da toda poderosa. Descarto a ideia, notando que não há nada demais por aqui. — Poupe-me de ter que aguentar o mau humor de uma mulher recalcada, em troca, será poupada de passar pela humilhação de vestir a futura esposa de sua amante. Todo mundo sai ganhando. — digo, abrindo as portas do armário e fico feliz em ver minhas roupas antigas. Visto um jeans velho, camiseta baby look verde, calço um tênis confortável e volto. A mulher ainda está lá, parada, uma carranca profunda no rosto. Bufa com reprovação para meu traje.

— Pouco me importa sua opinião, princesa. — zomba, voltando sua atenção para o tablet. — Ludmilla está contando comigo para esse trabalho e eu gosto de mantê-la sempre muito... — seu olhar sobe para o meu, com desafio e completa: — satisfeita..

Que puta! Esqueça toda essa coisa de não usar palavrões. Parece que isso vai ser impossível em minha nova vida. Estou me preparando para lhe dar outra resposta à altura quando me sobressalto com a voz profunda e fria, bem familiar, vindo da porta:

— O que acha que está fazendo, Lourdes Maria? — Ludmilla pergunta em tom baixo. Jesus Maria José! Como entrou tão sorrateiramente?

Eu nunca vi uma pessoa virar a cabeça tão rápido quanto Lourdes Maria. Ela encara Ludmilla, que está avançando devagar pelo quarto, uma expressão nada satisfeita – sem trocadilhos – em seu rosto. Porque sou uma garota muito tola, me pego admirando sua figura  intimidante. Está usando um terninho de três peças, que em outros tempos acharia antiquado, só que agora, Deus... Agora é simplesmente a perfeição. Os cabelos presos em um coque bem feito. Linda.. É oficial: estou doente da cabeça.

— E-eu estou fazendo o trabalho que me incumbiu, Ludmilla. — Lourdes Maria gagueja, então, recupera a confiança, abrindo um sorriso sensual. — Ela é uma menina linda! Estamos nos dando tão bem, minha querida.

Novamente, que vaca! Eu gemo, desistindo de contar meus palavrões. Os olhos de Ludmilla se mantém sobre a mulher daquela forma fria e assustadora que já me é bem familiar, infelizmente.

— Eu ouvi tudo o que disse para Brunna. — continua no tom calmo e baixo e meus olhos continuam sobre ela, como que ridiculamente hipnotizada. Um arfar alto me faz desviar o olhar para a mulher. Está pálida agora. Não posso evitar pensar: bem feito! — Não vou tolerar tamanho desrespeito com a minha mulher. Saia da minha casa, Lourdes Maria. — caramba! Eu abro a boca para lhe corrigir que ainda não sou sua mulher, mas, nesse momento ela vira a cabeça, os olhos verdes penetrantes colidindo diretamente nos meus e como sempre acontece, perco a fala. Fico parecendo um peixinho dourado: abrindo e fechando a boca sem nenhum som. Meu Senhor... Aquele canto de boca cínico se levanta, olhos quase divertidos pela minha sempre ridícula reação a ela. Me dispensa em seguida, voltando a olhar a mulher antipática e eu respiro aliviada.

               
                       
— Não, por favor, Ludmilla, me dê mais uma chance. Minha loja está passando por graves problemas financeiros e vestir essa menina...

— Vestir a senhora Oliveira. — ela a corrige ainda no tom gelado.

Ela está tomando minhas dores? Estou muito confusa agora.

— Sim, vestir a senhora Oliveira, seria uma honra para mim. — ela implora, toda a pose arrogante escorregando. Começo a me sentir um pouco mal, para ser sincera. Meu coração é de manteiga, admito. Não aprecio ver ninguém se humilhando. Ela mereceu, foi uma vaca total antes, mesmo assim, não aprecio.
— Por favor, fui extremamente inadequada e deselegante. Queira me desculpar, Brunna. — seu olhar procura o meu, aflito. Uh, o mundo dá voltas. E muito rápidas, nesse caso. — Podemos começar de novo, não é mesmo, querida?

Me olha com esperança e eu engulo em seco. Sinto os olhos de Ludmilla sobre mim e a olho, pedindo ajuda silenciosamente. O que faço? Não quero atrapalhar os negócios da mulher, mas, também não quero conviver com ela me tratando bem de forma forçada. Não há mais clima.

— Você arruinou suas chances quando agiu estupidamente, Lourdes Maria. — Ludmilla torna a falar, seu tom inflexível que também conheço. Parece que estou bem versada em minha futura esposa, não é? Debocho. — Vou lhe pagar pelo que já fez, mas, quero que deixe a minha casa, imediatamente.

A mulher abaixa a cabeça e pega suas coisas, deixando o quarto sem mais reclamações. Deve conhecê-la bem o suficiente para saber que não há argumentos com a toda poderosa. Um silêncio inquietante cai sobre o recinto. Levanto meus olhos e já a encontro me olhando.

— Foi de muito mau gosto. Isso não se repetirá. — diz, sua voz um tanto rouca e os olhos baixando para meus seios. Meu rosto fica vermelho, sabendo que está vendo meus mamilos eriçados. Eles estão assim desde a sua entrada repentina.

— Sim, enviar sua amante para cuidar de sua futura esposa foi de péssimo gosto. — retruco, não me deixando amolecer pelo fato de Ludmilla estar me pedindo desculpas. Certo, não é aquele pedido de desculpas, mas, vindo dela já é algo. — Mesmo que esse casamento não seja real, ele ainda será legal, não é?

— Sim. — seus olhos estreitam subindo para os meus. — Seremos casadas, legalmente. — aquele meio sorriso cínico torna a curvar sua boca.

— Então, faça o favor de manter suas amantes longe de mim. — cuspo. Estou muito irritada. E fico ainda mais porque não quero aceitar a razão para essa irritação toda. Ciúmes.

O cinismo toma conta do seu rosto bonito. Eu pisco, evitando olhar para seu rosto. Essa mulher é uma bruxa. Me enfeitiça toda vez que me crava com esses olhos verdes impiedosos e frios. Sim, uma bruxa.

— Ela não é minha amante. — diz calmamente. — Já foi, mas, perdeu a graça há alguns anos. — dá de ombros como se não estivesse falando de uma pessoa e sim, um objeto. — Gosto de variedade no sexo, Brunna... — diz como se fosse uma informação qualquer. É a minha vez de estreitar os olhos. Ela está dizendo o que acho que está? — Esteja avisada de que, se eu sentir tesão por uma ou mais mulheres fora do casamento, vou foder com elas. Nunca me satisfiz comendo apenas uma boceta.

Eu arfo. Sua declaração me acertando em cheio. Odeio como fico decepcionada com suas palavras machistas. Ela está presa numa sociedade de séculos atrás, agora tenho certeza. Ou pensa que por que tem um pênis acha que pode agir assim sem escrúpulos. Essa mulher é muito pior do que pensei, meu Deus. Respiro fundo e a encaro fixamente para lhe dar o meu recado:

— Eu não me importo. Faça o favor de me engravidar logo para que eu possa me ver livre de você. — olho-a com todo o desprezo que estou sentindo. — E use camisinha com suas putas, eu não quero pegar doenças, sua porca machista!

               
                       
Aquele indício de sorriso jocoso, perverso, cruza seu rosto novamente e ela anda devagar para perto de mim.

— Ciúmes, baby? — sussurra parando à minha frente. Vou me afastar, mas, ela segura meu pulso, me puxando com força contra seu corpo. — Você pensou em mim hoje? — usa um tom baixo, carregado de depravação, trazendo a mão livre para o meu rosto. Como a menina tola que sou, eu arfo. Seus olhos gelados aquecem por um instante, apreciando minha falta de controle.

— Porque pensaria em você? — minto, minha voz sai ofegante. — É a mulher mais desprezível na face da Terra.

Ela ri mais amplamente, malvada e traz a boca para meu ouvido, sussurrando:

— Mentirosa. — morde o meu lóbulo, me fazendo arfar mais, o líquido quente encharcando minha calcinha. — Você quer o meu pau. Sou uma mulher experiente, Brunna. — seu tom é áspero e desce a boca perversa pelo meu pescoço. Um gemido escapa dela ao tocar a marca que me deixou ontem. A beija gentilmente, para meu espanto. — Só falta mijar nas pernas quando me vê.
— zomba de mim. — Está tão molhada agora que seria muito fácil enterrar meu pau até o talo nessa bocetinha virgem.

— Te odeio! — rosno, tentando me soltar em vão. Seus olhos ficam mais frios e malvados.

— Diga, baby, como é me odiar e ainda assim, estar pulsando e pingando para ser comida por mim? — esfrega seu membro duro em minha barriga e eu molho mais, desavergonhada, humilhada.

Juntando todas as minhas forças, a empurro, me desvencilhando e ando para o outro lado do quarto, tomando uma boa distância. Meu corpo todo está trêmulo, quente, desejoso. Sua risada é baixa e cínica às minhas costas.

— Fuja enquanto pode. — diz asperamente. — Amanhã não haverá para onde correr.

Fecho meus olhos, meu coração saltando, minha vagina pulsando louca e desavergonhadamente com sua ameaça. Meu Deus... Não há nenhuma explicação para isso... Não há. A detesto e desejo com a mesma intensidade.

— Preciso ver meu pai no hospital. — mudo o assunto, tentando regularizar minha respiração.

Silêncio. A tensão sexual pode ser cortada com uma faca de tão densa. Posso sentir seus olhos gananciosos sobre mim e isso não colabora para me acalmar.

— Pode ir com o meu motorista. Vou trabalhar o resto do expediente em casa hoje. — fala às minhas costas, alguns instantes depois. Respiro fundo e me viro para ela. — Deve estar com fome. Sempre que quiser pedir algo, disque o 3, a ligação cai direto na copa. — avisa indicando um interfone sobre o criado-mudo. Sua voz já está plana, inalterada e me pergunto como consegue. Sondo-a, atenta, curiosa para entender mais sobre essa mulher. Acho que tem algo a ver com a experiência. Mas, alguma coisa me diz que Ludmilla Oliveira jamais se abala. É próprio dela. — Rosa é a minha governanta. Ela providenciará qualquer coisa que quiser.

— Obrigada. — murmuro por pura educação, me perguntando pela milésima vez que situação é essa em que me meti. Suspiro. Não, que me meteram.

— Vou pedir a minha assistente pessoal que providencie outra personal stylist. Fique com o seu celular à mão, caso ela precise ligar para você.

— Certo. — digo apática, como um robô treinado. Seu cenho franze para minha aceitação pacífica. O que ela não sabe é que estou ficando cansada de lutar. Muito cansada.

— Meu irmão, Marcos, virá jantar aqui hoje. Sempre chega por volta das oito, então, esteja aqui a tempo de se preparar, quero apresentá-la a ele. — olha o relógio caro. É a sua forma de dispensar os reles mortais. — Tenho uma ligação importante agora. — se vira e sai sem dizer mais nada.

               
                       
Reviro os olhos. A delicadeza em pessoa.

Uma hora depois, estou no hospital, olhando meu pai através da janela de vidro da unidade intensiva. Seu corpo perdeu muita massa muscular, percebo desgostosa. Não posso evitar meus olhos turvando de lágrimas. Sempre me pergunto como isso foi acontecer. Sarah não deu muitos detalhes e tudo ficou por isso mesmo. Meu pai caiu do cavalo, entrou em coma e nunca mais acordou. Entro, higienizo minhas mãos com o álcool gel sobre um aparador no canto e vou até a cama. Ele parece tão pequeno agora. Uma imagem dele me empurrando na minha primeira bicicleta me vem à mente e eu soluço. Toco seu rosto magro. Passo a mão em sua cabeça, com pouquíssimos cabelos castanhos agora.

— Senti a sua falta, paizinho. — sussurro, a dor dentro de mim muito antiga. — Virei todos os dias agora que estou de volta. — prometo-lhe. — Nunca vou abandoná-lo. Nunca.

Não como fez comigo. Sei que não é o momento, mas, me ressinto. Ele já havia me deixado por conta própria há muito tempo. Porém, é meu pai e eu o amo.

— Eu vou cuidar de você, pai. — murmuro, meus olhos transbordando. É doloroso ver apenas essa casca sobre a cama. Meu pai era um homem tão bonito. Cabelos castanhos abundantes, olhos vívidos, inteligentes. Meu peito dói com a lembrança tão distante do que ele é agora.

Um movimento na porta do quarto me faz virar e minha miséria é completa agora. Sarah e Dove estão lá. Elas me chocam completamente quando abrem sorrisos amplos e avançam para dentro, em minha direção.

— Brunna, minha filha! Que bom ter você de volta. — Sarah me puxa para um abraço desajeitado. Eu quero empurrá-la mas, estou chocada demais para isso. O que diabos ela tem? — Dove, venha dar as boas-vindas a sua irmã, querida. — chama com uma empolgação que nunca esteve lá para mim. Nunca sem plateia, pelo menos.

Eu olho ainda mais confusa quando a cadela da minha meia-irmã vem para a minha frente, parecendo feliz em me ver. Verdadeiramente feliz, me puxando também para um abraço bem apertado, do tipo que nunca me deu.

— Bru, que bom ter você de volta, irmãzinha. — sussurra e se afasta um pouco para me olhar. — Sinto muito. Me desculpe por não ter sido uma boa irmã enquanto crescíamos. — seus olhos estão marejados e parecem muito arrependidos. — fui uma cadela total com você muitas vezes.

O tempo todo. Quero corrigi-la, mas, minha fala ainda não foi encontrada. O que, em nome de Deus está havendo com elas? As encaro, desconfiada. Sarah meneia a cabeça e funga um pouco. Ela nunca perdeu essa mania ridícula de fingir choro sem uma única lágrima sequer. Passa os braços por mim e Dove, nos puxando para si.

— Com o papai preso nessa cama, só temos umas às outras, irmã. — Dove torna a falar. — Somos a única família que lhe sobrou e vamos cuidar de você, Bru. Pode contar comigo e com a nossa mãe.

Ugh. Continuo sem palavras.

— Minhas duas filhas. — Sarah torna a fungar e eu quero rolar os olhos. — Obrigada Deus por trazer minha menina de volta. As coisas estão muito complicadas para nós, querida. — agora vejo aflição verdadeira encher seus olhos. — Estamos sem dinheiro. Estamos quebradas, Brunna. — então, força um sorriso, segurando meu rosto entre as mãos. — Mas, Deus é tão maravilhoso que amanhã minha menina querida vai se casar com uma das maiores fortunas do Brasil.

— Não será um casamento real, Sarah, você sabe disso. — encontro finalmente a minha voz. — Estou pagando por um erro de meu pai.

Ela franze o cenho, fazendo uma cara arrasada de novo.

— Por favor, não me chame pelo nome, filha. — implora como se de fato isso importasse para ela. — Corta meu coração. Sim, seu pai cometeu erros, mas, ele ainda é o homem mais correto que conheci. — olha para a cama. — Me faz tanta falta. — suspira tremulamente. — Temos que nos unir. Só resta nós três agora.

               
                       
Isso me irrita. Estão falando como se meu pai estivesse morto.

— Meu pai não está morto. — rebato, meus olhos ardendo com novas lágrimas. — Ele vai acordar. Sei que vai. — minha voz racha no final.

As duas me abraçam.

— Claro que vai, querida. Estou sendo apenas prática, pensando no aqui e agora. — Sarah torna, acariciando meus cabelos. — Seu casamento com Ludmilla pode se tornar real, Brunna. — eu a olho, confusa com sua mudança repentina. — Basta abrir as portas da mansão para nós, sua mãe e irmã. Nós vamos cuidar de tudo, filha. Tudo.

— Eu vou lhe ensinar como prender uma mulher como Ludmilla, irmãzinha. — Dove murmura quase com carinho. — Precisamos planejar uma festa de arromba para apresentar a nova senhora da sociedade paulista. Estou tão orgulhosa, Bru! Seremos melhores amigas além de irmãs, não é maravilhoso?

Ludmilla


A minha tarde é tão cheia quanto se eu tivesse ido para a empresa. Solto um grunhido. Porra, na verdade, é muito pior quando trabalho em casa porque sempre esqueço-me de parar. Na empresa, todos começam a ir embora, então, percebo que preciso ir também. Estou estressada e sentindo falta de sexo. A última boceta que comi foi de Lucy na semana passada. Depois disso me dediquei a trazer a minha pequena bailarina para casa para cumprir sua parte em nosso acordo. Está certo, meu acordo. Dá na mesma. Brunna estará debaixo de mim amanhã, tomando meu pau em seu corpinho intocado. Porra, meu pau incha dentro das calças. Confiro os números na tela do meu notebook mais uma vez. Acabei de contatar meu gerente de banco para fazer a transação da compra do carro de Brunna. É o seu presente de casamento e será entregue na segunda-feira. Por que estou dando um presente desses a ela? Deixe-me esclarecer isso. Primeiro, eu posso. Segundo, esse é o ponto mais fodido. Com certeza não é pelo imenso amor que nos une. Eu bufo. O meio social em que vivo é brutal. Embora esse casamento seja apenas um meio para um fim, ela será minha esposa legalmente. E como tal, seria muito estranho para a sociedade paulista e, principalmente o círculo próximo a mim, se minha esposa não tivesse algumas regalias. Assim, preparei-lhe também três cartões de créditos com quinhentos mil reais de limite, cada um. Não sou louca de entregar cartões ilimitados nas mãos da filha de um ladrão. De acordo com o provérbio, a maçã não cai muito longe da árvore. Mal posso esperar para ver sua carinha de decepção ao ver o limite dos cartões.

Confiro o relógio e me assusto. Já são quase oito da noite. Passo a mão nos cabelos os soltando e os desalinhando, saio do meu escritório, atravesso a sala, subindo a escada para o terceiro andar, onde fica meu quarto. Tomo uma ducha revigorante, visto um jeans escuro e suéter cinza-chumbo, de mangas compridas, penteio meus cabelos para trás e os deixo secar naturalmente. Marcos deve chegar a qualquer momento. Quando me ligou hoje de manhã querendo me encontrar em nosso bar de costume, pedi que viesse para cá, pois, tinha algo para lhe mostrar. Meu irmão ainda não sabe que vou me casar amanhã. Estive protelando lhe contar porque, a exemplo de Patty, Marcos iria tentar me demover da ideia e eu não queria me irritar com ele. O que não sabia era que meu irmão mais novo também tinha algo para me contar. Está encrencado com uma comissária de bordo. Novamente. Patty me ligou no final da tarde, me deixando a par do processo que a moça está movendo não contra Marcos, mas, contra a LJ dessa vez. Isso terminou de elevar meu estresse a níveis altos. Marcos é a minha única família e eu o amo, mas, é difícil lidar com ele e seu jeito mulherengo. Bem, há ainda a nossa avó materna, que vive num condomínio perto daqui. Nossos velhos morreram, ironicamente, em um acidente aéreo, há vinte anos. Não que eles fossem pais presentes. Não, eles tinham coisas muito mais importantes para fazer, como gastar rios de dinheiro em Mônaco e na Riviera Francesa, enquanto crescíamos. Marcos e eu? Estávamos sendo bem cuidados e educados em um excelente colégio interno.

               
                       
Passo pelo quarto de Brunna, do lado do meu, um sorriso repuxa minha boca. É amanhã. Meu pau fica a meio mastro, por saber que ela está lá dentro. Nua? Porra, a menina está ainda mais deliciosa. Ganhou curvas tonificadas nos lugares certos. Embora ainda tenha traços de menina, também tem um ar sensual de mulher agora. Um ano lhe fez muito bem, eu disse a verdade ontem quando perdi o controle e a deixei nua. A teria fodido contra a parede se não tivesse me jogado uma bomba sobre a cabeça: ela é virgem. Ranjo os dentes, lembrando a sensação louca de posse que senti quando toquei a barreira da sua virgindade com meus dedos. Uma virgem, caralho! É intacta. Nunca estive com uma em toda a minha vida sexual e isso está me enchendo de expectativa. Uma virgem nos dias de hoje é quase como você encontrasse um maldito unicórnio. Ironizo. Passei o dia inteiro meio dura, sabendo que está debaixo do meu teto, que bastaria esticar a mão e pegá-la. Sei que se me esforçasse a comeria hoje ainda. A menina não tem qualquer experiência. Tudo que sente transparece em seu rostinho de anjo. Linda. Linda demais. Estou completamente louca para possui-la, em todos os sentidos. Franzo o cenho com tal sentimento pungente. Não me recordo de sentir um tesão tão violento antes.

Desço a escada e me dirijo para a cozinha. Gosto de fazer as refeições informais lá. Ao entrar no cômodo moderno e bem equipado, não é surpresa encontrar meu irmão já sentado no banco da ilha, bebericando uma cerveja. Rosa está mexendo nas panelas e rindo de algo que Marcos está dizendo. Às vezes acho que a mulher nutre uma paixão secreta por ele. Bastou dizer que ele viria jantar hoje e resolveu preparar ela mesma um de seus pratos preferidos. Encurto o passo, ouvindo e observando-os. Rosa torna a sorrir e olha para Marcos. Não consigo identificar nada malicioso ou sedutor em sua expressão. Está bem, talvez seja só paranoia minha. Marcos olha de lado e me vê, sua expressão se iluminando. Já tem o que, duas, três semanas que não nos vemos? Me pergunto, percebendo que senti sua falta. Esqueço momentaneamente suas estripulias, sorrindo-lhe de volta. Ele se levanta do banco e vem me encontrar, me dando um abraço sem cerimônias. Meu irmão é assim, expansivo. Aceito seu abraço, só que me desvencilho logo, com um tapinha em suas costas.

— Ei, Lud, já faz um tempo, irmã. — me diz, passando um braço por cima dos meus ombros sem se importar com minha aversão a declarações de afeto. Sejam públicas ou não. — Você está com cara de quem esteve trabalhando até agora.

— Sim, Marcos, já tem um tempo, irmão. — assinto, retirando seu braço e andando para perto da ilha. Rosa ajeita várias panelas alinhadas e me olha com um sorriso franco. A mulher está sempre feliz, não dá para entender. — E sim, hoje o dia foi meio selvagem.

— Senhora, está tudo pronto. — Rosa me diz. — Estou indo agora.

— Está bem, Rosa. Obrigado. Você não precisava ter feito...

— Ei! Precisava sim, irmã. — Marcos rebate, piscando e sorrindo para a mulher. — Eu amo a sua comida, querida. Obrigado.

Ela ri, encabulada, então, pede licença e sai pela porta dos fundos.

— Eu acho que minha governanta tem uma queda por você. — meio que bufo, indo pegar uma cerveja no freezer.

— Não tenho culpa de causar esse efeito nas mulheres, Lud. — ele ri presunçoso, os olhos escuros divertidos.

Me sento em um dos bancos e tomo um longo gole. A bebida gelada cai bem para aliviar um pouco do estresse. Ele se senta no banco ao lado.

— Como estão as coisas, irmão? — lhe dou a chance de me contar a sua merda primeiro.

— Você disse que ia me mostrar algo. — evita a minha pergunta. Típico dele. — O que é?

Estreito meus olhos e decido contar a minha merda primeiro.

               
                       
— Vou me casar, amanhã, Marcos

Ele cospe cerveja sobre a bancada, numa gargalhada alta. Que idiota! Eu rosno.

— Rá! Não sabia que gostava de piadas agora, irmã. — diz, ainda sorrindo, pegando um guardanapo e secando sua bagunça. Eu não sorrio e ele franze testa, me encarando de novo. — Porra, não está falando sério, está?

Aceno. Ele parece tonto com a confirmação, e não é para menos. Eu sempre disse que nunca ia me casar. No entanto, nossa avó vem pegando pesado nos últimos anos, especialmente comigo, que sou a mais velha. Está fazendo chantagem emocional sobre morrer e não ver nenhum bisneto e blá, blá, blá. A ficha caiu para mim no ano passado. Estou com trinta e sete anos agora. Preciso de um herdeiro urgentemente. Não posso evitar imaginar Brunna grávida do meu filho. Ela vai me dar um herdeiro bonito, forte e saudável. Algo aquece dentro de mim com esse pensamento.

— Uh, mana, você está apaixonada? — a pergunta meio horrorizada de Marcos me faz olhá-lo.

— Não. Você me conhece bem, irmão. Não sou do tipo que se apaixona. — resmungo jocosa. — É apenas um casamento arranjado. Preciso de um filho, Marcos. Não vou viver para sempre.

Ele toma um gole da sua garrafa.

— Só você mesmo para falar de algo tão sério dessa forma prática do caralho. — retruca.

— É apenas um acordo. Brunna está bem avisada sobre tudo. Não estou enganando ninguém. — acrescento.

— Brunna, hein? — abre um de seus sorrisos pervertidos. — Gosto do nome, é bonito.

— Você não tem que gostar de nada sobre ela. — digo-lhe friamente e passo a lhe contar todos os detalhes que trouxeram minha futura esposa de bandeja para mim. Ele está horrorizado quando termino.

— Você é assustadora, Lud, é sério, irmã. — diz incrédulo. — Isso é imoral, caralho!

Eu rolo os olhos.

— Patty também me disse isso, mas, não vou voltar atrás. — digo firmemente. — Ninguém vai me tirar Brunna antes de ela me dar o que quero.

— Cara, estou com vergonha de você, é sério. — ele finge um estremecimento.

— Bem, considerando que vive me envergonhando também, estamos quites. — dou de ombros.

Seu semblante se fecha um pouco. Ele faz aquela cara de quem está sendo injustiçado e não fez nada para merecer isso. A conheço bem. Desde sempre.

— Ah, sobre isso... Eu, ah... — Marcos gagueja. Eu apenas o encaro, apreciando seu desconforto. Ele nunca aprende, porra!

— Marcos, o que você fez dessa vez? — pergunto em tom baixo.

Ele me olha e suspira em derrota, percebendo que já estou a par de tudo. Bem, quase tudo. Há detalhes que Patty achou melhor meu irmão me contar.

— Eu devia imaginar que Ally iria me entregar. — seu tom é jocoso quando usa o apelido de Patty. — Cara, onde foi parar a porra da confidencialidade entre cliente e advogado?

Eu solto um grunhido. Marcos simplesmente não consegue levar nada a sério. Chega a ser frustrante tentar colocar algum juízo em sua cabeça. Isso aos trinta e três anos, o que é ainda mais lamentável.

— Marcos... — torno a rosnar, meu tom o advertindo.

Ele ri. Não, na verdade, gargalha. Eu gemo. Deus, os irmãos mais novos foram colocados no mundo com o único propósito de testar a nossa paciência, com toda certeza.

               
                       
— Está bem, Lud. Você me contou seus podres, irmã, hora de retribuir com os meus. — balança as sobrancelhas antes de prosseguir: — Uma comissária de bordo pode estar me processando...

Eu solto um grunhido pelo seu rodeio. Ele nunca vai direto ao ponto quando está encrencado.

— Pode, ou está te processando, irmão? — ranjo com desgosto.

— Ela está. — admite e suspira. — A garota é doida de pedra, irmã. Achou que íamos namorar, casar e ter uma casinha com cerca branca. Pode me imaginar numa merda dessas, Lud? Ugh. — ele escarnece na sua zombaria habitual.

Marcos é um idiota mulherengo desde a adolescência. Nunca se prendeu a ninguém. Suas razões são bem diferentes das minhas, embora. Ele é um sem-vergonha assumido, simples assim. Eu? Digamos que não tenho tempo para me dedicar a relacionamentos. As mulheres são criaturas carentes, ridiculamente melosas e exigentes. Não tenho a menor paciência para lidar com elas. Eu amo foder seus corpos. No entanto, jamais me aproximo de outra forma. Gosto sem laços, sem compromisso. Certo, eu também sou uma idiota, assumo. Deve estar no DNA dos Oliveira, uma vez que nosso velho também não foi um modelo de pai e marido.

— Da companhia? — volto ao assunto delicado. Quero lhe dar a chance de contar tudo. Sou a sua irmã, porra.

— Sim. Nós, hum... Tudo aconteceu no vôo para Paris, há três semanas. — Marcos esclarece, me fazendo ranger os dentes.

— Por favor, me diga que não comeu a comissária em pleno vôo, irmão? — peço, mas, já sei a resposta. Marcos não se importa com a porra das regras. Ele é o mais parecido com nosso pai nesse aspecto. Inclusive seguiu a mesma profissão, é um piloto. Não qualquer piloto, deixem-me acrescentar, é um excepcionalmente bom. O idiota é simplesmente o melhor do Brasil na atualidade e podem acreditar, isso o deixa ainda mais namorador, com certeza já bateu seu próprio recorde de bocetas, como ele mesmo fala.

— Vamos Lud, você sabe a resposta para essa pergunta, irmã. — ele ri maliciosamente. — É claro que comi a garota no vôo. Cara, esses vôos para a Europa duram uma eternidade! — diz com exagero. — Fico entediado...

Eu bufo, exasperação me tomando.

— Para mim chega, Marcostopher. — uso o tom geralmente reservado para a sala de reuniões.

— O que quer dizer com isso, Lud? — ele diz depois um tempo em silêncio. — Porra, você me chamou pelo nome todo? Vamos, irmã, não fique tão chateada comigo. Ally pode dar um jeito nisso e nada respingará na companhia, garanto.

Sim, Patty pode dar um jeito nisso. Ela é a melhor e é por isso que é minha advogada, não por nossa amizade. Não sou de favorecer ninguém sem o devido mérito. E por que é a melhor, propôs a única solução possível para controle rápido de danos. Marcos não vai gostar nada...

— Você está fora dos vôos internacionais até a segunda ordem, irmão. — digo-lhe. Não me sinto feliz com isso. É muito mais uma punição para a companhia do que para Marcos. O idiota é realmente nosso melhor homem no ar, mas, preciso ser mais firme com ele ou suas aventuras sexuais podem acabar abalando nosso bom nome. Nosso falecido pai e nosso tio, trabalharam duro para nos tornar uma das principais companhias aéreas do Brasil. Eu trabalhei duro para nos colocar entre as melhores do mundo. Não vou deixar isso evaporar pelo ar, sem trocadilhos.

— Não! Droga, Ludmilla! Nem pense nisso, irmã. — sua voz está tensa agora. — Eu também sou a porra do dono dessa companhia!

Eu resmungo. Certo. Isso funcionará como um castigo para ele também. Se há algo que meu irmão ama mais que tudo nesse mundo, é voar. Não gosto de ter que tomar medidas autoritárias. Não com meu irmãozinho, que fique claro. No entanto, tenho passado muito a mão na cabeça de Marcos desde muito cedo. Nós perdemos nossos pais quando éramos adolescentes. Ele ficou muito abalado, mesmo nunca tendo recebido amor da parte dos fodidos egoístas. Acabei tomando para mim a tarefa de cuidar dele. Nosso pai era uma espécie de super-herói para ele e isso influenciou muito em sua escolha de profissão. Nunca vou entender a razão de meu irmão nutrir tal adoração por Michael Oliveira. Enfim, tem sido apenas eu e Marcos desde então.

               
                       
— Exatamente! Você é um dos donos da maldita LJ! Comporte-se como tal, irmão. — rebato. Então, eu suspiro cansada dessa conversa. Ela tem se repetido demais. — Mantenha a porra do seu pau dentro das calças, Marcos. Ainda estamos sendo testados na nova fusão que assinamos. A tinta ainda nem secou no maldito papel e um escândalo desses seria muito ruim para nós! — rosno.


— Porra, eu havia me esquecido disso. — ele geme enfiando as mãos pelos cabelos, como se a ficha estivesse caindo agora. — Qualquer coisa, Lud. Peça qualquer coisa e eu faço. Mas, não me impeça de voar, irmã. — seu tom é derrotado e eu me sinto uma carrasca.

— Você violou a política de não-confraternização tantas vezes, que nem consigo contar mais, irmão. — digo desgostosa. — Você não é insubstituível, Marcos. — ameaço.

Ele rosna, se levantando.

— O inferno que não sou! Você está proibida de colocar o Justin em meus vôos, Lud!  Está me ouvindo, irmã?

Eu quase rio em meio à irritação. Justin tem ascendido na empresa e conseguido se destacar nas rotas internacionais. Ele não está no mesmo patamar de meu irmão, claro. No entanto, não vou lhe dizer isso agora. É bom que Marcos se sinta ameaçado e pare de ser um babaca mulherengo. Eu bufo, sabendo que isso é impossível. Bom, pelo menos que pare de fazer isso dentro da porra da nossa companhia.

— Você ficará com as rotas domésticas até que Patty resolva esse seu... Contratempo, irmão. — digo, abaixando meu tom. Ele parece um tigre enjaulado agora.

— Porra, você sabe que odeio as rotas domésticas! — protesta.

Eu rio sarcasticamente. Não seria uma punição se ele gostasse, não é?

— Eu sei. Isso não é uma porra de premiação por bom comportamento. É um castigo.

Ele bufa.

— Não sou mais um adolescente para ser castigado. — resmunga, mas, já há indícios de aceitação em seu tom.

— Jura, irmão? — levanto uma sobrancelha irônica. — Porque para mim parece que nunca passou da porra dos quinze!

— Odeio você nesse momento. — resmunga.

— Não, não odeia. Você ama a sua irmã mais velha. — digo com leve provocação agora. — Estaria perdido sem mim. — ele bufa acintosamente, me fazendo rir um pouco. Torno a ficar séria e faço o que sempre fiz desde quando era uma adolescente. Eu passo a mão em sua cabeça para aliviar o golpe. — É necessário, Marcos. Vou pedir a Patty que agilize o processo. Estará de volta em breve, prometo, irmão.

Ele me dá as costas, bancando o difícil e vai até o freezer pegando outra cerveja. Começa a beber em silêncio, usando meu próprio método contra mim. Meu irmãozinho me conhece bem. Rio levemente. Nos conhecemos bem e nesse momento sei que já não está puto. Ele sabe que é o melhor para abafar o escândalo.

— Você deve ser mais cuidadoso. — decidindo provocá-lo abertamente, completo: — ou então, arrumar uma garota fixa.

Se vira rapidamente para mim. Bem no alvo.

— Cara, eu não vou ofender a população feminina ficando apenas com uma garota. Isso é desrespeito. — diz parecendo genuinamente ofendido. Eu bufo com sua cara de pau.

— Ou, você sempre pode se aposentar e me ajudar a pilotar a empresa, irmãozinho. — uso o trocadilho para alfinetá-lo.

Ele faz o sinal da cruz, duas vezes. Marcos detesta ternos.

— O inferno vai congelar antes de eu me enfiar em um maldito terno e ficar berrando ordens como você, irmã mais velha. — zomba.

O tom da nossa conversa vai ficando mais leve. Suspiro aliviada.

— Eu não berro ordens. — replico.

— Não, você fala assustadoramente baixo, o que é muito pior. — desdenha.

Bebemos e passamos a falar de coisas banais como a nova cobertura que adquiriu recentemente em Dubai. As duas garotas com quem festejou ontem à noite. Marcos vive cada momento da sua vida como se fosse o último. Tem momentos que invejo essa sua capacidade de nunca levar nada a sério. Os olhos de meu irmão arregalam para algo atrás de mim e eu me viro, pressentindo Brunna. Marcos assobia baixo.

— Caralho, Lud, não sabia que estava visitando o berçário agora, mana. — se inclina, conspirando em meu ouvido. Como o idiota provocador que é, se levanta e estende os braços: — Ei, delicinha!

Me ponho de pé também.

— Que porra é essa de delicinha? — ranjo os dentes para meu irmão, que tem um sorriso de conquistador barato escancarado para Brunna.

— Oh, desculpe, mana. — ele dá uma piscadela para Brunna, quando para perto de nós. — Que tal chuchuzinho? — eu bufo. — Não? Docinho? Tchutchuquinha? — rolo os olhos para sua infantilidade. — Bonitinha? Vendido! Esse cai como uma luva.

A risadinha descontraída de Brunna me surpreende e eu a olho. Ela nunca sorriu assim para mim. Porra, ela nunca sorriu de forma alguma para mim! E não sei por que diabos isso me incomoda.

— Ah! Você gostou desse, admita, Bonitinha. — Marcos repete o apelido ridículo, dando mais uma de suas piscadelas sem vergonhas para Brunna e estende a mão.

— Sou Marcos, o irmão mais bonito, como pode ver. Ainda dá tempo de mudar de ideia, querida...

Brunna ri mais e fico ainda mais irritada, estranhamente possessiva. Vou até ela, passando o braço em seus ombros e digo em tom cortante para meu irmão galanteador.

— Essa é a minha futura esposa, Brunna. — seu corpinho, trajando um conjunto jovem de saia e blusinha solta, fica tenso com a forma com a estou puxando contra mim. — E esse é o meu irmão mais novo, Marcos. O palhaço da família, como pode ver.

Marcos joga a cabeça para trás e ri com vontade. Eu quero socar sua cara bonita por nunca sair do modo conquistador. Brunna pega sua mão.

— É um prazer conhecê-lo, Marcos Oliveira. — diz em um tom muito doce e amigável.

Porra. Que diabos há comigo? Não sou do tipo ciumenta. Mulheres para mim possuem apenas uma utilidade... Nunca senti ciúmes de nenhuma com quem estive.

— Apenas Marcos, por favor. — meu irmão continua com seu sorriso cheio de dentes.

— Marcos — Brunna repete e sorri inocente sem saber o que vem a seguir.

Eu rosno antevendo sua piada boba para pescar saias desde adolescente.
Marcos me olha e ri antes de dizer as palavras infames:

— Sim, Bonitinha. Marcos o mais tesudo... — pisca de novo. Se ele piscar mais uma vez vai embora sem jantar, caralho.

O acordo- BrumillaOnde histórias criam vida. Descubra agora