Um avião nunca pareceu tão sufocante. Eu não tinha medo de voar, nunca tive, mas a sensação de paredes se fechando a minha volta era mais e mais frequente nos últimos tempos. A incerteza que pairava como um farol sobre a minha cabeça, toda maldita vez. No começo, a adrenalina de se esconder era maior que tudo. Os momentos roubados eram preciosos. Mas quando isso é tudo que você tem? Nem tanto assim.
Eu mentiria se dissesse que o casamento de Carlotta não tinha me deixado pensando. Quando estava parada no altar, no meu lugar de madrinha, olhando de frente para Nevio, imaginando se um dia seríamos nós dois. Claro que a felicidade de Carlotta me deixava feliz, mas também acendia uma dúvida na minha cabeça. E uma leve sensação de inveja, quando a vejo cochilando com a cabeça no ombro de Alessio, os dois parecendo o casal realizado que eu sei que eles eram.
-Aurora? Está tudo bem? - minha mãe pergunta, a testa franzida.
Eu tinha escolhido sentar ao lado dela depois da conversa com Nevio. Ultimamente, todas as nossas conversas eram meio assim. Eu odiava isso. A tensão. O medo. O desejo. O amor. Amor, será que eu podia falar de amor? Sempre soube que Nevio Falcone era quase outra espécie completamente, não funcionava nos mesmos moldes que nós meros mortais. Mas eu também o conhecia, mais do que a maioria. Os momentos que ele me tinha nos braços, como lidou com cada uma das minhas primeiras vezes, as pequenas coisas que fazia por mim… Eu queria poder chamar de amor.
-Aurora? Querida? - a voz da minha mãe de novo interrompe meus devaneios. Ela se inclina, a mão na minha testa.
-Tudo bem. Eu só… me distrai por um momento.
-Você tem estado bastante distraída.
-Mãe! - eu arregalo os olhos, quase derrubando o livro que estava no meu colo.
Ela dá de ombros.
-Só estou dizendo. Você pode falar comigo, querida. Mães sempre sabem.
Tia Serafina escolheu esse momento para se pronunciar.
-É verdade. - ela lançou um olhar demorado para o lado. - Pelo menos com Greta. Perdi a habilidade de ler Nevio quando ele fez três anos e aprendeu a ir ao banheiro sozinho.
Nenhuma de nós consegue segurar a risada. Nevio pressiona os lábios, parecendo irritado
-Estamos quase lá. - é o que ele diz.
Tia Serafina ergue a taça de vinho.
-Está vendo. Eu disse.
Tia Kiara balança a cabeça, lançando um olhar afetuoso para Alessio, que tenta acordar Carlotta delicadamente.
-Eu sempre sei.
Minha mãe coloca a mão sobre a minha.
-Estou feliz que estamos viajando alguns dias antes. Com tanto trabalho, e você na faculdade… acho que precisamos de um tempo juntas.
Eu engulo o caroço que se forma na minha garganta. Apesar de ser a garotinha do papai, eu sempre fui próxima da minha mãe. Ela era quem eu mais admirava, sua história, sua superação, seu sucesso. Mentir para ela cada dia doía mais. Eu queria poder falar como me sentia. Pedir conselhos. Mas tudo que eu faço é forçar um sorriso.
-Claro, mãe.
***
-Incrível. Eu amo ser rica.
Eu estreito os olhos na direção de Carlotta, mas tia Gemma é mais rápida.
-Como se você não estivesse sempre nas nossas viagens.
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Twisted Desire
FanfictionEla era a única que ele queria. E a única que não poderia ter.